Alberto Nisman, que foi encontrado morto na noite de domingo, acusava presidente e cúmplices de encobrir o Irã em atentado.
O Centro de Informação Judicial argentino divulgou nesta segunda-feira a denúncia na íntegra do promotor Alberto Nisman contra a presidente argentina, Cristina Kirchner, e outros acusados de encobrir a participação do Irã no caso Amia, quando a organização israelita em Buenos Aires foi alvo de um carro-bomba. 85 pessoas morreram e outras mais de 200 ficaram feridas. Nisman foi encontrado morto com um tiro na cabeça na noite de domingo, logo antes de apresentar a denúncia no Congresso.

“A decisão deliberada de encobrir os imputados de origem itaniana foi tomada pela cabeça do Executivo nacional, a dra. Cristina Elisabeth Fernández de Kirchner, e instrumentada principalmente pelo ministro de Relações Exteriores da nação, sr. Héctor Marcos Timerman. As provas examinadas revelam a intervenção ativa de vários sujeitos com distintos graus de participação.
Pressionada pela opinião pública, Cristina havia liberado a divulgação do relatório. A Justiça argentina deixou claro, desde a morte de Nisman, que o caso Amia não seria parado.
Histórico
Nisman, que tinha duas filhas com a juíza Sandra Arroyo Salgado, iria aparecer nesta segunda-feira perante uma comissão da Câmara dos Deputados para apresentar o caso contra a presidente e vários de seus aliados. Ele chegou a solicitar um embargo de cerca de 19 milhões de euros para Cristina e os outros investigados.
Na quinta-feira, o governo argentino pôs sob suspeita o promotor, um dia após ele denunciar a presidente. Em 1994, uma explosão contra a Amia por um carro-bomba deixou 85 mortos e provocou danos estruturais em outros nove edifícios no bairro Once, no distrito de Balvanera. O Hezbollah havia sido acusado do crime, mas em 2006 revelou-se que o Irã seria um possível mandante.
O chanceler Héctor Timerman, que também foi denunciado por Nisman, acusara o promotor de “investigar clandestinamente a presidente” em vez de se concentrar em investigar os suspeitos pelo atentado e de agir contrariado pelo afastamento de aliados seus da Secretaria de Inteligência argentina.
Timerman não foi o único do governo a voltar a artilharia verbal contra Nisman.
O ministro do Interior, Florencio Randazzo, disse que “só um pervertido” pode imaginar que a presidente tenha fechado um “pacto de impunidade” para ocultar a responsabilidade do Irã.
O chefe de Gabinete de Cristina, Jorge Capitanich, disse que o promotor faz parte de uma conspiração de “membros do Poder Judiciário, grupos de mídia, corporações econômicas, setores de Inteligência nacionais e internacionais que buscam desestabilizar o governo permanentemente com sua atitude golpista”.
A denúncia do envolvimento de membros do governo argentino conta com 300 páginas. Além de Cristina e Timerman, o promotor Nisman denunciou também o deputado Andrés Larroque, o líder sindical Luis D’Elia e o ativista Fernando Esteche. Eles teriam negociado com o Irã o fim das investigações em troca da venda de petróleo para diminuir o déficit energético argentino.
Em maio de 2008, Nisman pediu a detenção do ex-presidente Carlos Menem e do ex-juiz Juan José Galeano. À época, ele mantinha uma relação considerada bastante amistosa com Cristina e seu marido, o então presidente Néstor Kirchner, quem acusou o Irã formalmente na ONU com as investigações preliminares de Nisman.
Cristina sugeriu uma investigação conjunta com o Irã, em 2013. Na época ela declarou que o pacto iria reabrir o inquérito, mas Israel e grupos judeus disseram que a medida ameaçava o andamento do processo criminal do caso. A comissão da verdade foi desautorizada por um tribunal argentino, e Teerã jamais a ratificou.
Após a morte de Nisman, o juiz federal Ariel Lijo declarou que um processo judicial para apurar o caso Amia será aberto.