Nos tempos contemporâneos, divulga-se a idéia de que o atual Estado de Israel foi fundado apenas pelos judeus vindos de fora para “usurpar” terras árabes ou palestinas. O que é um terrível engano do ponto de vista histórico.
Cumpre lembrar que a região chamada Palestina – nome dado pelos invasores romanos – abrangia a Terra de Israel, e os palestinos eram, portanto, os judeus que nasciam e moravam na região; 1700 anos mais tarde, vieram os muçulmanos, ou seja 700 anos após o nascimento de Jesus, que era judeu, e do advento do Cristianismo.
A cidade de Jerusalém nunca foi, durante todos esses séculos, a capital de outro povo que não dos judeus, desde o reino de David, há 3 mil anos.
Numa visão clara e insofismável, este livro relata a história de vinte séculos de gerações judaicas, muitas vezes esquecidas, que foram os habitantes da Terra de Israel, os precursores do moderno Estado, criado pela ONU, sob a égide de Osvaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores do Brasil na ocasião, e que deu continuidade à presença judaica na Terra ancestral do povo judeu.
Adaptado do livro "Vinte Séculos de Vida Judaica na Terra de Israel - As Gerações Esquecidas", de Dan Bahat (Ed. Ipsis)
O século 1 d.C. foi dos últimos períodos, alternados, de autonomia judaica em um país cada vez mais dominado por Roma. Lutas internas, resistência, injustiças e revoltas sucederam-se até eclodir, em 66 d.C., a guerra que terminou em 70 d.C. com a destruição do Segundo Templo, ordenada por Tito. O Templo fora construído em 536 a.C., e ampliado por Herodes, (N.T.: rei da Judéia, primeiro a ser nomeado pelos romanos) em 20 d.C.
Houve uma grande revolta contra os romanos, que durou mais de quatro anos, convulsionou todo o país e fez incontáveis vítimas.
Na Galiléia o comando estava a cargo de Joseph Ben Mattatia, mais tarde conhecido pelo nome de Flávio Josefo. Devido ao avanço dos romanos, os defensores se retiraram para a fortaleza de Iodfat, que foi conquistada depois de dois meses. Flávio Josefo conseguiu se salvar e se aliou aos romanos, (N.T.: tornando-se o maior historiador da época).
Na primavera do ano 70 d.C.; Tito chega aos muros de Jerusalém. A Cidade Alta e a Montanha do Templo resistiram durante meses. Em 9 de Av – no mesmo dia em que houvera a destruição babilônica – o Templo foi conquistado e incendiado. A Cidade Alta resistiu ainda mais alguns meses e depois caiu em mãos dos romanos.
O último bastião da resistência foi a fortaleza de Massada, onde mil soldados com suas famílias, sob a liderança do zelote Eleazar, sobreviveram por três anos, até que em 73 d.C. foi tomada pelos romanos. Os judeus preferiram o suícidio a caírem prisioneiros.
Durante o período do Segundo Templo, o Sinédrio era a autoridade judiciária do povo judeu, e seu Conselho, composto de 71 membros, ficava em Jerusalém.
Depois da destruição do Segundo Templo, símbolo da independência da nação, as instituições políticas, econômicas e espirituais da comunidade judaica continuaram a existir.
O Sinédrio transferiu-se de Jerusalém para Yavne e sua autoridade foi reconhecida pelos romanos.
Yavne torna-se, então, o ponto de atração de todos os judeus da Diáspora, dispersos pela Mesopotâmia, Cirenaica, pelo Egito, Chipre e Ásia Menor até quando, sob o imperador Trajano, (98-117d.C), muitas comunidades do Levante (países do Mediterrâneo oriental) e da África, que se sublevaram ao mesmo tempo, foram ferozmente destruídas.
Sob a dominação grega e romana foram feitas tentativas de impor aos judeus outras religiões e costumes, como o culto a César (N.T.: imperador de Roma).
Nesse esforço para helenizar o país, os ocupantes – durante o reinado de Adriano (117-138) (N.T.: que decidira construir um santuário para Júpiter nas ruínas do Templo) – provocaram a desesperada e heróica revolta de Bar Kochba (132-135), que foi inicialmente bem-sucedida, com a conquista de Jerusalém e uma tentativa de reconstrução do Templo.
Depois de três anos, a revolta foi sufocada com sangue, o arado foi passado sobre tudo o que restava de Jerusalém, e se formou uma nova cidade, chamada “Aelia Capitolina”. Nela os judeus tinham direito de entrar somente uma vez por ano no lugar onde antes se erguia o Templo.
A Mishná foi escrita nesse século. A forma definitiva dessa coletânea das antigas tradições e costumes judaicos ficou a cargo do Rabbi Jehuda Ha-Nassi.
A função do Nassi (N.T.: título dado aos herdeiros diretos do Rei David e descendentes do Rei Iehoiahim, de Judá, levado como prisioneiro para a Babilônia) na condução da população judaica começou após a destruição do Templo e se manteve até 429, ano em que o imperador Teodósio priva os judeus de qualquer autoridade, de recolher impostos e possuir grandes propriedades de terras.
O Nassi (príncipe) era o chefe do Sinédrio, órgão judiciário supremo, e exercia uma dupla função, que cobria tanto os assuntos espirituais quanto laicos da vida do povo.
Seja na Terra Santa seja no exílio, os judeus mantiveram os Nassi como seus chefes naturais. Sua influência era tão grande que os próprios romanos conheciam e reconheciam sua autoridade.
Depois da revolta de Bar Kochba, o centro espiritual se transferiu de Yavne para Usha, Beit-Shearim e Seffori (Sepphoris, Zppori, hoje Tzipori), na Galiléia, onde havia uma importante comunidade judaica. Na metade do século III, o centro se transferiu, mais uma vez, para Tiberíades (Tibérias).
Naquela época a força de Roma estava temporariamente enfraquecida devido ao conflito com a Pérsia e Palmira, que foi solucionado somente dois séculos mais tarde. É um período intenso e próspero para os judeus da Galiléia, onde numerosas sinagogas foram construídas, com arquitetura de alto nível artístico. Os judeus formavam um grupo compacto que tinha em alta conta a sua própria cultura, desenvolvera um sistema educacional de altíssimo nível e conservara pelo menos a sua autonomia jurídica.
O historiador Eusébio, bispo de Cesaréia, deixou observações detalhadas sobre a comunidade judaica da época. Sobre Lidda escreveu: “Na Terra Santa há uma grande cidade habitada somente pelos judeus, chamada Lod, em ara-maico, e Diacaesarea, em grego”.
No ano 351 houve uma revolta local, reprimida com rigor, e barba-ramente, pelo general Gallus, ocasião em que os famosos centros de ensino de Seffori e Lidda foram destruídos.
Houve um último raio de sol: Juliano, o Apóstata (362-363), em sua reação contra o cristianismo, demons-trou benevolência em relação aos judeus e anunciou a intenção de reconstruir o Templo de Jerusalém, assim que retornasse de uma campanha contra os persas, da qual, porém, nunca voltou.
A partir de então as condições pioraram cada vez mais rapidamente. No ano 380, Teodósio proclamou o cristianismo como religião do Estado; em 395, o Império Romano divide-se e a Judéia torna-se parte do Império do Oriente.
Em 399, o imperador Honório, com receio de que o ouro saísse de suas possessões para entrar nas terras do imperador rival, do Oriente, proíbe o recolhimento, na Itália, da taxa voluntária que cada judeu enviava anualmente para o Sinédrio. Esse duro golpe também foi vivamente sentido pela pequena corte de Tiberíades.
A Palestina torna-se cada vez mais um local de peregrinação de monges, que empreendem nessa região uma intensa ação missionária.
O incêndio de sinagogas passa a ser um fato corriqueiro.
O imperador Teodósio II (408-450) submete-se inteiramente aos pedidos da Igreja: os judeus são privados de sua relativa autonomia e do direito de ocuparem cargos públicos; surge a proibição de construir novas sinagogas.
Enfim, no ano 425, o imperador abole o Grande Sinédrio e leva os impostos recolhidos para o seu próprio tesouro. Desaparece, assim, o último vestígio de independência judaica.
Os cristãos passam a ser maioria na região e os judeus são proibidos de morar em Jerusalém, onde podiam entrar somente um dia por ano, como acontecera logo depois do ano 70 d.C., para chorar pela destruição do Templo.
Até o final desse século, talvez em decorrência do controle não muito rígido das leis, é retomada a construção de sinagogas em Tiberíades, Beit Shean, Nirim e da belíssima Sinagoga de Beit Alfa.
A atividade literária dos judeus nunca diminuiu.
Nesse século, o Talmud Palestinense foi completado e muitas obras escritas ou terminadas, entre elas o Midrash Rabbá e o Midrash Tanhumá – coletânea de homilias sobre ensinamentos acerca do Shabat, extraídos do Pentateuco.
Tiberíades torna-se o principal centro de estudo e da vida espiritual da região. A personalidade que mais se destacava era Zeutta, que fugira para a Terra de Israel vindo da Pérsia. Seu pai, que também se chamava Zeutta, tinha, aproveitando a situação política, conseguido proclamar na Babilônia um Estado judaico independente, que durou sete anos (495-502). Depois foi crucificado por ordem de Karad, rei da Pérsia.
Nesse século, muitos cristãos e entre estes, pessoas extremamente ricas e influentes, foram para a Palestina; a situação econômica do país melhorou de modo geral, como demonstra a ampliação e a construção de muitas sinagogas bonitas. (Beit Alfa, Havat, Jericó, Ashkelon, Gaza, etc.). Também no Negev foram fundados diversos centros em áreas até aquele momento desabitadas
Justiniano, que reinou de 527 a 565, fortificou as fronteiras, proveu as cidades de água e construiu igrejas magníficas. Mas, por outro lado, seu reinado assinalou o início de duras normas legislativas contra os judeus, que – com as modificações introduzidas por ele no Codex Theodosianus – perderam os poucos direitos que tinham até então.
Em seu famoso código, mais tarde base da jurisprudência européia, Justiniano incorporou todas as concessões e ordens que prevaleciam naquela época. É assim que elas figurariam implicitamente na bagagem jurídica do mundo medieval que estava surgindo.
No ano 603 os persas atacaram novamente o Império Bizantino e em 614 chegaram a Israel. Foram recebidos pelos judeus como salvadores, pois tinham conseguido manter sua independência contra Roma e contra Bizâncio. Assim, eles ajudaram na conquista de Akko e de Jerusalém, onde puderam voltar a morar, durante três anos.
Em 617, para obter apoio decisivo dos cristãos, os persas retiram a permissão, suscitando forte reação dos judeus, que passaram a ser perseguidos, de tal forma que acolheram com alívio o retorno do imperador de Bizâncio, Heraclius, em 629.
No começo, Heraclius assinou um pacto de proteção com os judeus, que pouco a pouco romperia, devido às pressões da Igreja. Os judeus foram expulsos de Jerusalém, e muitos processados ou mortos. A conquista da região pelos árabes e de Jerusalém, cerca de dez anos mais tarde, pelo califa Omar, trouxe, portanto, alívio aos judeus.
Os primeiros califas, seguindo até as últimas conseqüências o caminho de Maomé, haviam subjugado de maneira impiedosa os judeus que viviam na Arábia. As florescentes e importantes comunidades judaicas, bem como as tribos judaicas inde-pendentes foram expulsas, exterminadas ou obrigadas a abraçar o islamismo.
Mas os árabes desde que começaram a surpreendente série de conquistas que, em pouco tempo, iria levá-los a ocupar quase a metade do mundo conhecido na época, perceberam que, para não despovoar as novas possessões, deveriam neces-sariamente ser mais tolerantes com os seguidores de outras religiões.
Os judeus da Terra de Israel foram submetidos a muitas medidas vexatórias e a várias restrições, como as de não poder ocupar cargos públicos, portar armas, andar a cavalo, mas sua existência era, de resto, tolerada e tinham liberdade de culto. Com o tempo, as limitações tenderam a cair em desuso, mas de vez em quando reapareciam com desconcertante presteza. Assim, a tolerância, que em geral o Islã mostrava, ficaria como um dos fatores mais importantes na história judaica por muitos séculos vindouros.
Uma carta do século VII, encontrada no século XIX, mostra que setenta famílias de Tiberíades obtiveram permissão para se estabelecer em Jerusalém e que os judeus foram nomeados guardiões do Monte do Templo devido à ajuda fornecida à armada dos conquistadores.
Também em Hebron, os judeus, em reconhecimento ao auxílio que haviam dado, tiveram permissão para construir uma sinagoga em frente à Gruta de Mahpelah – onde, segundo as tradições judaica e muçulmana, estão enterrados os Patriarcas e suas esposas. Outras comunidades judaicas viviam no sul do país. Em Eilat, o Califa assinou um tratado com os judeus a exemplo do que fizera com outros grupos não-muçulmanos.
O período dos omíadas (a primeira dinastia de califas árabes) foi, como já dissemos, uma época de paz para os judeus da Terra de Israel. As condições dos judeus nos outros países árabes, no entanto, não melhoraram realmente. Expulsos de Khaibar e de Fadak, foram enviados em direção à Terra de Israel e se estabeleceram nas duas margens do rio Jordão e em Jericó.
O primeiro califado dos omíadas (661-750), cujo centro era Damasco, foi seguido pelo dos abássidas (750-1258), que fizeram de Bagdá a sua capital.
A Yeshivá (N.T.: escola talmúdica), ponto central da comunidade judaica da Terra de Israel, em seguida ao terremoto de 748 na Galiléia, transferiu-se de Tiberíades para Jerusalém; Michel, o Sírio, em suas crônicas, fala de trinta sinagogas destruídas.
A comunidade de Jerusalém continuava a florescer. Em troca de seu encargo de guardiões do Muro e da Cúpula da Rocha (Mesquita de Omar), os judeus foram isentos do pagamento de impostos pessoais. Há também teste-munhos de que a principal ocupação dos judeus fosse então o tingimento de tecidos, a fabricação de vidros e de pavios para lâmpadas a óleo.
No final do século, sob o domínio dos abássidas, as relações com os não-muçulmanos (fossem judeus ou cristãos) se deterioraram, sendo, inclusive, obri-gados a usar um sinal especial.
Discriminações sociais e econômicas fizeram com que muitos judeus deixassem a Terra de Israel indo para Fustat (Cairo antigo), onde fundaram uma nova comunidade.
Os abássidas, que reinaram em Bagdá até 1258, preocupados em reforçar suas posições no Iraque, descuidaram das províncias ocidentais.
Aproveitando da fraqueza do governo, tribos de beduínos começaram a entrar na Palestina para ocupar as terras cultivadas. A população foge dos pequenos centros, que foram rapida-mente ocupados pelos beduínos, para procurar refúgio nas cidades.
Esse século vê também o início do estabelecimento dos caraítas, que deixa-ram o Iraque e a Pérsia e se instalaram em Jerusalém.
Os caraítas eram membros de uma seita formada no século VIII que rejeitava o hebraísmo rabínico e aceitava somente as Sagradas Escrituras.
A luta dos judeus da Terra Santa para se libertar da tutela espiritual e cultural da Babilônia se expressou por meio do debate acerca do direito de estabelecer as datas das festividades. Esse direito foi reivindicado pelo chefe da Yeshivá mais importante do país, e a comunidade da Babilônia acabou por reconhecer a jurisdição, nesse assunto, dos judeus que viviam naquela região.
De uma carta enviada pelo caraíta Sahk Ben Mazliach para a comunidade caraíta do Cairo, no final do séc. X:
“Jerusalém é um santuário para os que buscam refúgio e dá alento aqueles que se lamentam e conforto aos pobres e necessitados. E todos os servos de Deus vêm aqui de várias cidades e entre eles mulheres que choram e se lamentam na língua santa e na língua persa e na língua de Ismael. E todos sobem o Monte das Oliveiras, todos os que têm o coração pesado e dolorido.”
Em 969 os fatímidas, guerreiros árabes, conquistaram o poder no Egito. Ocuparam também a Terra de Israel e reinaram até a Primeira Cruzada, em 1099.
Numerosos conselheiros de origem judaica serviram na corte, instalada no Cairo, a capital. Na Palestina, os pesados impostos para os não-maometanos obrigaram os judeus a trocar suas comunidades rurais pelas cidades maiores, onde, no entanto, sua situação melhorou muito pouco. Havia também comunidades no sul.
O historiador Yahya ibn Said Atantaki fala sobre uma comunidade judaica em Ashkelon, enquanto o geógrafo árabe Muqaddasi menciona a existência de comunidades em Gush-Halav, Akko e sobre o lago de Hule.
Em Tiberíades, prosseguiam o estudo e a interpretação das Sagradas Escrituras. Há documentos que provam que diversas gerações da família Ben Asher viveram ali. O mais famoso foi Aharon Ben Moshé Ben Asher, autor do texto massorético “Dikdukei Hateamin”.
A Massorá, exame minucioso e completo das Sagradas Escrituras na época talmúdica, para evitar incorreções, foi uma das realizações culturais mais importantes desse século por sua profunda influência sobre a cultura e o pensamento judaico posterior.
No início do século, reinou o Califa Al-Kakim, da dinastia dos fatímidas. Era um fanático que destruiu sinagogas e igrejas. A comunidade judaica, expulsa por ele de Jerusalém, transferiu-se para Ramle. Nesse período, numerosos imi-grantes chegaram à Palestina provenientes do Iraque e se estabeleceram em Tiberíades e Ramle, onde, devido à passagem das caravanas, o comércio florescia.
Em 1071, os seldjúcidas – um povo turco que havia estabelecido um império no Iraque e na Pérsia – entraram na Palestina e colocaram um fim ao domínio árabe na Terra de Israel. Em 1099, o país sofreria uma outra invasão, a dos cruzados. Essas hordas dos assim chamados libertadores, deixaram um rastro de perseguições e massacres, através da longa viagem da Europa à Palestina.
Uma vez tendo alcançado a Terra de Israel, eles destruíram as comunidades de Hebron e de Haifa e, conquistando Jeru-salém depois de dois meses de cerco, massacraram ou escravizaram tanto os muçulmanos quanto os judeus. Muitos destes prisioneiros, que acabaram como escravos na Europa, foram depois resga-tados pela comunidade judaica.
Algumas crônicas relatam atos de heroísmo realizados pelos judeus de Haifa contra os cruzados. O conhecido historiador das primeiras Cruzadas, Al-berto de Aache, em seu “Livro de Via-gem”, escreveu: “E a cidade de Haifa... foi corajosamente defendida pelos judeus contra os cruzados, apesar de todas as dificuldades”.
As comunidades mais distantes do palco da guerra, como aquelas da costa meridional, Rafah, Gaza e Ashkelon e as do Sinai setentrional floresceram e mantiveram relações culturais e comerciais com o Egito.
O domínio dos cruzados pode ser dividido em dois períodos: o primeiro foi aquele da conquista militar, da destruição de cidades e aldeias e do massacre de comunidades inteiras. Os judeus sobreviventes buscaram refúgio na cidade fortificada de Ashkelon, em Rafah e El Arish, e nas regiões mais remotas do norte da Galiléia.
No segundo, os cruzados, mais interessados em possuir cidades habitadas do que ruínas, asseguravam-se de seu domínio com acordos e tratados com as comunidades não-cristãs, incluindo os judeus, mas somente esses últimos eram proibidos de viver em Jerusalém.
Por outro lado, os cruzados abriram uma nova rota comercial e de passagem para viajantes durante o Levante. Milhares e milhares de peregrinos chegavam a cada ano em Jerusalém. Muitos permaneciam nela; assim, a cidade prosperava e crescia.
Muitos foram os viajantes e entre eles diversos judeus, dos quais o mais conhe-cido é Benjamim de Tudela, que visitou a Terra de Israel entre os anos de 1167 e 1173.
Apesar da proibição dos cruzados, Benjamim de Tudela viu judeus que moravam próximo da Torre de David e comunidades em Akko, Tiberíades, Cesaréia, Jaffa, Ramle, Ashkelon, como também várias comunidades rurais na Galiléia. Em Ashkelon _ que caíra, nas mãos dos Cruzados em 1153 _, ele encon-trou duzentos rabbanim, quarenta caraítas e trinta samaritanos. Mas de todo modo seu número era extremamente exíguo, não havia em todo o país mais de 2,5 mil judeus.
Em 1165, Maimônides (Rambam), o grande médico, jurista, filósofo e talmu-dista, emigrou da Espanha para a Pales-tina, com sua família, estabelecendo-se em Akko. Em seguida, devido à invasão dos cruzados, foi para o Egito, onde escreveu a maior parte de suas obras mais importantes e se tornou, poste-riormente, médico da corte de Saladino.
Depois de sua morte, de acordo com o desejo expresso por ele, foi sepultado em Tiberíades. De lá para cá seu túmulo passou a ser um centro de peregrinação para os judeus.
Jerusalém, desde o momento de sua conquista, em 1099, foi objeto de rivalidade entre príncipes e cavaleiros, nem sempre interessados ou inspirados naqueles ideais que formalmente haviam dado origem às Cruzadas.
De estirpe curda, da dinastia adjubita, Saladino aproveitou-se desse estado de coisas e, em 1191, recon-quistou a cidade.
O Islã torna-se novamente uma força dominante no país e os judeus recuperaram uma certa liberdade. Seu número em Jerusalém aumenta con-sideravelmente e muitos chegam de comunidades judaicas da Inglaterra, França e do Norte da África.
Em 1211, trezentos rabinos chega-ram da França e da Inglaterra com suas famílias.
Também sob o domínio dos mamelucos – uma milícia de origem turca que subiu ao poder no Egito, na Síria na Palestina, em 1250 – os judeus puderam manter a sua comunidade.
Muitos daqueles que se estabe-leceram na região nesse século, especial-mente os expulsos da França, eram pessoas de cultura elevada. Alguns se fixaram em Jerusalém, outros em Akko, Cesaréia e Tiro. Mais tarde, foram forçados a entrar para o interior, devido à política dos mamelucos de destruir as cidades costeiras para prevenir uma invasão dos cruzados.
A comunidade mais importante era a de Akko, onde o Rav Yehiel, de Paris, fundou em 1257 uma importante Yeshivá.
O famoso comentarista bíblico Nahmânides “Ramban” chegou à região em 1267, proveniente também da Espanha. Antes de se estabelecer em Akko, permaneceu por um certo tempo em Jerusalém.
As comunidades da Galiléia conti-nuavam a manter as suas tradições.
Rav Yechiel descreveu a forma como se dava a peregrinação de Safed até Meron, no túmulo de Rav Shimou Bar Yochai, um dos mestres do século II, discípulo de Rabbi Akiva:
“Os israelitas e os árabes reuniram-se no dia da festividade de Pessach Shení (14 de Iyar) para rezar e cantar... freqüentemente não há água e, enquan-to rezam, a água jorra imediatamente... .”
Autores árabes da época, como Dimashki, também falam dos hábitos daqueles que faziam a peregrinação a Meron. Em seu livro, “Conhecimento das maravilhas da terra e do mar”, ele escreve:
“Em Meron há uma gruta com fontes secas durante todo o ano. Num determinado dia do ano, judeus das redondezas e também das aldeias mais distantes vêm aqui, entram e param na gruta. Dali a pouco, durante um par de horas, a água começa a jorrar em abundância. Pegam-na e a levam para muitos lugares, inclusive para além-mar e chamam-na de ‘Água de Meron’.”
Embora os mamelucos – que conser-varam o poder até 1517 – não perseguissem os judeus e não colocassem obstáculos ao estabelecimento de novos centros judai-cos, a vida para os habitantes do país era miserável, além de ser agravada por desastres naturais como terremotos, estia-gens, e suas consequências, como epide-mias e a carestia.
Em seu livro “Liber Peregrinationis”, Giacomo de Verona, um monge que visi-tou a região em 1335, afirma que existia uma comunidade consolidada, vivendo há bastante tempo ao pé do Monte Sinai. Ele, referindo-se à ajuda que recebera dos judeus em sua viagem pelo país, escreveu:
“Um peregrino que deseja visitar os antigos fortes e cidades da Terra Santa deve procurar um bom guia. Os judeus têm a capacidade de relembrar a história desses lugares dado que esse conhecimento é transmitido de geração em geração pelos mais sábios entre eles. Assim eu pedi e obtive muitas vezes um excelente guia entre os judeus que lá vivem.”
Outros peregrinos da época, como Ogier d’Anglure, ou o florentino Giordio Gucci, citaram várias comunidades judai-cas que haviam visitado.
Nesse século, os judeus começam a se deslocar dos vilarejos da Galiléia para o centro urbano de Safed. Há documentos da época que relatam as reclamações dos muçulmanos por causa das inúmeras casas que foram construídas pelos judeus na cidade.
A imigração proveniente dos países europeus continua, até aumenta, mas os judeus encontram grandes dificuldades para se estabelecer em Jerusalém.
Algumas décadas antes, os frades franciscanos haviam fundado um monastério sobre o Monte Sion e desde então a posse daquela área tornara-se objeto de contestação.
Em 1428, quando os judeus procu-ram adquirir algumas casas sobre o Monte Sion, os monges apelam ao Papa, que solicita às Repúblicas Marítimas para não acolher mais, a bordo de seus navios, judeus que desejassem voltar para a Terra Santa.
Por outro lado, os mamelucos impõem pesados impostos sobre os judeus que viviam em Jerusalém, e, como a maior parte era de pobres artesãos ou de pequenos comerciantes, muitos foram obrigados a abandonar a cidade.
Em 1438 um rabino italiano, Elia da Ferrara, passou a residir em Jerusalém e se tornou o chefe espiritual da comunidade. Na época, viviam na cidade cerca de cento e cinqüenta famílias de judeus.
Até o final do século o governo irá abolir os pesados impostos, e os navios das Repúblicas Marítimas a acolher nova-mente os judeus. Segundo um discípulo do Rav Ovadia, mais de trezentas famílias vivem nessa época em Jerusalém.
Meshoullam da Volterra, que visitou a Terra de Israel em 1481, refere-se a judeus proprietários de casas e de terras em Gaza, Hebron e em Jerusalém.
Martin Kabtanik, um peregrino da Boêmia, comenta em seu livro, “Viagem a Jerusalém”: “Os cristãos e os judeus vivem, em Jerusalém, em grande pobreza e usam vestimentas de mendigos. Não há muitos cristãos, mas há muitos judeus, os quais são perseguidos pelos mu-çulmanos de várias formas. Estes últimos sabem que os judeus pensam e dizem que esta é a Terra Santa que lhes fora prometida, e que os judeus que aqui vivem são considerados santos pelos dos outros países porque, não obstante todas as misérias que lhes são infligidas, se recusam a deixar a Terra”.
Em 1517, o país foi conquistado pelos turcos otomanos, cujo regime duraria exatamente quatrocentos anos. No começo parecia que um certo renascimento seria tolerado, quase incentivado pelo governo. Havia então quatro centros judaicos importantes na Terra de Israel: Jerusalém, Safed, Tibe-ríades e Hebron.
De acordo com os recenseamentos da primeira metade do século moravam em Jerusalém entre mil e 1,5 mil judeus. Foi o sultão Solimão, em 1537, que reconstruiu os muros das cidades, assim como se vê hoje.
A maior comunidade, com quinze mil judeus, encontrava-se em Safed e redondezas. Muitos eram os refugiados expulsos da Espanha em 1492. A maior parte comercializava especiarias, óleo, queijo e frutas, e diversos eram tecelões.
Mas havia também um grande número de judeus que, uma vez chegados à região, consideravam quase um pecado se ocuparem de outra coisa que não fosse o estudo da Torá. Confiavam, portanto, as suas necessi-dades materiais às comunidades judaicas da Diáspora que, ao ajudá-los, poderiam, assim, tornarem-se meritórias.
Todos os anos, os assim chamados “Enviados do Misericordioso” eram mandados aos quatro cantos da Terra para recolher fundos para as “Quatro Cidades Santas” da Palestina e que, durante séculos, constituíram um importante elemento da vida do povo judeu. Enquanto difundiam as novas correntes do pensamento judaico nas comunidades mais distantes – da Índia ao Novo Mundo –, vivificavam a lembrança da Terra Santa e mantinham contatos pessoais.
De Safed, Rav Josef Caro, o autor do “Shulchan Arukh“, naquele período bastante próspero, chegou a escrever assim: ”Depois de cerca de 1500 anos de exílio e de perseguições, o Eterno se lembrou do pacto da Aliança com os Patriarcas do nosso Povo e reconduziu os judeus da escravidão, de todos os cantos da Terra, ao país da glória: eles se estabeleceram na cidade de Safed”.
Safed foi o centro do misticismo judaico e ali viveu inclusive o famoso cabalista Isaac Luria.
Não pode ser esquecida, nesse século, a grande empreitada idealizada por Josef Nasi, duque de Naxos, que – nascido em Portugal – assumiu impor-tantes funções na corte do sultão Solimão. Ele apresentou ao sultão um projeto com o objetivo de dar guarida aos muitos judeus que viviam como marranos, sob o contínuo perigo da Inquisição. Obteve do sultão a completa jurisdição sobre a região de Tiberíades, onde introduziu o cultivo do bicho-da-seda para dar trabalho aos imigrantes. Organiza também uma frota de navios para o transporte dos refugiados a partir dos portos italianos. Infelizmente, a guerra que irrompeu entre Veneza e a Turquia fez com que o projeto falisse.
Assim, a situação era tal que Pierre Belon, um médico francês, que visitou a Galiléia em 1547, escreveu:
“Se olharmos em torno do Lago de Tiberíades veremos as aldeias de Beit Saída e Korazim. Hoje os judeus vivem nestas aldeias e reconstruíram todas as localidades em volta do lago, iniciaram um comércio de peixes e devolveram a fertilidade à terra que estava abandonada.”
Ainda nos últimos anos do século, um padre inglês que visitou a Palestina escreveu em seu diário de viagens:
”Tiberíades, a cidade que Solimão deu a Graziola (Dona Gracia, sogra de Josef Nasi), uma grande dama judia, é totalmente habitada por judeus.”
Nesse século, o domínio turco, confiado praticamente à vontade despótica de seus funcionários é, como os anteriores, danoso para a Palestina, espoliada e oprimida por impostos e contribuições de todo o tipo e deixada fenecer na mais preocupante ruína.
Moradias, centros agrícolas, centrais para o fornecimento hídrico, bosques, tudo aquilo que aqui e ali tendia de tempos em tempos a ressurgir ca-minhava, ao contrário, inexoravelmente e pouco a pouco para a mais completa destruição. A isso se juntaram desastres naturais, como secas e epidemias, que dizimaram a população.
Um escritor cristão, Eugene Roger, relata que lá pelos idos de 1630 havia em todo o país somente cerca de quinze mil judeus. Muitos deixavam agora a Galiléia para se estabelecer em Jerusalém, onde os judeus ganhavam a vida como vendedores ambulantes, alfaiates e sapateiros.
Em 1700, um influente hassid, Judah o Piedoso, chegou da Polônia com um grupo de discípulos e suas famílias. Quando pouco depois ele veio a falecer, a comunidade de Jerusalém ficou novamente sem um guia espiritual.
Tiberíades também é abandonada em 1670, devido à brutalidade dos turcos.
Numerosos são os testemunhos dos viajantes da época sobre as duras condições de vida dos judeus. Como o de George Dandys, filho do arcebispo de York, que assim escreveu:
“Na sua terra os judeus vivem como estrangeiros, odiados pelos outros que ali também residem, expostos a todas as opressões e privações, que suportam com uma paciência inacreditável.”
E Ignazio von Rheifender, um monge franciscano da Alemanha, que em 1656 notara a presença de judeus nessa região:
“Também em Jerusalém vivem muitos judeus que vieram de todas as partes do mundo para esperar a vinda do Messias... .”
A mais famosa aspiração à redenção messiânica é expressa pelo movimento guiado por Shabbatai Zvi, em 1660. Os seus seguidores se desiludiram, quando, para fugir da morte, ele se converteu ao islamismo.
Continua o processo de decadência econômica e cultural do Império Otomano e das suas províncias, mas a imigração para a Terra Santa não pára, ao contrário, apesar de a vida ficar cada vez mais difícil, as comunidades judaicas começam a se organizar sozinhas.
Dois eventos merecem ser lem-brados – no contexto da renovação da Galiléia – no decorrer da primeira metade desse século: a fundação da nova vila agrícola de Kfar Yassif, onde os judeus começam a trabalhar a terra, e o convite do Xeque Dahir Al-Umar a Rav Haim Abulafia, nascido em Hebron e nomeado, depois, rabino em Smirna, para vir a Tiberíades: ”para tomar posse da terra que foi dos vossos Patriacas”. Rav Abulafia se estabeleceu em Tiberíades e assim começou uma nova fase de vida para essa comunidade.
Frederik Hasselquist, um médico sueco, que visitou o país em 1751, estimou que cerca de quatro mil judeus haviam emigrado para Israel somente naquele ano.
Em 1777, mais quatrocentos judeus vieram a se estabelecer em Safed, e as sinagogas, que eram em número de sete, passaram para trinta.
A rápida e veloz incursão de Napoleão, em 1799, não mudou subs-tancialmente as coisas, mesmo tendo, no decorrer dessa breve aventura, dirigido um convite aberto aos judeus da Ásia e da África, exortando-os a retornar à Terra de Israel e a reconstruir o Estado e a antiga Jerusalém.
Com o crescente empobrecimento do Império Otomano, o fardo dos impostos se torna cada vez mais pesado. O exército turco tem de rechaçar continuamente os ataques das tribos beduínas, obrigando os habitantes das vilas a se refugiar nas cidades e tudo isso, somado a vários desastres naturais, conduz a um decréscimo da população.
Calcula-se que durante a primeira metade do século em toda a Terra de Israel não vivessem mais do que duzentas e cinquenta mil pessoas. William Turner, diplomata e escritor inglês que visitou a Palestina em 1815, observou:
”A população de Akko é de cerca de sete mil pessoas, das quais um terço são de turcos, cerca de quinhentos são católicos maronitas e judeus, e o restante, Gregos.”
Mais tarde, relata: ”somente no ano passado, entre os judeus que para aqui vieram provenientes da Espanha, morreram três mil devido à peste”. Em Safed há entre mil e 1,5 mil casas das quais trezentas e cinquenta são habitadas por judeus e o restante, pelos turcos”.
“Em Tiberíades vivem cerca de quatro mil pessoas, das quais mais de 2,5 mil são judeus.”
De acordo com outras estimativas da época, havia entre cinco mil e sete mil judeus em Jerusalém, duzentos em Nablus e em Haifa, dois mil em Akko e cerca de quinhentos nas diversas aldeias da Galiléia.
Felix Bovet, um teólogo protestante que visitou a Terra de Israel em 1858, escreveu:
“Os cristãos que conquistaram a Terra Santa não souberam mantê-la, e, para eles, o local não teria sido mais do que um campo de batalha e um cemitério.
Os sarracenos, que a tomaram deles, por sua vez a perderam para os otomanos, que até agora detêm o poder. Estes fizeram da terra um deserto, que não se pode percorrer sem medo. Também os árabes que permaneceram mais tempo por aqui não podem ser considerados mais do que acampados. Armam tendas onde há pastos e encontram refúgio nas ruínas das cidades. O espírito do deserto que os trouxe aqui, do mesmo modo os levará embora, sem que permaneça o menor traço de sua passagem.
Deus, que deu a Terra Santa assim a tantos povos, não permitiu que nenhum deles se estabelecesse e criasse raízes. Sem dúvida, preservou-a para o Povo de Israel.”
A partir da segunda metade de 1800 abre-se uma nova era na vida da Terra de Israel. A crescente segurança no Oriente Médio e, sobretudo, o benévolo interesse demonstrado pelas potências européias acerca das populações na Palestina, tornaram possível o desenvol-vimento de uma colonização mais siste-mática e mais independente.
Filantropos, como o inglês Sir Moses Montefiore e o sul-americano Judah Tauro, elaboraram planos para atrair a população judaica pobre de Jerusalém e das outras cidades por meio do trabalho produtivo da terra.
A “Aliance Israelite Universelle” abriu a escola agrícola de Mikvé Israel próximo a Jaffa, da qual se seguiu, quase que imediatamente, a fundação da aldeia de Motza, vizinha a Jerusalém, e depois, em 1878, de Petah Tikva.
Os pogroms de 1880 na Rússia trou-xeram uma nova onda de imigração.
Pouco a pouco, começaram a surgir em toda a região colônias agrícolas e, com trabalho árduo e grandes sacrifícios, se começou a trabalhar a terra, desolada e abandonada por séculos.
Alguns rabinos, de indiscutível ortodoxia, começaram a ensinar que a libertação messiânica não seria o prelúdio, mas a conseqüência de um renascimento na Palestina judaica.
No final do século, Theodor Herzl, em seu livro “O Estado Judeu”, assim escreveu:
“Ninguém é bastante forte ou rico para transplantar um povo de uma moradia para outra. Isso pode ser feito apenas por uma idéia. A idéia do Estado judaico possui bem essa força. Durante toda a noite da sua história, os judeus nunca pararam de sonhar com este sonho real. ‘No próximo ano em Jeru-salém’. É a palavra mais antiga. Agora é o caso de mostrar que do sonho pode nascer um pensamento claro como o dia.”
Assim nasce o sionismo, para assegurar ao povo judeu um lar na Palestina, garantido pelo direito público.
Como escreveu Dante Lattes, “A história do Ressurgimento Judaico, que assumiu no fim do século XIX o nome de sionismo, deve-se limitar à época na qual o movimento de Retorno à Terra de Israel assumiu formas concretas, organizado de modo político e colonizador; senão seria preciso mencionar todos os muitos retornos esporádicos dos pequenos núcleos, que aconteceram século a século na história de Israel e dos quais se encontram exemplos e traços nos estratos que formam a população judaica da Terra de Israel. Um legado contínuo que uniu o povo a terra”.
Vimos como, durante vinte séculos a ligação que o povo judeu manteve com a Terra de Israel, nunca foi estática e mesmo se a chama da vida nacional judaica tenha se tornado tênue, esta nunca se apagou em torno das quatro cidades santas: Jerusalém, Safed, Tiberíades e Hebron.
Vimos como, a partir do século XIX, com o aumento da imigração, o início do cultivo da terra e o surgimento do sionismo, começou uma nova era na Terra de Israel. Em 1905 teve início a “Segunda Aliá”, uma imigração motivada ideologicamente, fundamentada sobre os princípios do trabalho judaico, de colônias agrícolas independentes, de fraternidade e igualdade entre os homens. É então que surge a forma pioneira de aldeias que hoje são bem conhecidas: o kibutz (coletiva) e o moshav (cooperativa). O idioma hebraico, há muito relegado ao uso litúrgico ou literário, renasce como uma língua viva.
A Organização Sionista Mundial começa a criar os instrumentos necessários ao renascimento da nação, primeiramente o Keren Kayemet Leisrael (N.T.: a primeira instituição ecológica do mundo), cuja tarefa foi a de comprar a terra, como propriedade inalienável do povo judeu, de beneficiá-la e de reflorestá-la, para a transformação do deserto em campos férteis, cultivados, e das colinas nuas em florestas exuberantes.
A Declaração Balfour, feita pela Grã-Bretanha em 1917, reconhecendo o direito dos judeus a um lar nacional na Terra de Israel, e o Mandato sobre a Palestina, conferido com esse objetivo em 1922 pela Liga das Nações, precursora da ONU, constituíram a base do reconhecimento internacional daquele que deveria se tornar, em 1948, o Estado de Israel.
O Mandato Britânico na Palestina perdurou até que a Organização das Nações Unidas – ONU aprovasse a Resolução 181, de 20 de novembro de 1947, em uma Assembléia Geral presidida pelo Exmo. embaixador brasileiro Osvaldo Aranha, por 33 votos a 13, estabelecendo na região dois Estados, um judeu e um árabe.
Os judeus aceitaram a Resolução e os árabes rejeitaram-na. Para que não fosse implementada, cinco países iniciaram uma guerra ainda antes da retirada dos britânicos. Já no curso dessa guerra, no dia em que terminava o Mandato, David Ben Gurion proclamou o estabelecimento do Estado de Israel (do qual se tornou primeiro-ministro). O novo país recebeu milhares de refugiados judeus que tiveram de fugir dos países árabes, integrando-os à nova nação.
Israel surgiu com o sacrifício e o trabalho de todos aqueles que lá viviam e dos que, saídos dos campos de concentração, da Resistência e dos países livres de todo o mundo, vieram para reconstruir a antiga terra como um porto seguro para todos os judeus, na esperança de criar um oásis de paz para as novas gerações. Mas foi necessário construir e defender este porto, porque – como disse Chaim Weizmann (N.T.: Presidente do Estado de Israel – 1949 a 1952) – decerto não foi oferecido ao povo judeu sobre uma bandeja de prata. O que vem depois é a história do moderno Estado de Israel.