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Perspectiva judaica contra o uso de peles e couro


Por Rabbi Dr. Shmuly Yanklowitz / 

Tradução de Sérgio Greif Qual é o preço de um belo casaco de couro? Ou de uma luxuosa estola de pele de vison? 

Ao passo que muitas pessoas pensarão nesses itens em termos monetários, tendo a vê-los além do preço da etiqueta, tentando ver o custo que esses itens tem para as criaturas vivas: a pele e o couro de animais usados simplesmente por vaidade.

De acordo com a International Society for Animal Rights (Sociedade Internacional pelos Direitos Animais), para se fazer um traje de peles se requer 400 esquilos, 240 arminhos, 200 chinchilas, 120 ratos-almiscarados, 80 zibelinas, 65 visons, 50 martas, 30 guaxinins, 22 linces vermelhos, 12 linces ou 05 lobos. Ao contrário da imagem que muitas pessoas tem, a maioria desses animais que fornecem peles não são capturados na natureza com armadilhas de aço que esmagam suas pernas. Ao invés disso, cerca de 85% de todos os retalhos de pele provém de fazendas cujo sistema lembra muito a indústria da carne em sua crueldade.
A carnificina anual da indústria de peles é assombrosa. Aproximadamente 1 bilhão de coelhos e 50 milhões de animais criados em fazendas são mortos anualmente; mesmo cães e gatos são vitimas da indústria de peles, principalmente na China e outros mercados asiáticos. Os métodos utilizados na execução desses animais para preservar sua pele inclui eletrocução, envenenamento por emissões veiculares, ou simplesmente atordoando os animais e tirando sua pele antes que tenham chance de reagir.
De acordo com o Fur Information Council of America (FICA), a maior associação de comerciantes de pele, cerca de 70% dos US$1,39 bilhões de vendas de retalhos de pele em 2013 eram de vison, pequenos mamíferos carnívoros semi-aquáticos. Em 2009, cerca de 300 fazendas de pele norte- americanas (apenas o Wisconsin possui 71 fazendas, Utah possui 67) mataram 3 milhões de visons. Os visons são mantidos em gaiolas apenas ligeiramente maiores do que seus corpos pela duração de suas vidas. Devido a essas condições severas, cerca de 3 em cada 10 visons criados em Utah são portadores da incurável doença viral aleutiana (plasmocitose), e cerca de 1 em cada 5 morrem dessa doença antes de serem abatidos. Além disso, o cruzamento seletivo, utilizado principalmente para criar cores de pele exóticas e não naturais levaram a irreparáveis defeitos genéticos que colocam esses animais em estresse ainda maior.
De acordo com a FICA, a venda de peles aumentou cerca de 10% de 2012 a 2013, cerca de um quinto das mulheres norte-americanas possuem um casaco de peles e mais da metade delas tem idade inferior a 44 anos, sendo o maior mercado a cidade de Nova Iorque. 

A indústria parece estar em ascensão, e o número de desenhistas que tem utilizado pele em suas coleções aumentou substancialmente, de cerca de 42 uma geração atrás, para cerca de 500 em 2014.
Embora a tolerância pela pele esteja em ascensão, a exposição da crueldade na produção de pele resultou em progressos, embora pequenos. Fotografias do assassinato de filhotes de foca no Canadá, por exemplo, levaram ao banimento na importação de pele de foca nos EUA em 1972 e na União Europeia em 2009, e hoje apenas o Canadá e a China (que importa pele de bebes foca da Namíbia) permitem a importação de peles de foca. Isto pode ajudar a explicar porque que o número global de mortes de bebes foca canadense caiu nos últimos anos. Adicionalmente, desenhistas prestigiosos e celebridades continuam a propagar a mensagem anti-peles, e em 2014, o Mahiki, um dos mais exclusivos clubes noturnos de Londres, adotou um código de vestimenta para banir clientes que utilizam peles.   
No pensamento judaico, o conhecimento compele à ação. Rabbi Chaim Dovid Halevy, o grande Rabino-Chefe Sefaradita de Israel durante o século XX e vencedor do desejado Prêmio Israel, estabeleceu em 1992 que os judeus devem evitar vestir peles devido à proibição de tza’ar baalei chaim – causar dor aos animais. Ele prossegue explicando que há já fazendas que adotam diferentes procedimentos, mas mesmo matar sem tza’ar baalei chaim é proibido se não compelido pela necessidade humana (tzorech chiyuni).*” Ele finalmente estabelece que uma pessoa não pode usar pele, mesmo que por um motivo religioso.
Ademais, Rabbi Shlomo Pappenheim estabelece que “devido à grande discussão pública sobre a necessidade de suspender a dor desnecessária aos animais**, vestir o shtreimel (chapéu de pele utilizado pelos judeus hassídicos casados) atualmente se constitui em um Chilul Há’shem – uma profanação do nome de D’us”***
Com efeito, uma das cinco proibições para os judeus em Yom Kippur (Dia do Perdão) é de não vestir sapatos de couro (a proibição está contida em Yoma 73b ****). Rabbi Isaiah Horowitz, que ficou conhecido como Shelah Hakadosh, um místico do início do século XVII, sugeriu em seus comentários sobre a benção sh’asa li kol tzarki ***** que a razão pela qual não vestimos couro em Yom Kippur está enraizada em nosso compromisso com a compaixão. Ele baseou seu argumento no Salmo 145:9:V’rachamav al kol maasav  - a noção de que D’us é compassivo para com todas as criaturas. Em Yom Kippur, reconhecemos que somos todos pecadores e que não podemos comparecer perante o Criador em boa consciência, pedindo por sua compaixão, se não estamos em estado compassivo. Indo além, o Shelah sugere que não são meros humanos que possuem o domínio sobre o reino animal, mas seres humanos divinos. Assim, em Yom Kippur, os pecadores não tem o direito de se beneficiar dos animais de qualquer forma.
Há um costume judaico de se dar uma benção quando uma pessoa está vestindo um traje novo pela primeira vez, mas Rabbi Moshe Isserles (o Rema) estabeleceu que isso não se aplica quando o novo traje ou calçado é feito de pele ou couro, já que sua criação necessitou da morte de um animal e nós devemos imitar D’us cuja “compaixão se estende por toda Sua obra,” (Shulchan Aruch, Orach Chaim 223:6).
Nachmanides ensinava que aqueles que matam grandes animais são mais prováveis de desenvolverem tendências cruéis (comentário de Deuteronômio 22:6). Aquele que permite essa morte adquirindo (a carcaça, a pele, o couro, a carne . . .) deve ser visto como aquele que mata o animal. Quando vestimos roupas fornecidas por uma indústria insensível à vida de seres sencientes, nós devemos  ponderar sobre sua posição ética. É nosso dever enquanto consumidores, mas mais ainda como pessoas sensíveis ao sofrimento dos vulneráveis, que nós abolamos essa crueldade, mediante a escolha do que vestir. Não é difícil comprar cintos sem couro para poupar os animais do sofrimento desnecessário. Felizmente, hoje, possuímos alternativas de qualidade e com preços acessíveis ao couro e às peles.
Os Sábios ensinaram que os judeus devem ser rachmanim b’nei rachmanim, filhos compassivos de ancestrais compassivos (Beitza 32b). O mandamento deve permear todas as nossas ações, especialmente quando estamos atendendo às nossas mais básicas necessidades.  
 Rabbi Dr. Shmuly Yanklowitz é Director Executive do Valley Beit Midrash,  fundador e presidente doUri L’Tzedek, fundador e CEO do The Shamayim V’Aretz Institute e autor de sete livros sobre Ética Judaica. De acordo com a Newsweek, Rav Shmuly é um dos 50 rabinos mais importantes dos Estados Unidos
*O conceito detzorech chiyuni, a legitimação da morte de um animal apenas nos casos de real necessidade humana, quando confrontado com o fato de que o consumo de produtos de origem animal não é uma necessidade vital humana, deveria ser suficiente para converter todos os judeus em vegetarianos, se o conceito fosse melhor trabalhado. (N.T.)
** Sofrimento desnecessário traz a pergunta de quais tipos de sofrimentos são necessários. A opinião do tradutor do artigo e do Olhar Animal é de que nenhuma forma de sofrimento imposwta ao animais é justificada pelo ponto de vista da ética. (N.T) 
*** Embora o autor não tenha utilizado a grafia G-d em seu artigo original, o tradutor resolveu adotar a grafia D’us na língua portuguesa. Trata-se de um costume judaico alterar a grafia da palavra Deus em todas as línguas, baseado no Terceiro Mandamento (N.T.) 
**** Yoma, assim como Beitza, também citado no texto, são tratados presentes no Seder Moed, parte dos registros da literatura rabínica antigos conhecido como Talmud (Mishna). Ambos versam sobre as leis referentes aos feriados judaicos, especialmente o Yom Kippur. O texto também cita o Orach Chaim, primeiro livro do Shulchan Aruch, importante codificação da lei judaica.
***** Trata-se de uma benção matinal “Baruch Atah Ha ‘shem, Elokeinu Melech Haolam, Sh’asa li kol tzarki”, literalmente, “Bendito sejas tu D’us, Nossos D’us rei do Universo, que me fez tudo o que eu precisava” (N.T.).

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