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Pelo bem do Brasil

Pelo bem do Brasil
Marcelo Crivella *

É incompreensível que a pró-reitoria da Universidade Federal de Santa Maria tenha solicitado a identificação de cidadãos israelenses "Volto a fazer a pergunta que já fiz uma centena de vezes, a mim e aos outros: qual foi o pior dia para os judeus nos 12 anos de inferno nazista? 

Todos damos a mesma resposta: 19 de setembro de 1941. Nesse dia tornou-se obrigatório o uso da estrela de Davi, de seis pontas, aquele trapo amarelo com a inscrição em letras maiúsculas: JUDEU. [...] Cada judeu passou a carregar consigo o próprio gueto, como o caracol carrega a casinha”. Assim, o filólogo Viktor Klemperer inicia o capítulo 25 de "A Linguagem do Terceiro Reich", fortíssimo testemunho sobre a vida dos judeus durante o nazismo. Sujeitos à identificação compulsória, a partir dessa data eles perderam definitivamente o direito de viver em paz. Klemperer, portador da estrela, nos conta o que ocorria quando caminhava na rua: "'Olhe bem para ele, Horst, é o culpado de tudo', diz um avô ao netinho em uma calçada em Berlim. 

Foi o ápice do antissemitismo, que tem longa história, sob diferentes roupagens, e que culminou no assassinato premeditado de 6 milhões de inocentes. 

Houve ali um paradoxo: essa comunidade acusada de ser um corpo estranho na nação alemã vivia o vértice da sua integração. Desde o final do século 18, era um dos principais polos de disseminação dos ideais iluministas: universalismo, direitos humanos, razão, aperfeiçoamento de si mesmo. 

Essa comunidade que, majoritariamente, queria viver o sonho de uma civilização europeia cosmopolita foi atropelada pela ascensão fulminante de uma ideologia baseada em "blut und boden" (do alemão sangue e terra), em que a razão, conceito inclusivo, deu lugar à raça, conceito excludente. 

A tolerância desapareceu. Identificados com o iluminismo, os judeus tornaram-se traidores de uma construção nacional patológica. A terra do escritor Goethe tornou-se a terra de Hitler. Volto a Klemperer: o pior dia foi aquele em que cada judeu foi forçado, pelo poder, a se identificar como tal e a se expor. Felizmente, estamos muito longe de algo parecido no Brasil. 

Justo por isso, é incompreensível que a pró-reitoria da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, tenha solicitado aos seus departamentos, por ofício, a identificação de eventuais cidadãos israelenses que estejam estudando ou trabalhando em seus campi. Se estão lá, é porque foram convidados ou se habilitaram conforme as regras da universidade. Que sejam deixados em paz. Que sua privacidade não seja violada. 

Que seus direitos sejam respeitados. Que a direção da universidade volte atrás e peça desculpas. É o mínimo que todos esperamos, pelo bem do Brasil. 

A história mostra que o passado costuma voltar quando nos falta vigilância (Marcelo Crivella – é senador pelo PRB-RJ – Folha de S.Paulo).

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