Hot Widget

Type Here to Get Search Results !

Comida kasher ganha adeptos

Top Post Ad




 

on Line
 
23/06/2008 - 08h35

Comida kasher ganha adeptos fora da comunidade judaica

RAFAEL BALSEMÃO
da Revista da Folha

Dois hambúrgueres (com carne de um abate supervisionado religiosamente), alface (selecionada e limpa com rigor), molho especial (importado dos EUA), cebola, picles e um pão (feito somente com produtos de origem vegetal) com gergelim. Queijo? Nem pensar.

A receita do sanduíche mais famoso do mundo, o Big Mac, foi modificada no domingo (15) para atender a uma clientela especial.

Beatriz Toledo/Folha Imagem
Família ordodoxa em Dia Kasher; é proibido consumo de carne de mamífero com laticínios
Família ordodoxa em Dia Kasher; é proibido consumo de carne de mamífero com laticínios

Cerca de 5.000 judeus, segundo os organizadores, enfrentaram filas de até uma hora e meia para comer uma das refeições do McDonald's na Barra Funda, zona oeste da cidade. A unidade da rede de fast food foi adaptada para o Dia Kasher. Todos os alimentos à venda foram preparados segundo os preceitos da "kashrut", a dieta judaica, conhecida como kasher ou kosher.

Está na Torá o que devem ou não comer os filhos de Israel, como explica o rabino Michel Schlesinger, 31, da Congregação Israelita Paulista (CIP). "O livro sagrado não traz a justificativa para as regras, mas há teses da medicina, sociológicas, religiosas e sanitárias." Por exemplo, é proibido comer carne e qualquer laticínio na mesma refeição; por isso, o queijo ficou fora do sanduíche.

Para o Dia Kasher --evento promovido pelo grupo Atid, integrante da Congregação Monte Sinai, que está na sua segunda edição--, parte do maquinário da cozinha do McDonald's foi retirada. Na manhã do domingo, sob a supervisão de um rabino, foram instaladas duas chapas para grelhar os hambúrgueres, uma fritadeira e quatro tostadeiras. Se fossem usados os equipamentos do dia-a-dia, para serem considerados kasher, eles teriam de ser esterilizados por um maçarico a 500ºC. Como os equipamentos não suportariam tal temperatura, o procedimento foi deixado de lado.

Os detalhes da preparação só reforçam o caráter excepcional do evento. "A idéia surgiu como uma utopia de pegar uma empresa grande e fazê-la kasher", diz o rabino Ilan Ende, 32, um dos responsáveis pela supervisão da comida. Deu certo. "Foi uma verdadeira revolução no restaurante", resume Celso Cruz, 50, diretor de compras e qualidade do McDonald's.

Além de adaptar a cozinha aos preceitos judaicos, o molho do Big Mac, o ketchup e os picles foram importados dos EUA --onde está localizado o centro de distribuição de produtos para os dois restaurantes 100% kasher da rede, que ficam em Buenos Aires e Jerusalém. Somente quatro tipos de sanduíche foram servidos. Batata frita (importada da Argentina), água e refrigerante também estavam no cardápio reduzido.

Beatriz Toledo/Folha Imagem
Alberto,7, devora o primeiro sanduíche Big Mac de sua vida
Alberto,7, devora o primeiro sanduíche Big Mac de sua vida

Com seus quipás na cabeça, adultos e crianças se deliciaram com os sanduíches "proibidos". "Perfeito", foi assim que Alberto, 7, definiu o primeiro Big Mac de sua vida. Enquanto devorava o lanche, sua mãe, a designer Tatiana, 31, explicava que, em casa, prepara hambúrgueres para matar a vontade de fast food. Depois de provar o Big Mac e um hambúrguer simples, ambos sem queijo, Alberto deu o veredicto: "O do McDonald's é melhor".

O que a criançada não aprovou do Dia Kasher foi a sobremesa. No lugar da torta crocante e dos sorvetes, feitos com leite comum, havia maçãs. Limpas e analisadas pelo rabino, o produto 100% natural encalhou. A grande estrela do cardápio foi o Big Mac. Por causa da grande procura, foi imposto um limite de 12 hambúrgueres, no balcão, e 24, no "drive-thru", por pessoa. A clientela habitual, que estranhava a movimentação, era recebida com um comunicado sobre o cardápio kasher.

Apesar das filas, o público mirim recém-convertido ao fast food era só alegria, mesmo sabendo que não poderia repetir a dose tão cedo. "No ano passado, eles ficaram uma semana insistindo para vir de novo", recorda Daniel Mansur, 34, ao lado da mulher Inbal, 31, e dos filhos gêmeos Alberto e Naomi, 6. "Quando eles eram pequenos e não entendiam o significado religioso, pediam para vir sempre", conta Inbal, que já levou os filhos à filial 100% kasher de Jerusalém.

Banquete judaico
Mas o "toque kasher" vai além da comida rápida e, aos poucos, invade os espaços da alta gastronomia em São Paulo. A Casa Fasano, um dos mais sofisticados serviços de bufê da cidade, oferece, há dois anos e meio, opções de banquete aos judeus ortodoxos. "Para não errar, preparo os pratos na minha casa. Mas o treinamento para a primeira vez que fiz kasher foi maior", diz Andrea Fasano, sócia da Casa Fasano. "Hoje em dia, já é um hábito da nossa cozinha."

A chef Andrea Kaufmann, 31, da AK Delicatessen, calcula que 30% de suas festas são para um público que consome kasher. Ela, que é judia não-ortodoxa, utiliza os utensílios, os fornecedores e a casa do cliente para fazer os banquetes. Enquanto cozinha, é supervisionada por um "machguiach", judeu ortodoxo responsável pelo cumprimento das regras kasher.

"Tenho que abrir mão de uma série de ingredientes, mas esse é o desafio. Sei que vou ter que explorar vegetais, peixes, azeite", afirma Andrea. O preço do bufê kasher é 40% mais caro que o de um normal, segundo a chef, devido aos ingredientes mais caros e ao processo demorado.

A oferta no Brasil, se comparada a dos EUA, ainda é mínima. Lá é possível comprar, por exemplo, produtos kasher em máquinas nas ruas que utilizam moedas. Em busca de novidades, judeus brasileiros chegam a fazer viagens gastronômicas para cidades como Nova York, Miami e, claro, Jerusalém. "A gente só viaja para lugares onde se pode comer bem", afirma a dona-de-casa Sandra Tawil, 41, que segue religiosamente a dieta kasher, tanto em Higienópolis, onde vive, quanto em qualquer outro lugar do planeta.

Aos poucos, empresas brasileiras estão percebendo esse mercado e se adaptando em busca de consumidores tão exigentes e de alto poder aquisitivo. Uma delas é a fabricante de leite Nilza, que há 15 anos trabalha com produto kasher. A empresa, uma vez por mês, pára uma de suas seis linhas de produção para atender à comunidade judaica. "Aguardo a chegada do leite a ser processado com o local totalmente limpo e higienizado", explica Marcelo Nogueira, 43, diretor industrial. São 50 mil litros por mês, apenas 0,25% da produção total da empresa. O benefício, diz Marcelo, é a "credencial de qualidade diferenciada".

A Minamel, empresa de Içara (SC) fundada em 1989, há três anos percebeu que existia um mercado e muitos seguidores do kasher. Foi quando Agenor Castagna, 58, proprietário do local, resolveu abrir a sua indústria de mel para a comunidade judaica. Hoje, 90% dos produtos da Minamel têm certificação. O empresário contratou um rabino para supervisionar a produção e ganhou um novo nicho de mercado.

Tanto detalhe e preocupação com a limpeza acabou associando a comida judaica a um produto confiável. Morris Abadi, 47, diretor do açougue Livenn, em Higienópolis, se enche de orgulho quando vê clientes que não são judeus no balcão. "É mais cara que a carne não-kasher, entre 30% e 100%, e menos saborosa", compara. "Quem não é judeu pode entrar em qualquer açougue e levar a melhor carne. Não há comparação com o gosto da picanha."

Na época em que cursava administração de empresas, Morris andou experimentando "o que não devia". Judeu ortodoxo não pode comer, por exemplo, a parte traseira do boi, onde está localizado o nervo ciático. "Faz 20 anos que não sei o que é um filé à parmigiana", afirma o diretor do açougue, sofrendo com as regras impostas pela religião. "Não deveria nem ter provado."

Restaurante convertido
A Federação Israelita do Estado de São Paulo calcula em 70 mil o número de judeus na capital paulista. Estima-se que, destes, cerca de 15% sejam ortodoxos e sigam estritamente a dieta kasher. Mesmo sendo um público pequeno, converter um estabelecimento ou oferecer opções no cardápio pode ser um bom negócio. Já é possível comer em São Paulo sushi kasher. O mais tradicional item da culinária japonesa é feito com ingredientes certificados no Café Med, no Itaim.

Outro restaurante que embarcou na onda é o marroquino Nur, em Higienópolis, o bairro de maior concentração da comunidade judaica em São Paulo. Chef e proprietário do Nur, Daniel Marciano resolveu apostar no cardápio kasher a pedidos. Não se arrependeu. Trocou o tradicional quibe com coalhada pelo steak, com carne de segunda, que virou o prato mais pedido, a R$ 40. Desde 15 de maio, o estabelecimento só serve kasher. As mesas, antes vazias, hoje vivem lotadas.

A "kasherização" total do restaurante não foi tarefa simples. Daniel trouxe Jairo Varella, 41, o "machguiach", de Israel e adaptou a rotina dos funcionários. "É como um casamento desfeito. Você fica perdido", diz a cozinheira Fátima Muniz, espírita, referindo-se ao trabalho de Jairo, que lava e inspeciona as verduras e os legumes, função que antes era dela. "Agora a gente só mexe com a carne. E, pior, temos um cão de guarda", brinca, em referência ao colega vindo direto de Israel e 100% kasher.

Below Post Ad

Postar um comentário

1 Comentários
* Please Don't Spam Here. All the Comments are Reviewed by Admin.
  1. Olá!
    Gostaria do seu e-mail para lhe enviar um texto sobre novo componente da comida kasher....

    Obrigada,
    Aguardo seu retorno,
    Fabia Dias
    fabia_dias@hotmail.com

    ResponderExcluir

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não do Blog. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie.Não publicamos comentários anônimos. Coloque teu URL que divulgamos