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Mendelssohn e o violino da vida

Mendelssohn e o violino da vida
Por Roberto Leon Ponczek

(dedicado à memória de meu amigo Salomão Rabinovitz*)

    Em 8 de  maio de 1945, os generais alemães assinavam, perante a cúpula dos exércitos aliados, a sua rendição incondicional, selando o fim da II Guerra Mundial, mais cruel e sanguinária da história da humanidade. Neste dia, os ingleses difundiram ininterruptamente em regime de broadcasting, através da BBC de Londres, o Concerto em Mi menor para violino e orquestra de Mendelssohn, com a interpretação do violinista russo Jascha Heifetz.
     Afinal, o que motivaria os programadores da BBC a tocar dia e noite o famoso concerto? Seria o fato de sua execução ter sido proibida durante a II Guerra, nos territórios sob ocupação nazista? Sim, Mendelssohn, assim como todos compositores e intérpretes de origem judaica haviam sido banidos das salas de concerto da Alemanha, sendo as suas partituras queimadas, alguns anos antes, em praça pública em Berlim. O concerto tornou-se assim uma espécie de hino de sobrevivência ao nazismo e a todas as formas de tirania.
    Felix Mendelssohn (1809-1847), compositor romântico alemão, foi neto do filósofo Moisés Mendelssohn, considerado o “Sócrates germânico” que defendia em seus inúmeros tratados a necessidade de integração e assimilação dos judeus à cultura secular europeia, num movimento filosófico chamado de Haskalá, ou Iluminismo judaico. Não previra, no entanto, o velho Moisés que suas ideias fossem tão radicalmente adotadas por seu filho Abraham (pai de Felix) que se converteu ao protestantismo, renunciando à fé judaica.
    Felix Mendelssohn acrescentou o sobrenome cristão Bartholdy, recebendo uma educação esmerada em ambientes frequentados pela aristocracia e pela intelligentsia germânicas. Revestiam-se de grande importância na vida berlinense de então, os saraus literários e musicais promovidos, aos domingos, na casa dos Mendelssohn-Bartholdy. Era habituè, destas reuniões ninguém menos do que o filósofo Hegel, dentre vários outros intelectuais de peso. Entretanto, a conversão de Mendelssohn ao cristianismo, não evitou que sua obra fosse execrada pelos nazistas como “música judaica”, “degenerada” e “corrompida”.
Fui acostumado a ouvir, desde a mais primordial infância, o concerto de violino de Mendelssohn, interpretado pelo lendário violinista russo Jasha Heifetz, ainda nos pesados bolachões 78 rpm que meu pai havia adquirido na Casa Irmãos Vitale, assim que chegou ao Brasil, ainda nos estertores da II Guerra, quando ainda fumegavam os campos de concentração da Polônia. Além de Heifetz, outros grandes violinistas judeus como Nathan Milstein, David Oistrach, Yehudi Menuhin e Isaac Stern, foram também silenciados pelo nazismo.
Recentemente uma nova e surpreendente geração de jovens violinistas (como o norte-americano Joshua Bell, a japonesa Midori, o lituano Julian Rachlin e o extraordinário russo Maxim Vengerov) resgatou, em sua plenitude, a dinastia dos grandes violinistas judeus banidos pelo nazismo.
    Motivei-me a escrever essa pequena crônica ao ouvir no radio do carro, na semana de Natal, o concerto para violino e orquestra de Mendelssohn, interpretado por Maxim Vengerov, sem dúvida um “novo Heifetz”, com regência do maestro Kurt Masur à frente da orquestra de Leipzig. Trata-se de uma interpretação à altura dos grandes mestres judeus do arco que me fez evocar antigas e ancestrais emoções, extraídas do fundo da memória de um filho de sobreviventes do Holocausto que nem Moses nem Felix Mendelssohn poderiam prever.
Vocês poderão ouvir uma demo dos concertos de Mendelssohn e Max Bruch em: http://www.allmusic.com/album/bruch-mendelssohn-violin-concertos-mw0001353363

*Salomão Rabonovitz foi um grande violinista baiano, que durante muitos anos foi spalla e diretor musical da Orquestra Sinfônica da Bahia. Conversávamos muito sobre os grandes violinistas judeus e os magníficos concertos que tocavam como ninguém.

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