Carl Djerassi, o 'pai' da pílula anticoncepcional em 2013 |
Carl Djerassi. O homem que mudou a maneira de viver das mulheres.
O "pai" da pílula tinha uma enorme paixão pela pintura de Paul Klee e doou parte da sua coleção ao Museu de Arte Moderna de São Francisco. Como químico, mudou a vida de muita gente, em especial a das mulheres, com a "invenção" da pílula.
Texto de: Manuela Goucha Soares |
Nasceu em Viena [Áustria] em 1923, filho de um dermatologista e de uma dentista, mas passou os primeiros anos da infância na capital da Bulgária, terra do seu pai. Os pais divorciaram-se em 1929, mas o nazismo obrigou-os a recasarem-se nove anos mais tarde. Não que Hitler tenha exigido o matrimônio dos dois médicos judeus, mas foi a única solução encontrada pelo pai de Carl para que este e a mãe pudessem chegar à América com um passaporte búlgaro [a Áustria recusou-se a conceder a cidadania à criança].
Este artífício legal permitiu que mãe e filho aportassem em Nova Iorque no final de 1939. Sem dinheiro no bolso, a vida não foi fácil nos primeiros anos. Inteligente e determinado a prosseguir os estudos, Carl tentou a sorte e apelou ao coração da primeira-dama dos EUA Eleanor Roosevelt. O jornal britânico "The Telegraph" conta que o jovem lhe escreveu pouco depois de chegar à América, para lhe dar conta da dificuldades que ele e a sua mãe estavam a viver.
Eleanor deixou-se tocar pela carta e passou o assunto ao Instituto Internacional de Educação. Carl obteve uma bolsa e licenciou-se em Química no Kenyon College, no estado do Ohio. Bom aluno, prosseguiu os estudos na Universidade do Wisconsin, e em 1945, no fim da Guerra, obteve a cidadania americana.
Da importância dos anti-histamínicos à revolução da pílula
Carl Djerassi casou-se três vezes e divorciou-se duas. A terceira mulher morreu morreu em 2007. Além dos anos dos casamentos, das datas de nascimento dos dois filhos e do suícidio da filha, há outras datas a reter na vida do investigador químico Carl Djerassi.
Em 1949, dez anos depois de ter chegado aos EUA na companhia da mãe, estava a dirigir um centro de pesquisa na cidade do México, onde desenvolveu estudos sobre os efeitos da cortisona e o sua utilização na hipotética regulação do ciclo menstrual e no tratamento do cancro.
Dois anos mais tarde, a 15 de outubro de 1951, Djerassi e dois outros investigadores que trabalhavam com ele no centro de investigação da cidade do México sintetizaram, por mero acaso, uma hormona feminina a partir de um tubérculo local. Andavam à procura de uma fórmula para fabricar medicamentos que prevenissem as dores menstruais e resolvessem os problemas de infertilidade... e descobriram a pílula, um contraceptivo oral que mudou a vida das mulheres libertando-as do peso de uma gravidez indesejada. A molécula isolada pela equipa de Carl Djerassi só seria comercializada nove anos mais tarde.
No ano seguinte, em 1952, tornou-se professor de química na Universidade de Wayne, em Detroit. Em 1959, começou a dar aulas em Stanford, na Califórnia, e comprou uma propriedade onde construiu uma casa para a sua coleção de arte: Paul Klee era o pintor preferido.
Em 1968, fundou a Zoecon, uma empresa que estudava as hormonas dos insetos para criar pesticidas não tóxicos. E em 1979, depois da morte da filha, transformou a casa onde guardava a sua coleção de arte numa residência artística onde acolhia escritores, dramaturgos, coreógrafos, músicos e artistas plásticos.
Esteve em Portugal em outubro de 2011, altura em que a Universidade do Porto distinguiu o químico Carl com o título Doutor Honoris Causa. Algum tempo antes, o grupo de teatro Seiva Trupe levou à cena a peça "Oxigênio" do Carl dramaturgo.
Definia-se como um "polígamo intelectual", como escreve o jornal britânico "The Telegraph", porque repartia a sua criatividade pelo romance, poesia, mecenato, sem nunca esquecer a investigação e divulgação científica. Morreu em São Francisco, aos 91 anos, no fim de semana.