Palestino verifica os danos em uma casa atingida por um bombardeio israelense em Zawayda, no centro da Faixa de Gaza, em 7 de julho de 2024 — Foto: EYAD BABA/AFP
Oficial diz que grupo discutirá trégua durante a primeira fase da proposta; enquanto negociações continuam, manifestantes tomam as ruas de Tel Aviv e ataque israelense mata 16 em Gaza
O Hamas está disposto a reconsiderar sua posição de que Israel se comprometa com um cessar-fogo permanente na Faixa de Gaza antes que um acordo entre as parte para uma trégua temporária e a troca entre reféns e prisioneiros palestinos seja assinado, afirmou um oficial sênior do grupo à rede americana CNN no sábado. A mudança no posicionamento, relatada pela primeira vez pela agência Reuters, pode ser a chave para o êxito de um acordo até então enterrado por divergências entre as partes.
O Hamas vinha defendendo de maneira contundente que um acordo só poderia ser alcançado se ele conduzisse ao fim da ofensiva israelense no território palestino, o qual governa desde 2007. Agora, o oficial sênior — e membro da equipe de negociações — disse à CNN que o grupo aceitaria que as negociações sobre um cessar-fogo total ocorressem durante a primeira fase de qualquer acordo, o que poderia durar pelo menos seis semanas.
Falando sob condição de anonimato, a fonte explicou ainda que os negociadores garantiriam uma trégua temporária, a entrega de ajuda humanitária ao enclave palestino e a retirada das tropas israelenses da região enquanto as negociações indiretas continuassem sobre a implementação das próximas fases. Ele também afirmou que o Hamas aceitou uma proposta para iniciar as negociações sobre a libertação de homens e soldados israelenses mantidos como reféns em Gaza após no máximo 16 dias do início da primeira fase.
A mídia israelense relatou anteriormente que um esboço da proposta israelense estabelecia condições semelhantes, pontuou a rede.
Na última semana, autoridades de Israel e do Hamas se reuniram em Doha para uma nova rodada de negociações, realizadas com a mediação do Catar, EUA e Egito. O chefe do Mossad (serviços de inteligência de Israel), David Barnea, teve reuniões na capital catari na sexta, depois de o Hamas apresentar novas "ideias" para alcançar um cessar-fogo. Israel reconheceu que havia ainda "diferenças" nas negociações, mas afirmou que enviaria uma delegação novamente a Doha para continuar as discussões.
Em nove meses de guerra, os combates em Gaza só foram interrompidos durante uma pausa de uma semana no fim de novembro, no qual foram libertados mais de 100 reféns (israelenses e estrangeiros, sendo mulheres e menores, todos civis) e 240 prisioneiros palestinos. Atualmente, 116 pessoas permanecem em Gaza, incluindo 42 que, segundo os militares, estão mortas. As mediações têm esbarrado desde então nas exigências incompatíveis entre os dois lados.
Além das condições do grupo, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, tem afirmado que o conflito continuará até "a destruição do Hamas e a libertação de todos os reféns". O premier, que foi acusado por Doha de obstruir as negociações, é pressionado interna e externamente: os EUA, seu principal aliado, e boa parte da comunidade internacional instam um acordo para a libertação dos reféns e a suspensão dos combates em Gaza, ao passo que a extrema direita ameaçou romper a coalizão e derrubar o seu governo caso fosse aceita alguma proposta que vislumbrasse um cessar-fogo sem o fim do Hamas.
Os três países mediadores — Qatar, EUA e Egito — lançaram um novo esforço para chegar a uma trégua, com negociações indiretas entre as partes. Diplomatas também estão mantendo conversações no Egito, informou o al-Qahera News, um meio de comunicação próximo aos serviços de inteligência egípcios neste domingo.
Nove meses de guerra
Enquanto as negociações prosseguem envoltas de expectativas, mas sem uma resolução concreta, a guerra completa nove meses neste domingo. Em Israel, familiares de reféns que ainda permanecem em cativeiro deram início ao "dia de interrupção". Os manifestantes bloquearam o trânsito em um cruzamento na capital Tel Aviv pedindo eleições e que o governo faça mais para libertar os reféns. Eles também bloquearam estradas e rodovias em frente às casas dos membros da coalizão do governo, informou o jornal Haaretz. Até o momento, pelo menos cinco pessoas foram presas, informou o jornal Times of Israel.
A polícia montada israelense dispersa manifestantes de esquerda durante uma manifestação contra o governo em Tel Aviv, em 6 de julho de 2024 — Foto: JACK GUEZ / AFP
À noite, eles seguirão para a frente do prédio da Histadrut Labor Federation (central sindical dos trabalhadores no país) e as sedes do Ministério da Defesa e das Forças Armadas israelenses, em Tel Aviv, informou o Haaretz, pontuando que uma marcha até a casa de Netanyahu, em Jerusalém, também está sendo organizada. A polícia reforçou a segurança ao redor da residência na noite anterior.
Em uma publicação no X (antigo Twitter) feita neste domingo, o presidente Isaac Herzog enfatizou que "é dever do país trazê-los de volta, e isso está no coração do consenso". "A nação inteira quer o retorno deles, e uma maioria absoluta apoia um acordo de reféns", acrescentou. No dia anterior, manifestantes contrários ao governo que bloqueavam uma rodovia entraram em confronto com a polícia a cavalo antes que as autoridades usassem canhões de água para limpar a estrada.
Já em Gaza, os nove meses de conflito foram marcados por mais ataques israelenses. O Crescente Vermelho Palestino informou que seis pessoas, incluindo duas crianças de três e quatro anos, foram mortas em um bombardeio israelense contra uma casa em Zawaida, no centro da Faixa de Gaza, e no norte do território, três pessoas foram mortas em um ataque a uma casa, de acordo com equipes de resgate e a Defesa Civil.
A imprensa palestina afirmou que o vice-chefe do Ministério do Trabalho em Gaza, Ihab al-Ghussein, foi morto em um ataque aéreo israelense na cidade de Gaza. As Forças Armadas israelenses ainda não comentaram sobre o ataque.
O campo de refugiados de Nuseirat — que no sábado foi atingido por um bombardeio a uma escola administrada pela ONU que deixou 16 pessoas mortas, de acordo com as autoridades sanitárias do enclave — continua sob fogo israelense. Israel informou no sábado que sua aeronave atacou "vários terroristas" no "setor da escola al-Khauni" de Nuseirat, dirigido pela ONU.
A organização alertou sobre as condições "desastrosas" em que os 2,2 milhões de habitantes da Faixa sobrevivem, sem comida e água devido ao cerco imposto por Israel. Além disso, 80% da população foi deslocada pelo conflito e há relatos de mortes por desnutrição. A Agência da ONU para Refugiados da Palestina no Oriente Médio (UNRWA), que coordena grande parte da ajuda a Gaza, informou no sábado que dois de seus funcionários foram mortos em al-Bureij. A agência informou que 194 de seus funcionários morreram durante o conflito.
A guerra começou após o ataque do Hamas contra Israel deixou 1,2 mil pessoas mortas, a maioria civis, e cerca de 250 pessoas foram sequestradas. Em resposta, Israel tem lançado uma ofensiva massiva contra o enclave que já deixou mais de 38,1 mil palestinos mortos, a maior parte mulheres e menores de idade, segundo o Ministério de Saúde de Gaza. O conflito também alimenta a preocupação internacional de que se espalhe pela fronteira norte de Israel, onde a troca de ataques entre o exército e o movimento xiita libanês Hezbollah ocorrem diariamente. (Com AFP)