Por Roberto Leon Ponczek*
QUEM TOMA BANHO?
O Tzadik (sábio)
Rebe Shmuel ben Elazar de Riga pergunta a seus alunos da yeshivá (escola judaica para jovens):
- Se dois homens entram
pela chaminé de uma casa e um deles sai limpo e outro sujo de fuligem, qual
deles tomará banho?
Uma balbúrdia fez-se na sala,
e quase todos diziam que era o
sujo. Sem ouvir uma resposta convincente de seus alunos, Rebe Shmuel responde:
- O limpo.
- Por quê? Perguntam os alunos.
- Porque o limpo olhará para o sujo e pensará que está sujo,
enquanto que o sujo olhará para o limpo pensando que está limpo.
- Entenderam bem?
- Sim claro. respondem os alunos.
Se está claro então me respondam:
- Se dois homens entram pela chaminé de uma casa e um deles sai
limpo e outro sujo de fuligem, qual deles tomará banho?
- Ora o Rebe já respondeu que será o limpo – responde-lhe a
sala em uníssono.
- Não! o sujo tomará banho.
- Por quê? Perguntam surpresos os alunos.
- Porque o sujo olhará
para si mesmo e verá que está sujo, enquanto que o limpo olhará para si e verá
que está limpo! Está claro?
- Sim. Respondem-lhes os alunos.
Então agora me respondam:
- Se dois homens entram
pela chaminé de uma casa e um deles sai limpo e outro sujo de fuligem, qual
deles tomará banho?
- As respostas já foram dadas, pode ser o limpo ou pode ser o
sujo, respondem os alunos.
- Não é verdade, nenhum deles tomará banho! Diz-lhes o Rabino.
- Como será possível isso acontecer? Perguntam os discípulos.
- Porque o limpo olhará para si, vendo que está limpo e o
sujo olhará para o limpo, pensando que esta limpo.
- Bem, agora já
podem-me responder:
- Se dois homens entram
pela chaminé de uma casa e um deles sai limpo e outro sujo de fuligem, qual
deles tomará banho?
Os alunos respondem que a depender da situação, ora o limpo,
ora o sujo, ora nenhum deles tomará banho.
- Novamente a resposta está errada, diz- lhes o Rebe.
- Ambos tomarão banho!
Por quê? – perguntam-lhe os alunos.
- Porque o sujo olhará para si , vendo que esta sujo e o
limpo olhará para o sujo, pensando que também esta sujo!
- Agora, sim, Rebe, entendemos que ora somente o limpo, ora
somente o sujo, ora ambos e ora nenhum tomará banho, a depender da situação.
Dizem triunfalmente os alunos !
- Novamente vocês se equivocam! Diz-lhes o Rebe.
Um longo silêncio se fez em sala de aula, e os alunos
estupefatos não sabiam mais o que responder. Quando finalmente o Rebe lhes diz:
Este problema não existe, pois é um falso problema. É
impossível dois homens passarem pela mesma chaminé e apenas um se sujar!
A parábola acima exemplifica porque o
Talmud vem sendo adotado em vários países, como método de estudo polilógico, no
qual um problema é dissecado e visto em todas as suas possibilidade lógicas. E
no final o próprio problema é questionado como sendo falso!
AMEN !
Uma família judaica, antes de ir a
Sinagoga celebrar a noite de Shabbat, deixou a mesa posta, com bom vinho kosher (alimento apropriado para os
judeus) e uma deliciosa ralá (pão
trançado), o jantar já estava pronto e as luzes da casa já tinham sido acesas e
assim toda a casa resplandecia de beleza e ordem.
Ao voltar da Sinagoga para seu jantar de Shabbat, a família é
seguida por um anjo bom e um anjo mal.
Enquanto que o anjo bom diz:
- Que o próximo Shabbat
seja igual e este!
Ao anjo mal só resta responder: - Amen!
Enquanto isso, outra família vai a
mesma Sinagoga sem deixar a casa arrumada para a noite de Shabbat. Tudo nesta
casa é escuridão, desordem e
promiscuidade.
O anjo mal diz então:
- Que o próximo Shabbat
seja igual e este!
Ao anjo bom só resta dizer:
- Amen!
Essa bela parábola talmúdica pode ser
estendida para nossas próprias vidas. Quando estamos em paz interior e nossos
pensamentos fluem harmoniosamente, o
anjo bom nos diz:
- Que permaneças assim para sempre!
E ao anjo mal só resta dizer: Amen!
SHMUEL E ITZAAC
Shmuel e Itzaac eram dois klapers (mascates) rivais que vendiam
roupas em domicílio, visitando um a um seus clientes. Como eram concorrentes,
era muito importante ser o primeiro a bater às portas das casas, pois a chance
de venda era maior. Estavam ambos numa pequena estação ferroviária entre as
cidades de Minsk e Pinsk, aguardando o primeiro trem chegar. Como para a
estratégia de venda era fundamental chegar antes, Shmuel perguntou a Itzaac:
- Para onde pretendes ir, Minsk ou Pinsk?
- Vou para Pinsk, responde-lhe Itzaac,
tranquilamente.
Ao ouvir a resposta de seu concorrente Shmuel põe-se a
pensar:
“Se ele me diz que vai a Pinsk, é porque quer me ludibriar fazendo-me
acreditar que vai a Minsk, então concluo que ele vai a Pinsk”!
Em seguida Shmuel dirige-se furiosamente a Itzaac:
- Queres me fazer
pensar que vais Minsk, mas tenho certeza que vais a Pinsk! Então porque me
mentes?!
Este hilariante exemplo talmúdico nos
ensina o quanto nossos pensamentos podem distorcer a realidade e converter uma
verdade dita numa mentira e vice-versa.
Roberto Leon Ponczek é professor da
Universidade Federal da Bahia e autor
dos livros “Da Babilonia ao Brasil: o improvável milagre da existência” Ed.
Garimpo 2018 e “Deus ou seja a Natureza: Spinoza e os novos paradigmas da
Física pela EDUFBA. Estuda a Cabalá judaica com o Rabino Israel Bukiet e é membro
colaborador do Chabad–Salvador. Seus pais Wanda Goldblum Ponczek e Tadeusz
(David) Ponczek foram sobreviventes poloneses da II Guerra Mundial que
emigraram para o Rio de Janeiro em 1946, depois de terem testemunhado e vivido
os horrores do Holocausto nazista.