Em algum lugar em um canto empoeirado de prédios da comunidade judaica no Porto, há caixas e mais caixas de fotografias antigas e árvores genealógicas, parte dos cerca de 15 mil pedidos de pessoas que tentam provar a ascendência judaica sefaradita para obter a cidadania portuguesa.
A partir de 2015, Portugal e Espanha anunciaram que qualquer pessoa com ascendência sefaradita - judeus expulsos da Península Ibérica a partir de 1492, como resultado da Inquisição - poderia solicitar a cidadania.
O processo espanhol é mais difícil e o país já anunciou que não aceitará novos pedidos de cidadania. Por esta razão, a maioria dos judeus sefaraditas optam pela busca da cidadania portuguesa.
Quase de um dia para o outro, anúncios coloridos na internet brotaram nas mídias sociais prometendo um caminho fácil para obtenção de passaporte português.
Leon Amiras, advogado especializado em pedidos de cidadania e que trabalha em estreita colaboração com a comunidade judaica de Portugal no Porto, calcula que, desde 2015, 15.000 pessoas entraram com pedidos de cidadania portuguesa por terem ascendência sefaradita judaica. Muitos pedidos não avançam além deste primeiro passo, apesar de terem apresentado documentos e fotografias comprovando a ascendência, diz ele.
O processo para obter a cidadania custa em média cerca de US$ 3.300, entre honorários de advogados e tradução e reconhecimento de documentos. O processo leva de 18 a 24 meses para ser aprovado.
O jornal espanhol El Pais informou que entre 2015 e 2018, a Espanha aprovou 8.365 pedidos de cidadania com base em documentos comprovando a ascendência judaica sefaradita, e outros de 5.600 pedidos ainda estão sendo analisados. O jornal português Lusa informou que 1.713 pessoas com raízes sefaraditas foram naturalizadas em 2017.
Segundo o El Pais, o maior número de cidadãos espanhóis recém-naturalizados entre 2015 e 2018 veio da Turquia e da Venezuela - com 2.693 novos cidadãos da Turquia e 1.487 da Venezuela. Israel tem o terceiro maior grupo, com 860 judeus sefaraditas que obtiveram a cidadania espanhola.
Da Península Ibérica, muitas famílias judias sefaraditas se espalharam por diversos cantos do mundo e isso está dificultando a comprovação de ligações com o passado na região, exigindo um trabalho cuidadoso de análise, inclusive com a ajuda de historiadores e genealogistas, dizem as autoridades.
Amiras afirma que teve clientes que voaram para o Marrocos para tirar fotos de antepassados judeus em cemitérios judaicos. "Algumas pessoas chegam e dizem: 'Eu não sei nada além do nome da minha avó', enquanto outras têm uma árvore genealógica que remonta a sete ou oito gerações", disse ele. "E isso é realmente emocionante e nos leva a pensar sobre a importância que o passado tem para essas pessoas".