Antes que o Povo de Israel saísse para a guerra, um cohen, especialmente designado, anunciava publicamente que aqueles que estivessem nos seguintes status, poderiam voltar para suas casas sem ir para a guerra:
1. Os que construíram suas casas, porém ainda não a inauguraram. “Vedaberu hashoterim el haam lemor: mi haish asher baná váyit chadash velô chanachô yelech veyashov levetô... (Devarim 20:5) – E falarão os policiais ao povo, dizendo: Que o homem que edificou uma casa nova, e não a estreou, ande e volte para sua casa...
2. Aqueles que tinham plantado uma vinha, mas ainda não haviam desfrutado dela (ainda não passaram os três anos necessários pela Torá para que pudessem desfrutar dela). “ Umi haish asher natá’ kêrem velô chilelô yelech veyashov levetô...(Devarim 20:6) – Que o homem que plantou uma vinha e não a desfrutou, ande e volte para sua casa...
3. Quem tinha noivado e ainda não casou. “Umi haish asher erás ishá velô lecacháh yelech veyashov levetô... (Devarim 20:7) – Que o homem que tenha desposado uma mulher e não a tenha tomado, ande e volte para sua casa...
4. Aqueles que estivessem com medo. “Veyassefu hashofetim ledaber el haam veameru mi haish hayarê verach halevav yelech veyashov levetô velô yimás et levav echav kilvavô” (Devarim 20:8) – E continuarão os policiais a falar ao povo e dirão: o homem medroso e de coração mole, que volte para sua casa e não derreta o coração de seus irmãos como o seu coração.
Nossos sábios nos dizem, que os três primeiros foram incluídos nesta proclamação por conta do quarto (os que estivessem com medo). Seria vergonhoso, após o anúncio do cohen, que do meio de um grupo de soldados, retirassem-se apenas aqueles que estivessem com medo. Dessa forma, incluindo-se outras categorias e deixando que todos se retirassem somente ao final do anúncio, os que se retiravam por medo não seriam notados.
Nota-se, que era imprescindível a retirada dos que temiam a guerra, para que o medo não se infiltrasse nas fileiras dos soldados e para que não se contagiasse todo o exército.
Um dos grandes pensadores de nossa geração, o Rabino Chayim Shmulevits zt”l, Rosh Yeshivá de Mir – que durante a Segunda Guerra Mundial teve sua sede em Xangai e hoje possui uma sede em Jerusalém e outra em Nova Iorque – disse, que o medo somente existe naqueles que não possuem fé e não depositam sua confiança em D’us. Ele acrescenta que o indivíduo que tem medo, põe em perigo o meio que o rodeia. Sobre esse assunto, ele traz um comentário do Ralbag (exegeta do Tanach) sobre a seguinte passagem em Melachim II, cap. 6:
Quando o exército de Aram cercou a cidade de Dotan – uma das cidades do centro de Israel – o jovem que era servente do profeta Elishá assustou-se e perguntou ao profeta – o que faremos para nos salvar? O profeta respondeu-lhe – “Al tirá ki rabim asher itánu measher otam” – Não tema, pois somos mais numerosos do que eles.
Consta que, em seguida, o profeta pediu a D’us que abrisse os olhos do jovem, para que ele visse que eles realmente eram maioria. Assim foi. Então o jovem viu a montanha repleta de cavalos e carroças, e fogo em volta do profeta. Logo em seguida, o profeta Elishá pediu ao Todo-Poderoso que cegasse o povo de Aram. E assim foi.
O Rabino Chayim Shmulevits zt”l faz o seguinte comentário: em princípio, o primeiro milagre – que o jovem enxergou a montanha repleta de cavalos e carroças – foi inútil, pois logo em seguida houve o segundo milagre – que cegou o exército. De qualquer forma, o exército de Aram não venceria o exército de Elishá.
O comentarista Ralbag nos explica, que o primeiro milagre foi necessário, para acalmar o medo e fortalecer o coração do jovem que acompanhava o profeta. O maior perigo era justamente o medo – que provém da falta de fé e confiança no Todo-Poderoso. Esse medo estava pondo a todos em perigo.
O segundo milagre só foi possível de se concretizar depois que o jovem se acalmou. Todo o tempo que houvesse alguém com medo ao redor do profeta, ele também corria perigo e o milagre não sobreviria em seu mérito.
Qual é, então, o remédio contra o medo? O Rabino Shelomô Wolbe, em seu livro Alê Shur, vol. I, diz: “Bitachon Bashem messalec pachadim” – A fé em D’us afasta todos os temores.
Embora encontremos em Mishlê (24:14) o versículo: “Ashrê adam mefached tamid” – Bem-aventurado aquele que sempre teme – oTalmud Berachot (60) diz, que esse versículo se refere a temer que a Torá que estudamos seja esquecida. Rashi explica no local, que esse temor é positivo, pois fará com que sempre revisemos os trechos estudados para não esquecê-los.
Outra prova de que o medo das circunstâncias comuns da vida e do cotidiano tem sua origem na falta de fé e confiança no Todo-Poderoso é um episódio relatado pelo Talmud.
Certa vez, quando Hilel Hazaken regressava a sua cidade, ouviu muitos gritos. Ele não se assustou e declarou: Tenho certeza de que esses gritos não provêm de minha casa. O Tehilim 112, versículo 7 diz: “Mishemuá raá lô yirá, nachon libô batuach Bashem” – Uma má notícia não temerá, pois seu coração deposita confiança em D’us.
Fonte: Revista Nascente