Por
Roberto Leon Ponczek*
Sou filho de
sobreviventes do Holocausto e acabo de escrever uma biografia de minha família
polonesa no Livro "Polski Klub 44: o improvável milagre da existência
", editado on line pela Amazon1,
no qual descrevo os vários episódios da miraculosa sobrevivência de meus pais
durante os terríveis anos de 1939 a 1945 . Eles chegaram ao Brasil num navio
que zarpou do porto de Antuérpia, escondidos por trás de documentos que
ocultavam seus verdadeiros nomes judaicos. Durante alguns anos ainda praticaram
o cripto judaísmo, mantendo uma dupla personalidade: em casa assumiam-se como
judeus, mas publicamente se faziam passar por cristãos poloneses, frequentando
por algum tempo o Polski Klub 44, reduto da cultura polaca no Rio de Janeiro
dos anos 50. Durante alguns anos ainda
viveram nestas condições com medo de um hipotético ressurgimento do nazismo. Em
1967, com a vitória de Israel sobre seus vizinhos, na Guerra dos Seis Dias,
assumiram finalmente suas identidades judaicas, encorajados pela consolidação
da nova nação judaica.
É fato que
Israel é um pais construído com sangue, suor e lagrimas, sobre as cinzas ainda
fumegantes do Holocausto, por sobreviventes como meus pais, e foi a partir da
existência segura e irreversível de Israel que
meus pais fizerem uma completa e assumida teshuvá, depois de anos de cripto-judaísmo. Portanto, ninguém põe
em discussão a absoluta necessidade da
existência de Eretz e Mediná, Israel preservada por fronteiras
perenes e seguras.
Entretanto,
enfatizo, na condição de Holocaust Child,
que nós judeus devemos dar o exemplo à humanidade de um povo evoluído, culto,
iluminista que passou, durante milênios, por vários processos civilizatórios,
protagonizando, na Idade Média, o renascimento da filosofia grega na Península
Ibérica, com Maimonides (Rambam) e Nachmanides (Ramban) que conciliaram a interpretação
da Torah com a filosofia aristotélica. No sec. XVII, o nosso povo contribuiu para
o surgimento da filosofia moderna; com Spinoza; no sec. XVII, com o Iluminismo (Haskalá) alemão através de Moses
Mendelssohn; e no sec. XX, com as grandes revoluções científicas, como a
Psicanálise de Freud e a Teoria da Relatividade de Einstein. Protagonizamos
também grandes inovações nas artes como na grande literatura francesa de Marcel
Proust e no romance surrealista de Franz Kafka, como ainda na música mega-sinfônica
de Gustav Mahler e no atonalismo de Arnold Schomberg, além da pintura surrealista e cabalista de Marc
Chagall. Todos eles são filhos exilados de Israel.
Além disso,
nossa historia foi forjada a ferro e fogo pelo sofrimento de um sem número de
perseguições. Padecemos nas fogueiras da Inquisição da Península Ibérica, nos
saques e estupros dos Pogroms do Leste Europeu e nas câmeras de gás Ziclon do
Holocausto, que por pouco, ou por algum inexplicável milagre, não extinguiram completamente
o nosso povo.
Todos esses
fatos devem nos levar a um cuidadoso discernimento e à suprema razão de não
responder na mesma moeda da violência e barbárie do terrorismo jihadista, que
estamos presenciando agora na França e Israel. Devemos, sim, combater
terroristas, com vigor, mas pontualmente sem preconceitos e sem jamais generalizar o conflito para inocentes civis,
sejam de que credo forem.
Segundo Itzchak
Rabin zl falou, e citado por meu amigo Barak, jovem ex-oficial do Tzahal: “Temos que perseguir a paz, como se não
houvesse terrororismo, e temos que nos proteger do terrorismo, como se não
houvesse paz”.
Portanto, a
historia nos concede e nos autoriza, que, juntamente com outros povos
civilizados, conduzamos com responsabilidade o grande processo de pacificação e
iluminação do mundo das trevas em que vivemos atualmente. Cada um de nós deve
incorporar dentro de si um pequeno Messias transformador do mundo, e juntos
seremos o Grande Messias revelado pelos profetas de Israel! Companheiros (Chaverim em hebraico), conclamo-os à
Serenidade da Razão, Justica e à Paz, três atributos que sempre caracterizaram
o nosso Povo!
*Roberto Leon Ponczek é Professor Doutor no curso de
Doutorado em Difusão do Conhecimento da UFBA, onde leciona Filosofia da Ciência
e membro do Chabad- Salvador, seus pais
Wanda e Tadeusz Ponczek foram sobreviventes do Holocausto.