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Jerusalém, a cidade dos corações divididos


Jerrold Kessel e Pierre Klochendler

Jerusalém, 6/5/2010, (IPS) - Diz um ditado popular que Jerusalém usa tantas coberturas para a cabeça – judeus, muçulmanos, cristãos – que fica difícil chegar ao seu cérebro.

Enquanto israelenses e palestinos disputam o direito de usar o principal chapéu de Jerusalém, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, vai assumindo que seu enviado especial para o Oriente Médio, senador George Mitchell, não terá de apelar ao cérebro da cidade, mas ao seu coração. Bendita, mas também maldita, por sua própria santidade, Jerusalém ainda pode lançar por terras os objetivos de paz de Obama.

O governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu aprovou em março a construção de 1.600 novas casas em um assentamento da ocupada Jerusalém oriental. Assim, e apesar dos desejos do hierarca, a cidade saltou para primeiro plano nas discussões. Embora Obama vigie o que Netanyahu faz em Jerusalém, também tem de se ocupar com o que ocorre em seu próprio terreno. E ali, os que apoiam o líder israelense insistem que Washington não ignore as preocupações do Estado judeu com o destino de Jerusalém.

Quem vem pressionando mais a Casa Branca é Elie Wiesel, sobrevivente do Holocausto e prêmio Nobel da Paz em 1986. No mês passado, Wiesel publicou um anúncio de página inteira nos jornais The Washington Post, The Wall Street Journal e The New York Times, em uma tentativa de reduzir a pressão dos Estados Unidos para que Israel suspenda as novas construções em Jerusalém oriental. “A pressão não levará a uma solução. Por que abordar prematuramente o problema mais complexo e delicado?”, escreveu Wiesel.

Para os judeus, a importância da cidade está acima da política, insistiu. “Jerusalém é mencionada mais de 600 vezes nas Sagradas Escrituras, e nem uma no Alcorão”, afirmou. “Pertence ao povo judeu e é muito mais que uma cidade. É o coração de nosso coração e a alma de nossa alma. Hoje, pela primeira vez na história, judeus, cristãos e muçulmanos podem orar em seus lugares sagrados”, acrescentou. “Judeus, cristãos e muçulmanos foram autorizados a construir suas casas em qualquer parte da cidade. A angústia em torno de Jerusalém não tem a ver com os bens de raiz, mas com a memória”, disse Wiesel.

Outra destacada figura judia dos Estados Unidos – e que, com Wiesel, é um importante partidário de Netanyahu – é Ronald Lauder, presidente do Congresso Judeu Mundial. Em uma carta que publicou no The Washington Post e The Wall Street Journal, Lauder chegou a questionar o compromisso de Obama com a segurança de Israel. Muitos israelenses, especialmente os de linha dura que integram o atual governo, insistem que Obama comete um erro ao dar prioridade ao tema de Jerusalém. Mas outras vozes israelenses se manifestam contra a súplica “deixem Jerusalém em paz”.

Em uma coluna publicada no jornal Haaretz, Yosi Sarid, ex-ministro de governos israelenses favoráveis à paz, escreveu sobre as próprias palavras de Wiesel. “Lendo sua carta, alguém distante provavelmente concluirá que, em Jerusalém, os judeus, cristãos e muçulmanos adoram seu Deus sem obstáculos, que a todos é permitido construir suas casas em qualquer parte da cidade. Alguém está enganado, meu caro amigo. Não só é possível um árabe não construir ‘em qualquer parte’, como deve agradecer a Deu se não o desalojarem de sua casa e o joguem na rua junto com sua família”, escreveu.

“Jerusalém é sagrada para todos”, continuou Sarid. “É por isso que uma solução não pode esperar pelo fim do conflito. Este não terá fim se for adiada uma resolução até que, como você diz, os israelenses e palestinos encontrem maneiras de viver juntos”, acrescentou. “Você escreve que Jerusalém está acima da política. Não é por acaso a política que aborda os assuntos mais pesados da humanidade, como as questões da guerra e paz, vida e morte? Não é a própria vida mais sagrada do que os direitos históricos, que a memória nacional e pessoal, mais sagrada inclusive do que Jerusalém?”, disse.

Sarid afirmou que não deve ser permitido que as alegações religiosas dominem. “Nossos piores inimigos ficariam contentes em vestir este conflito épico com o véu de uma guerra santa. Não nos unamos às suas fileiras, nem mesmo de modo não intencional”, ressaltou. Sarid defende o enfoque do presidente dos Estados Unidos. “Obama é muito consciente de suas obrigações para tentar resolver os males do mundo. Vamos permitir que use sua influência para nos salvar de nós mesmos. Ele pode pressionar as duas partes para dividir a cidade em duas capitais – para dar a Israel as áreas judias e aos palestinos as áreas árabes – com os locais sagrados sob uma autoridade internacional”, afirmou.

Também no Haaretz, o historiador israelense Zeev Sternhell alertou especificamente para as consequências de continuar permitindo que os ultranacionalistas religiosos se adentrem em bairros palestinos de Jerusalém oriental. “Jerusalém não é um assentamento, mas os que a estão convertendo em um somente atiçarão as crescentes chamas da falta de legitimidade de Israel”, escreveu Sternhell. IPS/Envolverde

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