
Rudolf Hoess (1901-1947) foi o primeiro oficial nazi de alta patente a admitir ter posto em prática a Solução Final sobre o extermínio dos judeus, no dia em que foi capturado pelo judeu alemão Hans Alexander, refugiado no Reino Unido desde o final da década de 1930.
Hanns Alexander (1917-2006), o captor de Rudolf Hoess, foi dos primeiros a alistar-se como voluntário no Auxiliary Military Pionner Corps, que incorporava os refugiados da Alemanha e de outros países que queriam combater o regime nacional-socialista alemão, durante a II Guerra Mundial.
O livro do jornalista e investigador britânico Thomas Harding utiliza a biografia dos dois alemães, para contar a história do Partido Nazi e do conflito europeu, entre 1939 e 1945, mas sobretudo do antissemitismo e do genocídio dos judeus.
De acordo com a investigação - que utiliza fontes diretas, incluindo militares britânicos - o jovem capitão Hanns Alexander conseguiu localizar o comandante do complexo Auschwitz-Birkenau, depois de interrogar a mulher de Hoess e os seus cinco filhos, tendo pouco depois identificado o oficial SS através do anel de casamento.
Rudolf Hoess, no final da guerra, como muitos outros militares nazis, procurara refúgio no norte da Alemanha, tendo acabado num campo de prisioneiros, sob identidade falsa, mas mantendo contacto com a família através das redes clandestinas do partido nacional-socialista.
Hanns Alexander, que depois do desembarque da Normandia (junho de 1944) conseguiu detetar o governador nazi do grão-ducado do Luxemburgo, passara a integrar a Comissão de Investigação de Crimes de Guerra, com ordens para capturar o "Kommandant" de Auschwitz-Birkenau, o complexo de extermínio edificado na Polónia ocupada.
O livro refere que Hanns Alexander, não tendo conseguido qualquer informação junto dos cinco filhos menores do oficial SS, acabou por prender a mulher, Hedwig Hoess, que afirmava que o marido estava morto. Sob a ameaça de deportação do filho mais velho para a Sibéria, Hedwig acabou por apontar o local onde Rudolf estava a viver e o nome que estava a usar.
Depois de detido, Hoess acabou por ser "traído" pela aliança, que dizia não conseguir tirar, até ao momento em que Alexander se mostrou decidido a cortar-lhe o dedo. Então, de acordo com o autor, "Rudolf tirou relutantemente" o anel, onde se encontrava gravado o seu nome e o da mulher.
Segundo o livro, o captor deixou o "Kommandant" durante dez minutos com os soldados britânicos que o espancaram, tendo mais tarde sido conduzido para uma prisão dirigida pelos Aliados perto de Minden, onde um advogado do War Crimes Group deu início a uma série de interrogatórios.
"Mais tarde, a declaração de Rudolf foi datilografada numa confissão de oito páginas e um resumo de um parágrafo. Era a primeira vez que um 'Kommandant' de um campo de concentração fornecia pormenores sobre a Solução Final. Rudolf acabara de confessar ter coordenado o assassínio de dois milhões de pessoas" (página 284), escreve o autor.
No tribunal de Nuremberga (1945-1946), o testemunho de Rudolf Hoess teve um forte impacto para o julgamento dos 23 nazis acusados de crimes de guerra, incluindo Herman Goring, segunda figura do regime.
"Comandei Auschwitz até ao dia 01 de dezembro de 1943, e calculo que, pelo menos, dois milhões e meio de vítimas foram executadas e exterminadas lá, sendo gaseadas e queimadas e, pelo menos, mais meio milhão sucumbiu à fome e à doença, perfazendo um total de três milhões de mortos", confessou Hoess em Nuremberga, antes de ser transportado para a Polónia, onde foi julgado pelo Supremo Tribunal Nacional, em Varsóvia.
Hoess foi condenado à morte e enforcado na manhã do dia 16 de abril de 1947, nas antigas instalações do complexo de extermínio de Auschwitz na presença de alguns antigos prisioneiros.
O livro incluiu um capítulo sobre a infância do oficial nazi que mais tarde cumpriu serviço militar durante a Grande Guerra (1914-1918), tendo sido incorporado, depois do Armistício, o Freikorps, unidade paramilitar independente do controlo governamental.
Hoess assistiu aos primeiros discursos de Hitler, em 1922, na companhia do amigo Martin Bormann, futuro secretário do Führer, e pouco depois alistou-se no Partido Nacional Socialista.
Dois anos mais tarde, em Dusseldorf, acompanhado de Boorman, espancou até à morte um camarada de armas, Walter Kadow, por supostamente ter traído um membro do Freikorps, na Letónia em 1919.
"Estava então firmemente convencido, tal como estou hoje em dia, que, enquanto traidor, ele merecia morrer", afirmou mais tarde o ex-comandante de Auschwitz, ao reconhecer a responsabilidade na morte de milhões de judeus, mas acrescentando que o único homem que matou com as próprias mãos foi Walter Kadow.
O livro "Hanns e Rudolf", de Thomas Harding (Bertrand Editora, 343 páginas), com mapas e fotografias inéditas de Rudolf Hoess e de Hans Alexander, foi publicado esta semana em Portugal.