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Chag Chanuká Sameach & Candelabro de Chanuká (I.L.Peretz

 
 
 
 
 
 
 
 
 
Candelabro de Chanuká
 
I.L.Peretz
 
Afinal de contas, estamos em Chanuká. Quero contar-lhes, pois, como um judeu, outrora rico, que o mesmo não lhes aconteça", foi salvo por um pequeno candelabro de Chanuká...
E pensam que era de outro? Ou, ao menos, de prata? Não, simplesmente de cobre e, além disso, estava quebrado. Um velho legado, que passara de geração em geração, torto, retorcido e com a metade de um bocal partido.
O home era um simples burguês.
De repente enriqueceu.
Como assim? Isso nada tem a ver com o assunto.
Dizem que certa vez apareceu na rua um soldado carregando algumas barras de ferro para vender. Ele as comprou por uma bagatela. Levou o ferro para casa... Passou a lima – ouro!
Fora surrupiado do banco!
De qualquer maneira, quando um judeu fica rico, tudo vira de cabeça para baixo! Em primeiro lugar, trocou de vestuário. Virou um alemão1 e ela, uma francesa. Tinham dois filhos, tiraram-nos do cheder  e puseram-nos no ginásio. Começaram a modificar o interior da casa... Havia uma estante de livros sacros. Quem é que precisa disso? Doaram os volumes à Casa de Estudos. A estante, velha, rachada foi atirada na cozinha para servir de lenha... Em seu lugar, a mulher colocou um espelho de corpo inteiro; de repente começou a gostar de si mesma, quis contemplar-se de alto a baixo... Mandaram chamar o adeleiro, venderam-lhe os móveis velhos por uma ninharia e compraram Luis XIV – coisas pequeninas, mimosas, e estofadas; pezinhos tortos, dourados, sobre rodinhas, uma delícia! As pessoas tinham até medo de sentar-se.
Havia um pouco de prataria velha, caixinhas de esrog e porta-especiarias, venderam-na por alguns vinténs, distribuíram-na entre os parentes como presentes de casamento. Em troca, compraram vidro, cristal – floreiras, vasos, como é a moda no mundo – tudo moderno!
Mas, como a roda da fortuna nunca pára, as coisas começaram a correr ao revés, tudo ao contrário. Os filhos já estudavam no estrangeiro, porém não havia mais dinheiro para as mesadas... O pai mal conseguia prorrogar as letras... e em parte alguma conseguia arrumar um empréstimo...
As coisas pioravam cada vez mais. Schloime-Zalman pôs-se a esquadrinhar a casa: restava algo para empenhar? O Luis XIV caía aos pedaços... Vidro e cristal, rebentados, estilhaçados... Sobravam alguns vasos, colados com gesso...
Começaram a passar necessidade.
E quando um judeu passa necessidade, ele se lembra um pouco de judaísmo...
A mulher emprestou de uma vizinha um Teitch-Humasch2 e pôs-se a lê-lo. O Pan Salomon, que já voltara a chamar-se Schloime-Zalman, paramentou-se certo dia com o xale sagrado e os filactérios e começou a rezar. E quando chegou a época de Chanuká, sentiu vontade de acender o candelabro e pronunciar as devidas preces...
Arrumaram de algum jeito as velinhas. Porém onde colocá-las? Correram à cozinha para ver se descobriam uma acha de lenha onde fixá-las, mas... nada! Não havia sequer uma lasca!
Schloime-Zalman recordou-se então que, no tempo da abastança, jogara, certo dia, um candelabro de cobre dentro do forno.
- Schloime-Zalman, - implorou a mulher – veja se consegue tirá-lo.
Assim, correndo todos os perigos, puseram uma cadeira sobre a mesa que empurraram para junto do forno. Tudo dançava, rangia. O Luis XIV gemia e a mulher de Schloime-Zalman segurava a cadeira – afinal, retiraram o candelabro...
Estava tão sujo que mal conseguiram limpá-lo. Procederam a bênção.
Isto repetiu-se no primeiro, no segundo, até o oitavo dia. Entretanto, nesta última noite teriam de deitar-se sem jantar. A alegria não era, pois, das maiores. Schloime-Zalman sentava-se de um lado da mesa, a mulher, do outro, ambos taciturnos, entregues a tristes pensamentos. Parecia-lhes que estavam condenados a morrer de fome.
De súbito, alguém tocou a sineta da porta. O casal levantou-se de um salto. Abriram. Entrou um moço, conhecido deles, um merca-tudo.
- O que desejas?
O agente mal conseguia conter o riso. Contou-lhes que um inglês maluco aparecera em Varsóvia. Escanhoado, ou talvez uma mulher disfarçada... Comprara tudo quanto era coisa velha e quebrada. O homem achava-se ali fora.
- Ele pode entrar? Certamente há de se encontrar algo... Foste rico durante tanto tempo...
O casal de velhos entreolhou-se. Que objetos antigos haveria? Neste ínterim o inglês entrou por iniciativa própria. Não tivera paciência de esperar e, além disso, a porta estava aberta. Em suma, o homem entrou e tirou o casaco de pele. De repente, du com o pequeno candelabro de Chanuká e atirou-se a ele como a uma panqueca quente. Agarrou-o com as duas mãos, os dedos trêmulos, os olhos cintilantes...
- Eu não disse que era doido? – sussurou o agente.
- Wie viel, wie vil?3 – perguntou o inglês num alemão macarrônico.
Para encurtar a história, venderam o pequeno candelabro. Deixaram o preço a cargo do senso de eqüidade do inglês e aceitaram o que ele lhes pagou.
- Realmente doido! – comentou Schloime-Zalman.
- E talvez fosse – observou a esposa timidamente – Elias, o Profeta? Tudo, graças à bênção das velinhas de Chanuká?...
De qualquer modo, tinham o suficiente para jantar aquela noite, para o almoço do dia seguinte e aindaí para sair à rua...
E aquele dinheiro mostrou-se de fato venturoso... A roda da sorte começou a girar em sentido contrário. A favor!
Schloime-Zalman tornou-se novamente Pan Salomon...
E quando as coisas correm bem, tudo ajuda... Chegaram cartas dos filhos, cheias de boas novas. Haviam vencidos sozinhos. Um era engenheiro em Londres. Importante! Casara-se! Convidava-os para que viessem visitá-lo. Queria que os pais conhecessem a nora...
Foram.
Depois de festejar por algum tempo com o filho e a nora, saíram para conhecer Londres... Casas, fábricas, teatros, salas de concertos, exposições.
Um dia, foram visitar uma casa de arte, um museu.
E imaginem só o estupor do casal de velhos quando deram, numa sala, atrás de uma vitrina, frente à frente, com o velho candelabro de Chanuká... Reconheceram os velhos e sorridentes leões... As pequenas árvores com pássaros... o pezinho torto e o bocal semipartido.
- Não estava doido! – concluiu o Mister (agora, na Inglaterra) Salomon.
- E não era Elias, o profeta! – acrescentou Mrs. Salomon.
Falar alto e fazer perguntas, em presença de sua jovem nora inglesa, não parecia de bom-tom.
Puseram-se, pois, a meditar no caso...
Não querem meditar também?
 
Notas
1 Traje ocidental como usavam os judeus alemães.
2 Uma velha elaboração em ídiche do Pentateuco, usada particularmente pelas mulheres.
3 Quanto custa?
 
Extraído de:
GUINSBURG, J. (Org.). Contos de I.L.Peretz. São Paulo, Perspectiva, 1966. p.191-194.
 

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