No caso de 1945, dois judeus húngaros voltam a seu vilarejo, para a paranoia dos habitantes: eles estariam atrás de uma recompensa? Buscariam reclamar o direito às casas, tomadas por outras pessoas? Visariam disputar espaço no comércio? Os dois judeus silenciosos, “iguais a todos os outros, com chapéu e barba”, como descreve um personagem, são cobertos de um peso simbólico difícil para o povo local assimilar.
O drama dirigido por Ferenc Török constitui uma espécie de mea culpa húngaro em relação à perseguição nazista. Alguns personagens reagem com medo, outros partem para o ataque, mas o protagonista, sem surpresa, é um vilão caricatural: Szentes István (Péter Rudolf), funcionário da cidade. Este homem é apresentado pela primeira vez enquanto faz a barba com uma gilete e admira o sangue escorrer de uma ferida - típica descrição de personagens maus - para depois ser visto em cenas de manipulação, violência ou ainda malignamente fumando seu charuto com as sobrancelhas arqueadas, admirando o horizonte com uma luz contrastada delineando o seu rosto - mais um clichê da imagem de vilões.
István é o alvo desta retratação histórica: ele representa o antissemitismo, o machismo, a família tradicional e as estratégias mafiosas de manutenção de poder. Não por acaso, a chegada dos judeus coincide com o dia do casamento de seu filho com uma bela moça do local, algo programado para corrigir as atitudes permissivas do jovem.
Talvez Török tivesse medo de desculpar os vilões ao torná-los mais complexos, talvez tenha deixado os judeus como figuras quase anônimas para que pudessem representar toda a comunidade judaica europeia. Nesse terreno espinhoso de representações históricas, o diretor aposta no caminho mais fácil e didático. De quebra, evita dar protagonismo às verdadeiras vítimas para privilegiar a possível redenção dos agressores.