Jerusalém, 31 jan (EFE).- Israel deu o primeiro passo para penalizar o uso ou abuso de termos relacionados com o Holocausto, como a palavra “nazista”, fora de contexto educativo, o que originou um debate sobre a questão da liberdade de expressão.
Segundo um projeto de lei, todo aquele que utilizar a palavra “nazista”, assim como outros símbolos do Terceiro Reich “de forma equivocada e inadequada” será punido com até seis meses de prisão, além do pagamento de uma multa de 100 mil shekels (cerca de R$ 70 mil).
Aqueles que são a favor argumentam que se trata da resposta ao aumento do anti-semitismo no mundo, somado ao exagerado emprego de expressões relacionadas com o Holocausto no dia a dia em Israel, tanto no âmbito da política, como entre os jovens.
“A liberdade de expressão não é absoluta, mas relativa (…) Aqui ela superou todos os limites, devemos nos proteger desta irresponsável liberdade de expressão que eventualmente prejudica as pessoas”, declarou Shimon Ohayon, autor do projeto e membro do partido ultradireitista Yisrael Beiteinu.
Na opinião do legislador, o Estado judeu deve pôr fim ao uso de símbolos nazistas, assim como outros países já fizeram: “Enquanto Israel não proibir esse uso, não podemos nos queixar do fenômeno”.
Apesar de ainda não haver uma lei, qualificar algo ou alguém como “nazista” pode levar uma pessoa a julgamento já que a atitude pode ser considerada incitação à violência ou difamação.
Os críticos da nova iniciativa argumentam que ela representa um golpe contra a liberdade de expressão e é realmente difícil de ser cumprida em um país que se estabeleceu à luz do Holocausto e que conseguiu consolidar a democracia em meio a uma região tão instável.
A proposta foi motivada por vários incidentes, os mais recentes, protestos de ultraortodoxos, alguns inclusive vestidos com uniformes listrados de preto e branco como os utilizados nos campos de concentração.
Também não é incomum que os membros das forças de segurança sejam chamados de nazistas por parte de comunidades ortodoxas e colonos radicais. Além disso, uma pichação feita, supostamente, por judeus antisionistas no museu Yad Vashem dizia: “Hitler, obrigado pelo Holocausto”.
Outro acontecimento que faz parte da memória coletiva dos israelenses foram as manifestações, em 1995, durante o processo de paz de Oslo durante as quais foram mostradas fotos do ex-primeiro-ministro Yitzhak Rabin vestido com uniforme da SS, organização paramilitar ligada ao partido nazista.
A nova lei aborda igualmente a banalização do Holocausto pelo abuso de termos e sua temática na sociedade israelense, onde fazem parte do debate político com frequência.
O primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, por exemplo, fala sobre o genocídio periodicamente quando trata da ameaça nuclear iraniana.
Em artigo intitulado “Às vezes ‘nazista’ é a palavra correta”, Etgar Keret, filho de sobreviventes do Holocausto, afirma que o governo israelense considera o termo “uma arma de destruição não menos letal que a nuclear do Irã, motivo pelo qual insiste no direito básico de Israel se proteger da ameaça”.
O abuso desta terminologia também afeta os jovens, que costumam utilizar a palavra “Shoah” (Holocausto, em hebraico) para se referir a desastres cotidianos.
“A lei é estúpida, não precisamos dela, somos um país que sabe melhor do que ninguém o que aconteceu com o povo judeu no Holocausto. Lembramos disso todos os dias”, disse a deputada Mijal Rozin, do partido de esquerda Meretz, ao criticar o projeto que ainda deve passar novamente por um longo debate e três leituras no Parlamento antes de se transformar em lei, já que em 2012 ele não foi aprovado.
O presidente do Museu do Holocausto, Avner Shalev, propôs a “educação” como via para resolver o “abuso e o mal uso” de toda esta terminologia.
“A linguagem que usamos tem um impacto, e como sociedade deveríamos ser conscientes do poder das palavras e dos símbolos. Eu preferiria (resolver o problema) com a educação e através do debate público, criando uma atmosfera na qual estes termos não sejam banalizados e mal empregados”, declarou Shalev à Agência Efe.