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padre David Neuhaus |
Páscoa em Jerusalém com um padre jesuíta, judeu por nascimento.
"Eu me vejo como um judeu israelense", Neuhaus disse ao serviço de imprensa Tazpit (TPS). Ele explicou que pela religião ele é cristão, mas por todos os outros parâmetros culturais ele se identifica com a comunidade judaica de Israel. Ou, como Neuhaus sucintamente diz, "eu sou um deles".
Em nenhum lugar essa mistura inusitada foi mais evidente do que em Jerusalém neste fim de semana passado, como o feriado judaico de Purim – uma festa barulhenta de máscaras e bebidas – coincidindo com a Sexta-Feira Santa, a comemoração católica da crucificação de Jesus. "Tivemos nossa Quinta-Feira Santa e Sexta-feira Santa, quando os nossos filhos se fantasiaram [para Purim] durante o dia e vindo para as orações à noite", disse Neuhaus à TPS. "De fato cria um pouquinho de esquizofrenia, porque estamos passando de um carnaval para os dias mais solenes do calendário cristão". "Nós fazemos um monte disso", ele acrescentou, "nos movendo entre as culturas".
Neuhaus nasceu em uma família de refugiados judeus alemães em Johannesburgo, África do Sul, onde frequentou escolas judaicas. Ele contou que sua família estava "vagamente tradicional" em uma comunidade judaica ortodoxa moderna, mas "não muito praticante". Aos 15 anos sua escola o enviou para Israel por três meses para aprender hebraico. Foi uma viagem que iria alterar drasticamente o curso de sua vida de uma forma totalmente imprevisível.
Como uma criança precoce (Neuhaus prefere "neurótica"), ele tinha um interesse peculiar na história da Rússia czarista e seguiu suas investigações até um aristocrata russo exilado vivendo em um mosteiro no Monte das Oliveiras, em Jerusalém, onde ele conheceu uma freira de 89 anos de idade, que era totalmente paralisada e ainda assim falou com ele durante três horas seguidas. "Eu só conheci a pessoa mais feliz que eu já encontrei em toda a minha vida", Neuhaus lembra de ter pensado. A mulher em êxtase lhe disse que ela estava apaixonada. "Esse foi o primeiro encontro com uma pessoa de Jesus", Neuhaus explicou.
"Eu voltei e disse aos meus pais que queria ser um cristão", disse Neuhaus à TPS, "e meus pais responderam com um enfático: ‘Como você pode se juntar a eles depois do que fizeram para nós?’"
Ainda adolescente, Neuhaus prometeu a seus pais que ele iria esperar dez anos antes de se converter. "Eu tentaria encontrar algum tipo de resposta nesses dez anos sobre como poderiam os discípulos de Jesus fazer o que fizeram quando se tratava dos judeus", disse ele. "Eu mantive a promessa."
Neuhaus foi finalmente batizado em Jerusalém, em 1988, e foi ordenado padre jesuíta em 2000. Ele agora é um representante do arcebispo, conhecido em Israel como o Patriarca – clérigo católico de mais alta patente no país – supervisionando sete igrejas de língua hebraica e russa em todo o país. Seu rebanho é composto principalmente por membros de família cristã, bem como de migrantes africanos e requerentes de asilo, com "muito poucos convertidos" da comunidade judaica, disse ele.
Ele também fala árabe e está "muito envolvido na igreja de língua árabe". "Estamos unidos pela nossa fé", disse. Neuhaus observou os feriados desta semana com serviços na igreja do Santo Sepulcro e do Jardim Getsêmani, em Jerusalém, que são áreas sagradas associadas com a prisão e crucificação de Jesus.
No entanto, as horas de oração trazem à memória de Neuhaus os dias mais santos para os judeus. Na verdade, ele se lembra de uma Sexta-feira Santa que passou rezando com os coptas do Egito, que insistem em jejuar e cuja liturgia é tão longa que "parece muito com o Yom Kipur". Notavelmente, Neuhaus ainda participa regularmente dos serviços de Rosh Hashaná e Yom Kipur. "Eu vou a uma sinagoga onde as pessoas sabem quem eu sou, então eu não estou de brincadeira", Neuhaus explicou. Apesar da ressalva, ele frequenta os serviços desses dias sagrados porque "é quem eu sou, histórica e sociologicamente", Neuhaus disse que ele acrescentou que "somos chamados, como católicos, para estar em uma relação profunda com o povo judeu".
Fonte: TPS / Texto: Jesse Lempel / Tradução: Alessandra Franco / Foto: Hillel Maeir