Golda Meir viveu e morreu por Israel

Golda Meir viveu e morreu por Israel

magal53
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Golda Meir viveu e morreu por Israel

 O termo “sabra” Ć© usado como sinĆ“nimo de um israelense nativo — mas Ć© tambĆ©m o nome de uma fruta da famĆ­lia das cactĆ”ceas, amarga por fora e doce por dentro. Em muitos aspectos, Golda Meir foi uma sabra — apesar de ter nascido em Kiev e ter sido criada em Milwaukee. 
Antes de se tornar primeira-ministra — numa Ć©poca em que isso era quase inĆ©dito para as mulheres — e liderar Israel durante uma guerra existencial, Golda havia sido uma das grandes arrecadadoras da DiĆ”spora, coletando fundos junto a judeus espalhados pelo mundo. O lendĆ”rio lĆ­der de Israel, Ben-Gurion, disse certa vez que, “um dia, quando a histĆ³ria for escrita, dirĆ£o que houve uma mulher judia que conseguiu o dinheiro que tornou o Estado possĆ­vel.” 
Esta imagem de fortaleza externa e doƧura interior emerge em Golda, em cartaz nos cinemas. 
O filme do israelense Guy Nattiv acompanha uma das fundadoras do Estado de Israel nos piores dias de seu governo, de 6 a 25 de outubro de 1973, quando Egito e SĆ­ria desencadearam um ataque coordenado Ć  naĆ§Ć£o judaica. Ainda imbuĆ­do da confianƧa conferida pela vitĆ³ria espetacular na Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel foi pego de surpresa pela investida de seus vizinhos no dia mais sagrado do calendĆ”rio judaico, o Yom Kippur. No poder desde 1969, Golda carregou sobre os ombros o peso da derrota fulminante infligida nos primeiros dias da guerra. Sob sua lideranƧa, porĆ©m, Israel virou o jogo, recuperando os territĆ³rios perdidos para o Egito no Sinai e para a SĆ­ria nas Colinas de Golan. Afora breves inserƧƵes de imagens de Ć©poca, nĆ£o se veem tanques ou tropas em Golda. O terror da guerra Ć© acompanhado Ć  distĆ¢ncia, em salas de controle onde sĆ³ se sabe do que acontece no front por transmissƵes de rĆ”dio. 
Na primeira cena em que Golda Meir aparece, vemos apenas sua boca tensa, em um superclose indiscreto que revela pelos brancos brotando do queixo. Em seguida, a cĆ¢mera mostra seus olhos castanhos, cercados de rugas. 

JĆ” nessas tomadas iniciais, o filme se equilibra entre a autenticidade e o artifĆ­cio: mostra as duras marcas da idade no rosto da protagonista, mas as bochechas caĆ­das e as rugas profundas sĆ£o resultado das prĆ³teses e da maquiagem aplicadas ao rosto de Helen Mirren. Golda Ć© falado em inglĆŖs, mas as comunicaƧƵes da linha de frente sĆ£o todas em hebraico. Trata-se de gravaƧƵes originais dos conflitos de 1973. 
A autenticidade do filme atinge aqui seu Ć”pice: o espectador ouve o desespero real de um sobrevivente ferido dentro de um tanque atingido por um mĆ­ssel. Tal como Ć© retratada, Golda Meir tem uma consciĆŖncia aguda de que seu paĆ­s corre o risco de ser aniquilado nessa guerra em duas frentes. TambĆ©m sabe que esse perigo teria sido bem menor com uma mobilizaĆ§Ć£o prĆ©via dos reservistas no feriado do Yom Kippur. Mesmo quando suas tropas comeƧam a obter vitĆ³rias, ela segue assombrada pelas vidas israelenses que poderiam ter sido poupadas. O roteiro de Nicholas Martin enfatiza esse drama Ć­ntimo com um recurso um tanto melodramĆ”tico, mas eficiente: a estenĆ³grafa que registra as reuniƵes da primeira-ministra com o alto comando militar Ć© mĆ£e de um jovem que estĆ” combatendo no Sinai. 
Golda Meir viveu e morreu por Israel

A escolha da inglesa Helen Mirren – que nĆ£o Ć© judia – para o papel central suscitou algumas crĆ­ticas e um debate fĆ”tuo nas redes sociais (a mesma gritaria jĆ” se levantou em torno do nariz prostĆ©tico que Bradley Cooper usou para viver o regente e compositor Leonard Bernstein em Maestro, filme que sĆ³ estreia em novembro). Sua atuaĆ§Ć£o, no entanto, Ć© o ponto forte do filme. Mirren dĆ” a nota certa para as caracterĆ­sticas contraditĆ³rias de sua personagem. 
Em sua interpretaĆ§Ć£o, a inseguranƧa da primeira-ministra que nĆ£o tinha experiĆŖncia militar prĆ©via nĆ£o destoa da firmeza com que ela fala com aliados e inimigos. SĆ£o de uma delicadeza tocante as cenas em que Mirren contracena com Camille Cottin. A atriz francesa faz Lou Kaddar, a assistente pessoal da primeira-ministra e sua Ćŗnica acompanhante nas sessƵes de tratamento de um linfoma agressivo (a doenƧa era mantida em segredo). No embate polĆ­tico, sĆ£o excelentes os diĆ”logos entre Golda e o entĆ£o secretĆ”rio de Estado dos Estados Unidos, Henry Kissinger (Liev Schreiber). “Eu sou americano em primeiro lugar, secretĆ”rio de Estado em segundo, e judeu em terceiro”, diz Kissinger, em uma passagem rĆ”pida por Israel. Golda Ć© rĆ”pida na resposta: “VocĆŖ esquece que em Israel nĆ³s lemos da direita para a esquerda”. Maquiagem e prĆ³teses sĆ£o artifĆ­cios que contribuĆ­ram para a autenticidade de Golda. As bochechas talvez sejam excessivas, mas nĆ£o prejudicam em nada a atuaĆ§Ć£o da atriz. NĆ£o se pode dizer o mesmo de outro artifĆ­cio: o cigarro. Consta que Golda Meir fumava 70 cigarros por dia, e esse detalhe teria de ser representado em qualquer filme sobre ela. Mas a obsessĆ£o com que a cĆ¢mera registra seu consumo tabagista e centra o foco em cinzeiros cheios configura um maneirismo cansativo. TambĆ©m hĆ” fumaƧa em excesso nos pesadelos e delĆ­rios que afligem Golda Meir nos dias de angĆŗstia. 
Em entrevistas, Guy Nattiv tem dito que quis fazer justiƧa Ć  personagem principal. Ele acredita que Golda foi injustamente responsabilizada pela falta de preparo de Israel em 1973, e por isso renunciou no ano seguinte. Falhas na inteligĆŖncia israelense teriam sido mais determinantes para o sucesso inicial de sĆ­rios e egĆ­pcios. 
Esse argumento, porĆ©m, ficou muito diluĆ­do ao longo do filme. Golda consegue reforƧar, isso sim, o papel da primeira-ministra na abertura de negociaƧƵes com o Egito, depois da guerra. O linfoma levou Golda Meir em dezembro de 1978, aos 80 anos. Dois meses antes, os acordos de Camp David, assinados por Menachem Begin, primeiro-ministro de Israel, e Anwar Sadat, presidente do Egito, lanƧaram a fundaĆ§Ć£o para a paz entre os dois paĆ­ses.

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