Porque a política israelense está pronta para novas rivalidades e formações políticas.
No início de abril, Benjamin Netanyahu ganhou uma eleição que deveria levá-lo para um 11º ano consecutivo como primeiro-ministro de Israel, algo sem precedentes na história do país. Havia apenas um pequeno desafio em seu caminho: formar uma coalizão de governo.
À meia-noite desta quarta-feira (29), seu prazo para formar um governo expirou e ele teve apenas uma opção: enviar os eleitores israelenses de volta às urnas e recomeçar.
Para entender o que realmente aconteceu é necessário voltar em muitas décadas.
Em Israel, todos os cidadãos devem servir nas forças armadas ou realizar outro tipo de serviço nacional. Mas um grupo vinha sendo poupado desse dever desde que o Estado foi criado: os ultra-ortodoxos, conhecidos como Haredim, que constituem cerca de 10% da população. Graças à alta taxa de natalidade entre eles, a população Haredim duplica a cada 10 a 15 anos. Em 1948, havia cerca de 400 Haredim capacitados para servir o exército. Hoje existem mais de 50.000. De acordo com o departamento de estatísticas de Israel, até um terço da população de Israel será Haredi até 2065.
Os jovens Haredi estudam a Torá, em vez de usar um uniforme. Talvez a grande maioria dos israelenses acredita que isso seja injusto.
A Suprema Corte também não gosta do acordo. Em 2017, o tribunal declarou a isenção inconstitucional e exigiu a adoção de nova legislação sobre a questão. Desde então, o tribunal concordou em conceder ao governo alguns adiamentos para a introdução de mudanças, mas agora o prazo está terminando. O novo governo, quando formado, deve aprovar uma nova lei sobre a isenção do serviço militar dos Haredim. Se não o fizer, o tribunal poderá decidir que o acordo é nulo e provocar uma crise política e social determinando, em essência, que o Estado identifique os Haredim desobedientes.
E aqui está o problema. Os partidos políticos que representam os ultra-ortodoxos no Knesset (atualmente, com 16 assentos) têm muita influência porque foram cruciais para sustentar coalizões como a de Netanyahu. Em troca de seu apoio, os governos - nas últimas décadas, a maioria deles de direita - deixaram de lado a questão do serviço militar Haredi. Esse foi o plano combinado para o próximo Knesset.
Isso até que uma pessoa decidiu arruinar o plano: Avigdor Liberman, o líder do Yisrael Beiteinu, representa principalmente eleitores de origem russa e do leste europeu. Seus eleitores, como ele, estão à direita. Eles também são seculares e não têm muita simpatia pelos partidos ultra-ortodoxos e seu poder político para instituir políticas religiosamente coercivas.
Por anos, o Yisrael Beiteinu e os Haredi estavam em uma aliança desconfortável, junto com o partido Likud. Agora não estão mais. Durante as últimas semanas de negociação sobre a formação do novo governo, Lieberman decidiu insistir em aprovar uma versão de um projeto de lei sobre o serviço militar que os partidos Haredi se opõem. O por que de ele está fazendo isso agora, e não durante o último governo, pode ter a ver com ambições de mudanças maiores no cenário político de Israel, em particular a oportunidade de redesenhar o mapa das rivalidades políticas.