Gato filósofo questiona dogmas do judaísmo em HQ de autor francês
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Ilustração do francês Joann Sfar em "O Gato do Rabino", história de um felino que quer ser judeu
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
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A premissa pode parecer bizarra, se não tola: um gato engole um papagaio, começa a falar e decide se converter ao judaísmo, religião de seus donos. Mas, à medida que o leitor avança em "O Gato do Rabino", do francês Joann Sfar, é atraído pela ironia, pelo bom humor e pela inteligência do texto.Sfar, 35, é um dos principais novos autores das HQs franco-belgas -é autor da série "O Pequeno Vampiro", que foi lançada no Brasil e vai virar filme. Como ele mesmo definiu, citando o filósofo e poeta Gaston Bachelard (1884-1962), sua especialidade é "poetizar a realidade". Em "O Gato do Rabino" ele soma a essa "poetização" uma ironia crítica, materializada na figura do felino.Como o título indica, o gato pertence a um sacerdote judeu e à sua filha, Zlabya (por quem o bichano é apaixonado). Incomodado com uma dessas injustiças da vida -o fato de Deus ter dado voz aos papagaios, que só falam bobagens, e não aos gatos-, o felino traça a ave, tomando seu dom da fala.A partir daí, o gato assume as características de toda criança que começa a descobrir o mundo e a se expressar: vira o bicho mais questionador que existe. Quando é informado de que é judeu, pois seus donos também o são, decide seguir todos os preceitos da religião: quer ser circuncidado e ter seu bar mitzvah -a cerimônia de passagem à vida adulta, que os garotos judeus têm aos 13 anos.Como o felino vai descobrir (numa seqüência que lembra a do velório da cachorra no "Auto da Compadecida", de Suassuna), não é fácil para os bichos fazer parte de uma religião.O texto de Sfar -primeira parte de uma série que já chegou a quatro volumes, na França- tem um leve tom infantil, mas é tão inteligente e bem-humorado que há de divertir mesmo adolescentes e adultos. E, que fique claro, seus questionamentos filosóficos não pretendem diminuir o judaísmo.