Estilo judaico de vestir

Estilo judaico de vestir

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Desde o momento em que, no Jardim de Ɖden, o primeiro homem sentiu a necessidade de cobrir seu corpo, o ato de se vestir constitui verdadeiro guia para a elaboraĆ§Ć£o de um retrato das diferentes sociedades, seus costumes, seus valores.


Analisando as vestimentas adotadas por um determinado povo ou grupo social, podemos diferenciar paĆ­ses de origem, Ć©pocas histĆ³ricas, classes sociais, estado civil, bem como seus hĆ”bitos e sua forma de agir e pensar.

 Para o Povo Judeu, as vestes sempre foram uma forma de manter sua identidade. No perĆ­odo bĆ­blico, os profetas advertiam os judeus quando estes se afastavam de seus costumes, adotando a forma de vestir de outros povos. Em Pessach, lĆŖ-se na HagadĆ” que uma das razƵes para os hebreus terem sido salvos do Egito foi por nĆ£o terem mudado seus trajes caracterĆ­sticos durante os anos que ficaram em terras egĆ­pcias.

Se analisarmos o tipo de vestimenta usada em diferentes paĆ­ses e em momentos histĆ³ricos, apĆ³s a Grande DispersĆ£o, no 1Āŗ sĆ©culo desta Era, quando os judeus sĆ£o expulsos de sua Terra e forƧados a viver como minoria no seio de uma sociedade maior, podemos discernir o nĆ­vel de discriminaĆ§Ć£o e perseguiĆ§Ć£o a que eram submetidos, assim como o grau de inserĆ§Ć£o ou assimilaĆ§Ć£o alcanƧado.

O judaĆ­smo e as vestimentas

A histĆ³ria das vestimentas se inicia no momento em que o primeiro homem passa a ter consciĆŖncia de sua nudez e sente a necessidade de cobrir seu corpo. Relata a TorĆ” que antes de desobedecer a D'us comendo do fruto proibido, AdĆ£o e Eva viviam nus, no Jardim do Ɖden, sendo-lhes desconhecido o sentimento de vergonha. Mas, assim que pecaram e o mal passou a fazer parte de sua natureza, sentiram-se envergonhados e quiseram cobrir o corpo com folhas. Antes de expulsĆ”-los do Jardim do Ɖden, D'us os veste com tĆŗnicas de pele de animais.

Pode-se deduzir a importĆ¢ncia conferida pelo judaĆ­smo Ć s vestimentas atravĆ©s da afirmaĆ§Ć£o da MishnĆ” de que um judeu deve vestir-se de acordo com suas posses, mas deve alimentar-se abaixo das mesmas. Ademais, ensina nossa tradiĆ§Ć£o que "A glĆ³ria de D'us Ć© o homem e a glĆ³ria do homem Ć© sua vestimenta" (Derech Eretz).

O judaĆ­smo ensina que qualquer judeu - homem ou mulher - deve guardar a limpeza corporal e se vestir com recato. O sĆ”bio, em especial, tem que trajar roupas limpas e respeitĆ”veis, pois se usar sapatos e roupas remendados estarĆ” trazendo vergonha Ć  sua erudiĆ§Ć£o (Tratado Shabat, 114a). Os lĆ­deres comunitĆ”rios tambĆ©m devem usar roupas adequadas Ć  sua posiĆ§Ć£o na comunidade. O Talmud afirma que uma noiva tem um ano para preparar seu enxoval (Tratado Ketubot, 57a), e o marido tem a obrigaĆ§Ć£o de dar Ć  mulher anualmente, para as trĆŖs Grandes Festas, um chapĆ©u novo, um cinto, trĆŖs pares de sapatos alĆ©m de outras peƧas de vestimentas (ibid, 64b).

Mas, alerta o Talmud, Ć© preciso cautela para nĆ£o julgar uma pessoa apenas por sua aparĆŖncia, pois nem sempre as roupas definem quem as usa. A prĆ³pria grafia hebraica da palavra roupa, begued, alerta para isso; pois, com as letras Bet, Guimel e Dalet forma-se, tambĆ©m, a raiz da palavra bagod, que significa "trair".

Na TorĆ” hĆ” algumas leis sobre o tipo de vestimentas que os judeus devem, ou nĆ£o, usar. Um dos princĆ­pios bĆ”sicos Ć© que os homens sĆ£o proibidos de usar roupas femininas, assim como as mulheres de se vestir como homem.

Entre as peƧas de vestuĆ”rio masculino estĆ” o tsitsit, que, em hebraico, significa franja. A TorĆ” exige que todo homem judeu use franjas - tsitsit - nos cantos de peƧas de vestuĆ”rio que tenham quatro pontas (NĆŗmeros, 15: 37-41). Este mandamento Ć© repetido todas as vezes que recitamos a oraĆ§Ć£o do "ShemĆ”". Os tsitsit sĆ£o usados todos os dias como lembrete ao judeu dos demais Mandamentos Divinos.

Este preceito Ć© observado atravĆ©s do uso do talit catan - o talit pequeno - tambĆ©m chamado de "tsitsit", usado diariamente debaixo da camisa, e do talit gadol, conhecido apenas como "talit". Este Ćŗltimo Ć© o xale ritual no qual os homens se envolvem ao recitar as oraƧƵes matinais e em outros ofĆ­cios religiosos e que acompanha o homem judeu ao longo de sua vida. Durante a cerimĆ“nia do casamento, recobre os noivos para a bĆŖnĆ§Ć£o nupcial e, muitas vezes, acompanha o homem tambĆ©m em sua morte, sendo usado como mortalha. Suas dimensƵes variam, assim como os tecidos e tonalidades em que sĆ£o confeccionados e os bordados com que sĆ£o ornados.

Outra determinaĆ§Ć£o bĆ­blica sobre as vestimentas Ć© a proibiĆ§Ć£o do uso de roupa que contenha mistura de lĆ£ e linho - shaatnez, em hebraico. SĆ³ o Cohen Gadol, o Sumo Sacerdote, quando oficiava no Templo Sagrado de JerusalĆ©m, podia trajar-se com essa mistura de tecidos. Este mandamento da TorĆ” Ć© um dos decretos supra-racionais, chukim em hebraico, incompreensĆ­veis para a mente humana. O Talmud, no entanto, oferece vĆ”rias interpretaƧƵes; uma delas Ć© relacionada Ć  histĆ³ria de Caim e Abel e Ć s respectivas oferendas que levaram a D'us. O primeiro era agricultor e levou plantas que dĆ£o o linho, enquanto Abel, que era pastor, levou ovelhas, de cujo pĆŖlo se obtĆ©m a lĆ£. Segundo a CabalĆ”, assim como estes dois filhos de AdĆ£o representavam forƧas espirituais opostas, que devem ser mantidas separadas, suas oferendas tambĆ©m nĆ£o se devem mesclar.

Outra obrigaĆ§Ć£o do homem judeu Ć© cobrir a cabeƧa, principalmente durante as oraƧƵes, bĆŖnĆ§Ć£os, dentro da sinagoga ou de outro recinto sagrado. Esta obrigaĆ§Ć£o nĆ£o provĆ©m de nenhuma injunĆ§Ć£o bĆ­blica, Ć© um sinal de reverĆŖncia a D'us (Trat. Shabat, 156b), uma forma de reconhecer que hĆ” AlguĆ©m acima de nĆ³s.

O costume pode ter-se iniciado na Ć©poca do Templo Sagrado de JerusalĆ©m, pois os Cohanim usavam um turbante enquanto oficiavam os serviƧos religiosos. Mas, sabe-se que na Ć©poca talmĆŗdica, todos os sĆ”bios cobriam a cabeƧa. InĆŗmeras fontes revelam que havia aqueles que nĆ£o davam mais de quatro passos com a cabeƧa descoberta, "pois a PresenƧa Divina paira sempre sobre a cabeƧa" (Tratados Shabat, 118b e Kidushin, 31a). O costume pode ter-se iniciado na Ć©poca do Templo Sagrado de JerusalĆ©m, pois os Cohanim usavam um turbante enquanto oficiavam os serviƧos religiosos. Mas, sabe-se que na Ć©poca talmĆŗdica, todos os sĆ”bios cobriam a cabeƧa. InĆŗmeras fontes revelam que havia aqueles que nĆ£o davam mais de quatro passos com a cabeƧa descoberta, "pois a PresenƧa Divina paira sempre sobre a cabeƧa" (Tratados Shabat, 118b e Kidushin, 31a).

Nas geraƧƵes seguintes, o costume foi adotado por todos os judeus, principalmente durante as oraƧƵes. Como no judaƭsmo, quando um costume se torna prƔtica universalmente aceita, este adquire caracterƭstica de lei, assim, o que era um sinal de fervor e respeito se transformou em um mandamento. Apesar de se poder usar qualquer tipo de chapƩu para cobrir a cabeƧa, Ʃ costume usar a kipƔ, nome hebraico do pequeno solidƩu tradicional, em iƭdiche yarmulke ou kƩpele. Atualmente, pode-se reconhecer a que grupo religioso um judeu pertence pelo tipo de chapƩu ou kipƔ usado.

As mulheres, desde a Ć©poca bĆ­blica, cobrem a cabeƧa em pĆŗblico apĆ³s o casamento, jĆ” que nĆ£o Ć© permitido a uma mulher casada mostrar seus cabelos, a nĆ£o ser para o marido. O tipo de vĆ©u ou chapĆ©u variou de acordo com a Ć©poca e a sociedade. Hoje, por exemplo, hĆ” mulheres que cobrem o cabelo com chapĆ©us e outras, com belas perucas.

No antigo Israel

Pode-se encontrar na TorĆ” e nos livros dos Profetas a descriĆ§Ć£o dos trajes judaicos da Ć©poca bĆ­blica. Os judeus usavam tĆŗnicas com mangas, chamadas de ketonet, que chegavam aos joelhos e eram amarradas na cintura com um cinto (sadin). Sobre o ketonet, os mais proeminentes usavam uma simlĆ”, espĆ©cie de manto, ao passo que o resto do povo usava a abayĆ”, que servia para aquecĆŖ-los Ć  noite. Os profetas usavam sobre as vestes um tipo de toga, sem mangas, como sĆ­mbolo de seu poder profĆ©tico. Reis e lĆ­deres por sua vez usavam uma espĆ©cie de tĆŗnica, o me'il. Confeccionado em tecidos leves, e chegando Ć  altura dos joelhos, assemelhava-se ao manto usado pelo Sumo Sacerdote.

Na Ć©poca, como grande parte das roupas tinha quatro cantos, o tsitsit nĆ£o constituĆ­a uma peƧa de vestuĆ”rio separada, para cumprir o mandamento bastava aplicar as franjas nas roupas usuais.Os trajes eram feitos em lĆ£ ou linho, sendo o algodĆ£o introduzido posteriormente. Uma das primeiras menƧƵes a esse tecido apenas surge na Meguilat Esther. Os tecidos geralmente conservavam os tons naturais da fibra; somente as roupas dos dignitĆ”rios e dos mais abastados eram tingidas de pĆŗrpura, vermelho ou violeta.

As vestes mais elaboradas eram sempre as cerimoniais, principalmente as utilizadas durante o serviƧo no Templo. Os trajes e turbantes dos Cohanim para oficiar no Templo de JerusalĆ©m eram especiais, principalmente os do Cohen Gadol. Enquanto oficiava, o Sumo Sacerdote usava, alĆ©m do me'il, o efod, que era uma veste tipo avental usada sobre as demais e, sobre este, um peitoral ornado com 12 pedras preciosas onde estavam gravados os nomes das 12 tribos. Durante os serviƧos de Yom Kipur, lĆŖ-se a descriĆ§Ć£o detalhada das quatro diferentes vestimentas que o Sumo Sacerdote usava no Dia do PerdĆ£o. Cada peƧa de seu vestuĆ”rio revestia-se de profunda simbologia espiritual.

As mulheres na antiga Israel usavam algo similar ao ketonet e Ơ simlƔ. Eram, porƩm, peƧas bem mais longas e mais largas, sempre com mangas. As roupas das mais abastadas eram ricas e perfumadas. Em certas ocasiƵes, como no dia do casamento, as mulheres usavam vƩus. Para proteger os pƩs quando saƭam de casa, usavam sandƔlias de couro, na'alayim. Na Ʃpoca, caminhar sem sandƔlias era sinal de pobreza extrema.

Inƭcio da Grande DiƔspora

A partir do ano 70 E.C, quando os judeus, expulsos por Roma da Terra de Israel, comeƧam a se espalhar pelo mundo, suas vestimentas prontamente mudam, passando a refletir a vida no exĆ­lio. Obrigados a viver como minoria no seio de uma sociedade maior, raramente acolhedora, eles desenvolveram formas diferentes de se trajar, dependendo dos costumes circundantes - fossem estes islĆ¢micos ou cristĆ£os - e das restriƧƵes que freqĆ¼entemente lhes impunham.

Foi a partir do sĆ©culo 9, nos paĆ­ses sob domĆ­nio do IslĆ£, e do sĆ©culo 13, nos paĆ­ses cristĆ£os, que os judeus foram obrigados ao uso de roupas e distintivos especiais. O objetivo era tornĆ”-los facilmente reconhecĆ­veis e, ademais, servir de "lembrete constante" de sua posiĆ§Ć£o de "inferioridade".

VĆ”rias fontes, judaicas ou nĆ£o, nos dĆ£o uma idĆ©ia sobre o trajar judaico durante a Idade MĆ©dia e Moderna. SĆ£o fontes literĆ”rias, documentos jurĆ­dicos, decretos de autoridades civis e religiosas, regulamentos internos das comunidades, bem como relatos de viajantes. HĆ”, tambĆ©m, fontes visuais, principalmente as iluminuras encontradas em hagadot e sidurim, que sĆ£o um retrato fiel da vida judaica na Ć©poca medieval. NĆ£o podemos descartar os trabalhos de artistas cristĆ£os, pois apesar da forma extremamente negativa de nos retratar, eles reproduzem as vestimentas de nossos irmĆ£os na Europa cristĆ£. Bastante Ćŗteis, tambĆ©m, sĆ£o os relatos e ilustraƧƵes de viajantes e artistas que, a partir do sĆ©culo 15, registraram os trajes usados por judeus da Europa, Norte da Ɓfrica e ImpĆ©rio Otomano.

Sob o domĆ­nio do IslĆ£

No sĆ©culo 7, com a expansĆ£o do IslĆ£, a maior parte da populaĆ§Ć£o judaica mundial passou a viver sob seu controle polĆ­tico e influĆŖncia cultural. O Estado islĆ¢mico lhes concedera estatuto de dhimmis. Isto permitia a judeus e cristĆ£os viverem em terras muƧulmanas mediante o pagamento de impostos especiais. Na realidade, os dhimmis eram cidadĆ£os de segunda classe, sobre quem podiam ser aplicadas inĆŗmeras leis destinadas a rebaixĆ”-los, social e economicamente. As restriƧƵes e imposiƧƵes variavam muito, pois sua aplicaĆ§Ć£o dependia da vontade de cada governante muƧulmano. Estes podiam revogĆ”-las ou aplicĆ”-las, com maior ou menor severidade, dependendo de seus interesses e grau de fanatismo e, atĆ© mesmo, de seu humor. Entre outras exigĆŖncias, a lei islĆ¢mica determinava o uso de trajes diferenciados para os nĆ£o-muƧulmanos. Uma das primeiras medidas foi obrigar os judeus a usar uma tira de pano amarelo em suas roupas. Com o passar do tempo, as restriƧƵes foram aumentando.

As cores que judeus e outras minorias nĆ£o-muƧulmanas podiam usar em seus trajes eram tambĆ©m determinadas pelos governantes muƧulmanos. Era proibido usar roupas verdes, a cor do IslĆ£, reservada aos nobres e dignitĆ”rios. Em geral, os judeus eram obrigados a usar cores mais escuras. Por exemplo, na Turquia, MesopotĆ¢mia e na entĆ£o Palestina podiam usar violeta, vinho e marrom; no Marrocos, preto; e, na TunĆ­sia, alĆ©m do preto, o azul. No sĆ©culo 14, os mamelucos obrigaram os cristĆ£os a se vestir de azul e os judeus de amarelo, cor associada Ć  "vergonha" desde a AntigĆ¼idade.

Era permitido o uso de turbantes aos judeus e cristĆ£os, sempre obedecendo o cĆ³digo de cores e tamanhos prescrito pelas autoridades. PeƧa de indumentĆ”ria tĆ­pica do Oriente, os turbantes revelavam a posiĆ§Ć£o social e a condiĆ§Ć£o econĆ“mica de quem os usava. Os dos judeus eram geralmente amarelos. Mas, o adorno de cabeƧa mais comum era o qalansuwa, parecido com um fez, cuja cor tambĆ©m era determinada. No sĆ©culo 17, na PĆ©rsia, os judeus foram obrigados a usar um chapĆ©u de feltro semelhante ao usado pelos escravos.

Na Espanha islĆ¢mica, foram raras as restriƧƵes adotadas contra os judeus, inclusive em relaĆ§Ć£o ao vestuĆ”rio. As classes espanholas mais privilegiadas, fossem muƧulmanas, judias ou cristĆ£s, vestiam-se com igual elegĆ¢ncia e riqueza, com roupas de seda e outros tecidos finos. Usavam mantos de cores diversas, como verde, laranja ou rosa. E os turbantes foram sendo gradativamente substituĆ­dos por uma espĆ©cie de gorro de lĆ£, em verde ou vermelho. Os judeus geralmente os usavam em amarelo.

ImpƩrio Otomano

Do surgimento do ImpĆ©rio Otomano, no inĆ­cio do sĆ©culo 14, atĆ© sua queda, no final do sĆ©culo 19, era enorme a variedade de estilos utilizados pelos judeus que viviam em suas terras. Havia, porĆ©m, algumas determinantes. Os SultƵes exigiam que houvesse uma clara diferenciaĆ§Ć£o nas roupas dos muƧulmanos e nĆ£o-muƧulmanos. AlĆ©m de nĆ£o poder usar verde e serem obrigados a usar cores escuras, os tecidos e enfeites usados por todos que nĆ£o haviam aceito o IslĆ£ tinham que ter qualidade inferior e menos luxuosa do que os dos muƧulmanos. Os trajes deviam mostrar claramente sua qualidade inferior. O feitio e tamanho dos turbantes tambĆ©m obedeciam regras especĆ­ficas.

Na Turquia, o traje dos judeus se distinguia pelo turbante negro e pelo antari, uma espĆ©cie de tĆŗnica aberta na frente, com mangas compridas e largas, com um cinturĆ£o que dava duas voltas na cintura. Por cima do antari, ainda usavam um redingote comprido, o jubĆ”, forrado de pele de coelho. Feita em seda, esta peƧa costumava ser bordada, para as cerimĆ“nias festivas. Sob a tĆŗnica, usavam calƧas bufantes, ou chalouar. O fez, ou tarbush, um pequeno chapĆ©u de feltro cĆ“nico, tornou-se muito popular em todo o ImpĆ©rio Otomano, principalmente apĆ³s ser incorporado ao traje oficial do governo.

Os trajes para casamento, tanto masculinos quanto femininos, eram coloridos e bordados com fios de ouro e levavam sobreposta uma espĆ©cie de tĆŗnica redingote. Em SalĆ“nica (GrĆ©cia), o traje tĆ­pico das noivas conseguiu resistir Ć s influĆŖncias ocidentais atĆ© o sĆ©culo 20.

As comunidades judaicas do Marrocos sĆ£o as que possuem os figurinos mais variados. Os trajes festivos se caracterizam pelo uso de veludos, brocados e sedas. Percebe-se forte influĆŖncia espanhola, principalmente no vestido usado sob a chupĆ” por grande parte das noivas marroquinas. Chamado de El Gran Vestido, ou pelo seu nome Ć”rabe, El-keswa El-kebira, o vestido das noivas era rico e elaborado.

Consistia, em, geral da zeltita, uma farta saia-envelope comprida, em veludo de seda vermelho-escarlate ou amarronzado, ricamente bordada com fios de ouro, por vezes com pedras semi-preciosas incrustadas. Na parte superior, um corpete em veludo da mesma cor da saia, o gombazh, tambĆ©m bordado. Por baixo desse colete, surgiam as kemam et-tesmira, longas mangas bufantes, em diĆ”fana seda tramada com fios de ouro. Completava o traje um cinturĆ£o largo, que podia ser ricamente trabalhado em fios e pĆ©rolas. O arranjo da cabeƧa variava. Podia ser uma espĆ©cie de turbante formado por lenƧos coloridos, uma coroa em prata incrustada de pedras preciosas ou tiaras bordadas. E levava um festul, uma longa Ć©charpe de seda branca ou verde, recoberta por um pequeno vĆ©u branco transparente, o elbelo, que recobria o rosto da noiva ao ser entregue ao noivo. (Ver MorashĆ” nĀŗ 55).

No dia-a-dia, o judeu marroquino usava um caftĆ£ preto (djelabia) e na cabeƧa um tarbush sempre em cor escura. Por baixo dessas roupas, usavam trajes coloridos. As calƧas eram largas e bufantes, atĆ© os joelhos, e, por cima, um colete liso. O zocha, redingote preto, era usado pelas classes mais abastadas, em lugar do caftĆ£. As mulheres usavam roupas brancas e vermelhas, mĆŗltiplas saias, xales bordados para cobrir a cabeƧa, alĆ©m de jĆ³ias vistosas, como colares e braceletes largos.

Na SĆ­ria, atĆ© o inĆ­cio do sĆ©culo 20, os homens - fossem judeus, muƧulmanos ou cristĆ£os, usavam um imbazz ou yallak, uma espĆ©cie de caftĆ£ de algodĆ£o que chegava aos tornozelo. Em ocasiƵes festivas era em jacquard, Ć s vezes com discretos fios de ouro ou prata. Nos meses mais frios, por cima do imbazz usavam um jibbeh, um tipo de capa de material mais pesado. Os mais proeminentes - como rabinos ou outros lĆ­deres religiosos, sempre usavam o jibbeh. Os trabalhadores usavam shirwal, uma calƧa bufante que chegava atĆ© o tornozelo, com uma camisa por cima. Na cabeƧa, os homens das classes menos abastadas usavam um turbante simples, o laffe. Rabinos e outras autoridades religiosas tambĆ©m usavam turbantes, mas bem mais elaborados. Muitos homens usavam na cabeƧa o tarbush cĆ“nico, em feltro vermelho ou vinho, estruturado para manter o formato. O fez usado em Alepo era bem mais alto, do tipo usado no Egito, Marrocos ou TunĆ­sia.

Na Sƭria, os trajes tƭpicos foram abandonados pelos judeus, principalmente pelas classes mais abastadas, assim que os costumes ocidentais passam a influenciar o paƭs, no final do sƩculo 19. Os homens usavam ternos, mas a maioria manteve o uso do tarbush e, as mulheres, roupas e chapƩus no estilo usado na Europa. As mais abastadas usavam roupas sofisticadas "Ơ la mode de Paris".

Em algumas repĆŗblicas muƧulmanas remanescentes da antiga UniĆ£o SoviĆ©tica, os judeus mantiveram traƧos das vestes tradicionais - pelo menos atĆ© emigrarem para Israel, na dĆ©cada de 1990. Oriundas do campo, estas populaƧƵes aperfeiƧoaram a arte do bordado da lĆ£ sobre seda, produzindo casacos, ternos masculinos, ou maaraz, sofisticados vestidos e longos xales usados ao redor da cintura ou como turbante. Um exemplo sĆ£o os judeus de Bucara, com seus pesados casacos e caftĆ£s de veludo bordado em ouro e pedrarias.

No AfeganistĆ£o e na PĆ©rsia, os judeus se vestiam segundo os costumes locais. Antigamente, o traje comum compunha-se de calƧas justas e camisas bordadas com temas florais, cobertas por um chador, como ainda fazem as mulheres muƧulmanas. Cobriam tambĆ©m a cabeƧa com xales de algodĆ£o ou em lamĆŖ, quando estavam em casa. Os homens usavam um turbante ou chapĆ©u cĆ“nico.

Na Lƭbia, era o vƩu o elemento que diferenciava as mulheres judias das muƧulmanas. As primeiras deixavam os dois olhos Ơ mostra e, as segundas, apenas um. JƔ as judias argelinas mantiveram o uso de alguns trajes tradicionais em determinadas ocasiƵes, entre os quais lindos vestidos de musselina, coletes bordados com fios de ouro e lenƧos de cabeƧa ricamente trabalhados.

Na Europa cristĆ£

Durante o feudalismo e a Idade Moderna, as roupas assumiram um papel polĆ­tico-social: indicavam a classe social de quem as usava. Do sĆ©culos 16 ao 18, os tecidos bordados e luxuosos ainda eram privilĆ©gio exclusivo da aristocracia. A partir do sĆ©culo 13, as autoridades eclesiĆ”sticas e os governantes comeƧam a exigir dos judeus um vestuĆ”rio especĆ­fico. As exigĆŖncias variavam de acordo com o contexto social, as tendĆŖncias polĆ­ticas, o grau de anti-semitismo e, sobretudo, os interesses financeiros dos governantes.

No ano de 1215, o Quarto ConcĆ­lio de LatrĆ£o determinou o uso de um emblema para que os judeus fossem facilmente reconhecidos, "evitando assim o contato sexual entre cristĆ£os e judeus". O infame "Distintivo amarelo da vergonha" consistia em um pedaƧo de pano de diferentes formatos, costurado no casaco. Com algumas variantes, seu uso tornou-se obrigatĆ³rio na FranƧa, Inglaterra, PolĆ“nia, Hungria, Alemanha, espalhando-se tambĆ©m por outros paĆ­ses. Em 1267, o ConcĆ­lio de Viena determinou que os judeus usassem roupas escuras ou pretas. Em muitos paĆ­ses, foram obrigados a usar o Judenhut, o "chapĆ©u do judeu". De formato cĆ“nico, bem pontudo e amarelo, tinha o objetivo de ridicularizar os usuĆ”rios, tornando-os objeto de escĆ”rnio popular. As mulheres eram obrigadas a usar chapĆ©us com duas pontas, o CornĆ©lia. Em sinal de excepcional deferĆŖncia, alguns judeus proeminentes eram isentados do uso do infame acessĆ³rio.

Outro fator determinante do traje dos judeus na Europa foi a regulamentaĆ§Ć£o interna de cada comunidade. Como tentativa de nĆ£o despertar a inveja e o Ć³dio nos cristĆ£os, vĆ”rias comunidades judaicas proĆ­bem seus membros de se vestir de forma requintada ou ostensiva. Era proibido o uso de jĆ³ias e tecidos mais nobres, como seda e brocado.

Os judeus ibĆ©ricos, mais uma vez, foram um caso Ć  parte, pois mesmo apĆ³s a Reconquista - quando a regiĆ£o voltou para mĆ£os cristĆ£s - e atĆ© serem expulsos da Espanha, em 1492, e de Portugal, em 1497, nĆ£o sofreram nenhum tipo de imposiĆ§Ć£o Ć s suas vestimentas. Os mais abastados usavam roupas semelhantes Ć s da realeza e das elites, incluindo pelerines e chapĆ©us achatados para os homens. As mulheres, por sua vez, vestiam saias de seda e brocados com laƧos e cobriam a cabeƧa com vĆ©us curtos.

Idade ContemporĆ¢nea

Foi somente durante a RevoluĆ§Ć£o Francesa, em 1789, que se aboliu o uso do distintivo, considerado pelos revolucionĆ”rios "a vergonha" nĆ£o dos judeus, mas da Europa. O exemplo da FranƧa espalhou-se rapidamente por todo o continente, Ć  exceĆ§Ć£o da Inglaterra, onde o distintivo jĆ” deixara de existir um sĆ©culo antes, quando os judeus foram oficialmente readmitidos no paĆ­s.

Com o inĆ­cio do processo de emancipaĆ§Ć£o, foram desaparecendo as medidas que impunham vestimentas diferenciadas aos judeus, nos paĆ­ses da Europa Ocidental. Mas, para grande vergonha do Ocidente, o uso do distintivo judaico foi ressuscitado em setembro de 1941, pelos nazistas, sob a forma de uma braƧadeira com a Estrela de David amarela, ostentando a palavra Jude no centro. Todos os judeus da Alemanha e do resto da Europa sob domĆ­nio nazista foram obrigados a usĆ”-la enquanto durou o Terceiro Reich.

Atualmente, a maior parte dos judeus, mundo afora, veste-se ao estilo ocidental. Somente certos grupos chassƭdicos preservam os trajes usados no shtetl - pequenos vilarejos da Europa Oriental. Suas vestimentas de Shabat consistem, atƩ hoje, de um chapƩu de pele, o shtreimel, pesados casacos pretos fechados na lateral, chamados bekeshe, e meias brancas grossas e altas.

Leia aqui: Vestimentas e coisas judaicas

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