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A senadora Liliana Segre, de cinza, aplaude no Senado após sua proposta
ser aprovada Foto: Reprodução
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Partido de Berlusconi acompanha siglas de extrema direita, despertando críticas de número dois da Santa Sé.
ROMA - O Vaticano e a comunidade judaica de Roma expressaram consternação nesta quinta-feira, depois que partidos de direita da Itália se recusaram a apoiar a criação de uma comissão parlamentar para investigar o racismo, o antissemitismo e o ódio.
A ideia do comitê foi apresentada pela sobrevivente do Holocausto e senadora Liliana Segre em resposta a uma grande quantidade de mensagens de ódio em mídias sociais.
Os dois partidos da coalizão de centro-esquerda no poder, o Movimento 5 Estrelas e o Partido Democrata (PD) , apoiaram a moção, mas a Liga, de extrema direita, e seus aliados, os Irmãos da Itália e o Força Itália, do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi, se abstiveram. Apesar disso, a comissão do Senado será formada. Sua aprovação foi recebida com aplausos.
— A abstenção de alguns partidos é um pouco desalentadora. É uma decisão que consideramos errada e perigosa — disse a presidente da comunidade judaica de Roma, Ruth Dureghello.
Segre, que é uma senadora vitalícia sem partido, foi deportada da Itália para Auschwitz em 1944, quando tinha 13 anos. Ela foi uma das 776 crianças italianas menores de 14 anos que foram mandadas para o campo de extermínio nazista. Apenas 35 sobreviveram.
A senadora disse neste mês que recebia em média 200 mensagens de ódio por dia. Ela propôs a criação da comissão há mais de um ano, com o objetivo de combater “fenômenos de intolerância, racismo e anti-semitismo".
— Eles merecem pena, ou algum tipo de tratamento — afirmou nesta semana.
O poderoso número dois do Vaticano, o cardeal Pietro Parolin, também criticou a atitude dos partidos.
— Estou preocupado, porque em algumas coisas, como valores fundamentais, todos devemos estar unidos — disse ele a repórteres. — Existe o perigo de que tudo isso se politize. Precisamos deixar isso claro.
Ruth Dureghello também expressou consternação pelas abstenções.
— A comissão é um ótimo resultado institucional para o nosso país, tem um grande valor — disse a presidente da comunidade judaica. — A abstenção de algumas partes é desconcertante. É uma decisão que consideramos errada e perigosa.
'Italianos primeiro'
A Liga e seus aliados disseram que se abstiveram na votação de quarta-feira porque a moção de Segre era ambígua, ao citar, por exemplo, nacionalismo e etnocentrismo como possíveis forças motivadoras do ódio racial. O líder da Liga, Matteo Salvini motivou sua abstenção dizendo defender a liberdade de expressão.
— Somos contra o racismo, a violência, o ódio e o antissemitismo, sem “ses’ nem “poréns”. No entanto, não queremos que alguém da esquerda finja que é racismo o que para nós é convicção e direito a deixar "os italianos primeiro". Estamos ao lado daqueles que querem lutar pacificamente contra ideias que não são deste mundo, mas não queremos mordaças ou um estado policial que nos leve de volta a Orwell.
Enquanto os Irmãos da Itália e a Liga se posicionam na extrema direita do espectro político, a Força Itália se coloca como um partido de centro-direita, e alguns de seus líderes ficaram consternados com a decisão de se abster.
— Estamos traindo nossos valores e mudando nossa aparência — disse a parlamentar Mara Carfagna, que é comumente vista como uma possível líder do partido quando Berlusconi finalmente deixar a posição.
Ela manifestou preocupação com recentes esforços de Berlusconi para apaziguar diferenças com a Liga e entregar o controle efetivo do bloco de direita a Salvini. "Estamos sendo arrastados sem defender nossa identidade", escreveu Carfagna no Twitter.
O bloco de direita triunfou em uma eleição local na Úmbria no domingo, derrotando por 20 pontos percentuais o candidato do PD e do M5S, tirando a centro-esquerda do poder na região central da Itália pela primeira vez em 50 anos.
O M5S e o PD denunciaram os que abstiveram.
— Essa abstenção parece legitimar uma cultura de ódio que se reflete na sociedade. É uma página vergonhosa em nossa vida política — disse Elisa Tripodi, parlamentar do Cinco Estrelas.
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