Quebrando as tábuas

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Quebrando as tábuas
Ben Gurion - Coisas Judaicas

Conta-se que Ben Gurion, fundador de Israel, foi certa vez questionado sobre por que fazia ioga. Respondeu que ficar de cabeça para baixo era um exercício que o ajudava a entender melhor o mundo. 

Os resultados das urnas em Israel apontam para um mundo cada vez mais liderado por políticos e menos por estadistas. A manipulação eleitoral realizada em Israel convocando o medo da população para desequilibrar a balança é um expediente clássico.

Em Israel, a projeção do passado sobre o futuro tem impacto devastador sobre a liberdade de opção. Essa ode ao medo e à destruição da esperança já havia sido dramatizada no Congresso americano, mas a declaração de Netanyahu de que não haverá Estado palestino sob sua liderança foi um ato inadmissível, típico de políticos para quem a sua sobrevivência está acima de qualquer outra sobrevivência.

Ouvi certa vez de Shimon Peres que a definição de perversidade política é prometer algo que não pode ser realizado. A questão palestina não é só uma questão dos palestinos. É uma questão israelense, interna de Israel. Não diz respeito apenas ao conflito e à paz, mas é uma questão essencial à sua própria democracia, já que a ocupação significa dois tipos de cidadania.

O abandono das diplomacias é um convite à violência e define as relações pelo caminho da força. Os estadistas devem ter a coragem de ir à guerra quando inevitável, mas devem ter a disposição redobrada para canalizar os ódios e sangues devidos e pagar suas contas. Este governo está em negação dos custos embutidos nessas ações. Elas o isolam do mundo e também de uma parcela da comunidade judaica mundial cuja identidade é baseada em valores profundos e que não pode ser conivente quando esses valores são abandonados.

Um povo sem terra e uma terra sem povo, jargão do início do século XX, não é aceitável hoje. Há uma população palestina, sempre houve uma população palestina, que hoje é um povo, e a sustentabilidade e o futuro de Israel estão relacionados a tomar isto como um fato.

Reconheço os complexos impasses nas áreas de segurança, política e finanças desse conflito e não tenho pretensões a sugestões. Mas desde um lugar espiritual e moral não há espaço para neutralidade. Graves os tempos onde o óbvio tem características de audácia.

O maior momento do estadista-profeta Moisés não foi a retirada do seu povo do exílio, mas o episódio em que seu povo dançava diante de um bezerro de ouro, gerando furor divino. É dito que Moisés conteve a fúria ao absorver para si a energia que iria se manifestar sob forma de destruição. Ele a conteve até que pudesse descarregá-la ao quebrar as Tábuas da Lei. Moisés atira ao solo o maior objeto de veneração e, ao despedaçar o sagrado, reverte todos à sanidade.

Até que o sangue valha mais do que a sacralidade dos lugares e as ideologias, até que Jerusalém não seja o símbolo nem de vitória nem de derrota, mas um lugar de paz, até então se esperará não pelo político, mas pelo estadista. Pelos profetas dos dois lados que enxerguem o futuro pelo foco do projeto e da esperança e não apenas do medo.

Nilton Bonder é rabino

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