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(foto: PAULA JOHAS/DIVULGAÇÃO) |
O evento conta com palestra da jornalista e escritora Luize Valente, que falará sobre a trajetória dos judeus no país durante a Inquisição na Europa
'Mais de 500 anos se passaram do descobrimento do Brasil e mais dois séculos depois do fim da Inquisição encontramos, a partir da herança cristã-nova, um Brasil que os brasileiros pouco conhecem''
Luize Valente, jornalista e escritora
Rezar para a lua nova. Sepultar os mortos com mortalha, sem caixão. Lançar fora as "águas" da casa durante o velório. Depositar pedrinhas em túmulos. Cobrir os espelhos da casa durante o luto. Não comer carne de porco. É longa a lista de tradições, pistas que, durante a Inquisição, seriam suficientes para lançar à fogueira, principalmente na Espanha e em Portugal, judeus sob o manto da conversão dos novos cristãos.
O fato de tantos rituais do judaísmo estarem ainda hoje entranhados na cultura sertaneja – muitos dos quais tão antigos que hoje pouco usuais entre judeus – levou a jornalista e escritora Luize Valente à pequena Venha-Ver (RN), onde a endogamia – casamentos entre tios e sobrinhas, primos e outros parentes próximos, prática bastante peculiar entre cristãos-novos – permitiu a manutenção da herança cultural. Assim, produziu, ao lado da fotógrafa Elaine Eiger, o documentário A estrela oculta do sertão (2005).
“Mais de 500 anos se passaram do descobrimento do Brasil e mais dois séculos depois do fim da Inquisição encontramos, a partir da herança cristã-nova, um Brasil que os brasileiros pouco conhecem”, assinala Luize Valente, também autora do romance ficcional O segredo do oratório” (2012), inspirado em sua pesquisa sobre as tradições judaicas cristãs no sertão nordestino. O livro conta a história da paraibana Ioná, que, ao descobrir ser descendente de cristãos-novos, recupera a história de sua família retrocedendo três séculos na península ibérica.
“Foram séculos de perseguição e dissimulação para milhares de judeus convertidos à força, os chamados cristãos-novos, que vieram para o Brasil nas primeiras décadas da colonização”, assinala Luize. Segundo ela, com as tradições proibidas, esses imigrantes tiveram os nomes trocados e a criação de seus filhos envolta em segredos. “Não podiam professar o judaísmo abertamente. Os que não abraçaram a fé católica perpetuaram tradições através dos casamentos endogâmicos, dos costumes e hábitos passados de geração em geração – geralmente pelas mulheres”, conta a escritora.
ROMANCE HISTÓRICO
Em palestra sobre esse tema, Luize Valente abrirá amanhã, às 17h, a 1ª Bienal do Livro Judaico de Belo Horizonte. Nascida no Rio, de ascendência portuguesa e alemã, Luize, que por mais de 20 anos atuou na cobertura jornalística internacional, há três anos se dedica à literatura. “Não sou judia, mas a minha temática de trabalho, dentro da área do romance histórico, são os temas judaicos”, diz. Ela começou a percorrer esse caminho em 1999, quando lançou, em parceria com Elaine Eiger, o livro Israel: rotas e raízes. Com a mesma parceria, produziu não só o documentário, como também, antes dele, Caminhos da memória – A trajetória dos judeus em Portugal (2002). Em 2017, lançou o romance ficcional Sonata em Auschwitz. Para o próximo setembro, ela se prepara para lançar o livro de contos Do tempo em que voyeur precisava de binóculos, pela Record, o primeiro fora da temática judaica.
A 1ª Bienal do Livro Judaico homenageará o escritor pacifista israelense Amós Oz (1939-2018), que militou ao longo de sua vida pela existência dos estados de Israel e da Palestina, única possibilidade de garantir a paz entre os dois povos. Maior expoente da literatura judaica, a trajetória de Amós Oz é um convite à reflexão sobre o diálogo, a convivência e o combate ao fanatismo.
PROGRAMAÇÃO 1ª BIENAL DO LIVRO JUDAICO DE BH
Data: 24 a 29 de agosto Local: Centro Comunitário Associação Israelita Mineira – Rua Rio Grande do Norte, 477, Bairro Funcionários
Agenda: Feira do livro, palestras, oficinas, shows e gastronomia Feira do livro: todos os dias Sábado – 24 de agosto: 17h – Palestra da jornalista e escritora Luiza Valente: Cristãos-novos e raízes judaicas no Brasil, um passeio pelo contexto histórico de O segredo do oratório” e do documentário A estrela oculta do sertão.
Valor: R$ 30/R$ 10 para estudantes
Domingo – dia 25: Das 12h às 15h – Almoço típico israelense com o chef Julio Geber – Valor por pessoa: R$ 60
15h30 – Fábula de Amós Oz, De repente nas profundezas do bosque, com texto adaptado e narrado por Mário Alves e com trilha sonora de Andressa Versi
17h – Bate-papo com a jornalista Luize Valente e Jacques Fux, autor de Antiterapias, mediado por Juliano Klevanskis. O tema será “O escrever com a influência da cultura e história judaicas”
Segunda-feira – dia 26: 19h –“Os judeus e as palavras: Amós Oz e o diálogo entre literatura e história”. Mesa integrada pela professora Nancy Rozenchan e professor Luiz Arnaut – Entrada gratuita.
Terça-feira - dia 27: 15h – Contos judaicos de tradição oral com o contador de história Mário Alves
19h – Palestra “Da colônia à república: Judeus construindo sua identidade brasileira”, professora Helena Lewin – Entrada gratuita.
Quarta-feira – dia 28: 16h – Dinâmica de arkadá (dança tradicional), com Maly Aronis 19h – Noite musical
Quinta-feira - dia 29 15h – Oficina de culinária (Burekas) com Ana Zarnowski. Inscrição: R$ 20
19h – Mesa “Holocausto, literatura e testemunho” – Sofia Débora Levy e Ethel Mizrahy Cuperschmid
20h – Lançamento do livro Por dentro do trauma: a perversidade no Holocausto e na contemporaneidade, de Sofia Débora Levy.
Original:Origens do judaísmo e dos cristãos-novos no Brasil são temas da Bienal do Livro Judaico de BH