Em 1942, depois do seu casamento em Cracóvia, meus pais Wanda
e Tadeusz Ponczek decidiram passar a Lua de Mel, numa estação de esqui
em Lanckorona, uma pequena aldeia, escondida nas montanhas, entre
Varsóvia e Cracóvia.
Quando a maioria dos judeus vivia cercada nos Guetos
poloneses, meus pais, graças aos falsos documentos cristãos - que
conseguiram junto ao movimento clandesࢢno de resistência do Gueto de
Varsóvia - ainda podiam viajar pela Polónia. Pelo menos, era o que
pensavam ate o momento em voltavam ao pequeno albergue onde
estavam hospedados. Quando entraram no alojamento, receberam ordem
de prisão da Polícia polonesa.
Alto lá! - Gritou o chefe do destacamento policial
-
Parszywy Żydzi! (Judeus sarnentos!) Vocês estão presos!
- Nós não somos judeus, eu posso mostrar-lhe os nossos documentos -
disse minha mãe.
- É claro que você não é realmente polonesa. Você tem cabelos pretos,
pele morena e olhos castanhos! Como você pode ser uma verdadeira
mulher polonesa ?! Claro, que você é uma judia! - Gritou o policial
enfurecido com a minha mãe.
- Quanto ao seu marido vai ser muito fácil de identificar! Imediatamente
para a prisão!
Quando chegaram na delegacia ele gritou para meu pai:
- Abaixe suas calças e mostre o pênis!
- Aha! Está vendo que eu estava certo! Ele é circuncidado, um judeu, é
claro! Vá para o inferno!
Meu pai tentou tergiversar que quando criança fizera uma operação de
fimose, mas o policial polonês enlouquecido de raiva urrava:
- Cale-se! - Parszywy Żyd!! (Judeu sarnento!)-Vocês serão presos aqui até
que a Gestapo decida o que fazer com vocês.
Ele atirou os meus pais em uma cela imunda, onde passaram a noite
já sem nenhuma esperança de salvação. Eles sabiam que era o fim da linha
para eles. Nesses casos de “judaísmo flagrante” assim que a Gestapo
chegava, aࢢrava a sangue frio ou enviava os “culpados” para Auschwitz.
Até então meu pai que nunca tinha rezado antes começou a repetir
incessantemente e com toda a força do seu coração, algo há muito tempo
esquecido: "Shema Israel Adonai Eloheinu, Adonai Ehad”
Na manhã seguinte, eles foram acordados com uma balbúrdia de
gritos e risadas. Era um destacamento da Gestapo, que ࢢnha acabado de
chegar a mando da polícia polaca. Eles estavam mais bêbados que
gambás... Uivavam e riam como idiotas. Meus pais se entreolharam e
pensaram: "agora será o nosso fim".
No entanto um dos oficiais da Gestapo não conseguia desgrudar os olhos
da minha mãe. E, em seguida, perguntou-lhe:
- É verdade que você é judia?
Ela, então, prontamente respondeu em alemão fluente:
Ich bin nicht natürlich jüdisch. Ich bin polnischen Katholischen! ("É claro
que eu não sou judia! Eu sou católica polonesa").
- - E como você fala alemão tão bem? - perguntou o oficial.
- -Porque Eu estudava Medicina em Viena.
- Em Viena? Eu sou de Viena! - Disse-lhe o oficial encantado.
Naquele momento, uma centelha de esperança brilhou na mente de
minha mãe que começou a cantar Valsas vienenses, terminando seu recital
privado com a famosa canção alemã "Lili Marlen". Ela cantou
elegantemente como Marlene Dietrich, recitando cada palavra
pausadamente, com sua voz grave de contralto:
Vor der Kaserne
Vor dem großen Tor
Fique eine Laterne
Und davor noch sie steht
Então woll'n wir uns da wieder seh'n
Bei der Laterne wollen wir steh'n:
Wie Einst Lili Marleen.
Wie Einst Lili Marleen.
Neste ponto, o oficial da Gestapo quase hipnotizado, chamou o policial
polonês:
- Kommen hier polish Schweine "("Venha cá seu porco polonês!) Por que
você diz que eles são judeus!? É claro que eles não são judeus!
- Deixe-os livres!
Caso contrário, vou te prender!
Uma vez que meus pais foram liberados, não voltaram mais para o
hotel para pegar seus pertences. Eles foram diretamente para a estação e
pegaram o primeiro trem de volta para Cracóvia. "Vamos correndo! É
melhor cairmos fora antes que a bebedeira do cara da Gestapo tenha
terminado!"
Esta foi a lua de mel romântica que meus pais desfrutaram em
Lanckorona! A grande ironia desta história real é que eles foram
condenados à morte por um subalterno policial polonês e,
paradoxalmente, foram salvos por um oficial da Gestapo bêbado!
Muito interessante a história de sobrevivência do casal ré-cem casado. Coisas deste tipo acontecem, não é coincidência, como costumo dizer, é Providência!
ResponderExcluirHistórias como essas nos fazem pensar e refletir quem somos e o que nossos antepassados passaram para que nós estivessemos aqui. Parabéns Professor.
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