Destruída há quatro mil anos, Sodoma se tornou símbolo de perversão e
decadência moral. E seu destino vem suscitando temor e curiosidade.
Antes de ser destruída, a cidade bíblica estava localizada na
planície da Jordânia, área em forma de semicírculo, extremamente fértil,
na fronteira sudeste do território canaanita.
As referências bíblicas à
Sodoma (Sdom, em hebraico) estão principalmente no livro Gênese e sua
queda é relatada nos capítulos 18-19. Mas, é também citada em
Deuteronômio, no Livro de Jó e no Talmud, assim como por nossos
profetas. O controvertido historiador Flávio Josefo (37-100 desta Era), a
menciona em sua obra.
Sdom aparece pela primeira vez no capítulo Lech
Lecha, quando Lot, sobrinho de Abraão, estabeleceu-se no vale do Jordão,
escolhendo a cidade para lá estabelecer sua família. Assim a Torá a
define: “E os homens de Sodoma eram maus e pecadores contra o Eterno”
(Gênese 13-13).
Desde a primeira menção, é identificada como o epítome da crueldade e
perversão. Sodoma era a antítese de tudo o que Abraão acreditava e
simbolizava. A hospitalidade, virtude das mais praticadas por nosso
patriarca, lá era proibida. Os sodomitas odiavam os forasteiros, aos
quais não ofereciam hospitalidade, submetendo-os a abusos sexuais.
A
caridade era considerada crime grave, sendo executado quem a praticasse.
Conta o Midrash que a lei determinava que quem alimentasse um pobre
morreria na fogueira. Mas Plotit, filha de Lot, teve destino ainda pior.
Certa vez, viu na rua um mendigo e decidiu alimentá-lo. Quando os
habitantes da cidade perceberam o que Plotit fazia, prenderam-na,
tiraram suas roupas, lambuzaram seu corpo com mel e puseram-na sobre a
muralha da cidade, para que morresse picada pelas abelhas (Sanhedrin
109).
Relata a Torá que D’us ouviu o “clamor” das vítimas das iniqüidades
cometidas pelos habitantes de Sodoma e da vizinha Gomorra. O Eterno
revela, então, a Abraão, a Sua intenção de destruir completamente as
duas cidades. O patriarca tenta intervir junto ao Senhor, para as
salvar. Pede ao Todo Poderoso que tenha consideração com os Justos que
lá residiam. D’us lhe promete que, se houvesse ao menos dez Justos em
Sodoma, salvaria toda a cidade. Porém, na cidade não havia um Justo
sequer…
E, embora o Todo Poderoso não tenha salvo a cidade, poupou Lot e sua
família. E isto ocorreu em grande medida pelos méritos de seu tio,
Abraão, mas também porque, mesmo após morar entre sodomitas, Lot ainda
guardava em si o espírito da hospitalidade que aprendera com nosso
patriarca. Quando os habitantes da cidade descobrem que ele acolhera
dois “forasteiros” em sua casa, enfurecidos exigem que os entregue. Mas
Lot sai em defesa de seus hóspedes.
Os estrangeiros, que, na realidade, eram anjos enviados por D’us para
destruir a cidade, ordenaram a Lot que, com toda a sua família,
deixasse imediatamente aquele lugar condenado. E, ao amanhecer,
levam-no, com a mulher e duas filhas solteiras, para fora da cidade,
alertando: “Sequer olhem para trás”.
Assim que Lot e seus familiares partem, D’us faz chover enxofre e
fogo sobre Sodoma e Gomorra. Não obedecendo às ordens dos anjos, a
mulher de Lot se virou para olhar o que acontecia na cidade condenada. A
punição veio como um raio: foi transformada em estátua de sal. De
acordo com o Talmud, este sal chama-se Melach Sedomit, sal sodômico.
Josefo, em sua obra, afirma que durante sua vida, o pilar de sal ainda
podia ser visto.
De manhã, quando Abraão voltou ao lugar onde D’us lhe aparecera, viu a
destruição que se abatera sobre Sodoma e demais cidades vizinhas. Densa
fumaça ocultava o vale e, as chamas rapidamente consumiam a terra. Uma
chuva de sal completava a catástrofe (Deut.29:22 ). Na planície queimada
por enxofre e sal, a terra tornara-se estéril, sendo que lá “nada podia
ser plantado e nenhuma vida brotaria”. (Deut. 29:22).
Quando a
devastação se completou, um enorme lago de sal e betume espalhava-se a
leste do deserto de Judá, em hebraico conhecido como o Yam Hamelach, o
mar de sal. Na antigüidade, foi também chamado de Hayam Hacadmoni, o
antigo mar;Yamá shel Sdom, mar de Sodoma; e, ainda, Yam Ha’aravá, mar do
vale do Aravá. O nome Mar Morto somente surgiu após o advento do
Cristianismo, atribuído pelos monges cristãos, pelo espanto causado pela
aparente ausência de qualquer forma de vida em suas águas.
Hoje, o Mar Morto, cujas águas contêm 33% de sal, quantidade dez
vezes superior à encontrada no Mar Mediterrâneo, é considerado uma das
maravilhas do mundo. É um grande lago represado entre colinas, com 76km
de comprimento por 18km de largura, e tem, em sua parte mais funda, 400m
de profundidade. Suas margens, a 396m abaixo do nível do mar, são o
ponto seco mais baixo do mundo. Em seu redor, espalham-se montanhas de
sal naturalmente esculpidas em forma de chaminés e cavernas. Entre
estas, pode-se distinguir perfeitamente uma escultura em forma de
cogumelo, que, segundo antigas tradições, seria a estátua da mulher de
Lot.
A região
A exploração econômica da região já se iniciara desde o tempo dos
nabateus, que vendiam betume. (o depósito de lama que se acumulava no
fundo do lago) aos egípcios, que o utilizavam para embalsamar seus
mortos. Este comércio que se estendeu até a era romana.
Flávio Josefo, na História da Guerra Judaica, escreve: “… região de
Sodoma, território outrora próspero por suas colheitas e pela riqueza de
suas diversas cidades, mas, atualmente, inteiramente queimado. Diz-se
que a impiedade de seus habitantes lhes valeu serem abrasados pelo raio…
ainda lá existem traços do Fogo Divino e se podem ver vestígios de
cinco cidades… A narração lendária sobre a região de Sodoma é, pois,
plenamente confirmada por aquilo que se vê”.
Sobre o Mar Morto, que Josefo chama de “lago de asfalto”, ele
escreve: “Salgado e estéril…. sua água faz boiar os objetos, por mais
pesados que sejam…”. Os gregos falavam com insistência em gases
venenosos que se desprendiam por toda a parte nesse mar, enquanto os
árabes diziam que, há muito, nenhuma ave conseguia sobrevoar de uma
margem a outra. Diziam que, ao tentar cruzá-las, as aves se precipitavam
subitamente n’água, já sem vida.
Mas, onde realmente se localizava Sodoma? Com base em informações
contidas na Torá e nas várias formações de sal da região, os arqueólogos
têm tentado, em vão, definir sua localização exata. Apesar de alguns
terem centrado suas buscas ao norte do Mar Morto, a maioria acredita que
as antigas Sodoma e Gomorra se situassem ao sul do lago, em uma área de
formação geológica mais recente do que o restante da região. A tese da
posição geográfica ao sul parece ser sustentada também por uma tradição
local, como mostra o nome árabe da montanha de sal, Jebel Usdum, ou
seja, Montanha de Sodoma, no extremo sudeste do mar Morto. A montanha
tem 10km de comprimento, 5km de largura e 30m de espessura. Embora
esteja coberta por uma camada de terra de alguns metros de espessura, o
restante de sua composição é sal sólido.
História moderna
No século XX, o nome Sodoma foi dado a um sítio industrial a sudeste
do Mar Morto. Desde o início do século, engenheiros que visitavam o
local e, até mesmo, Theodor Herzl, logo percebem o enorme potencial do
Mar Morto para a extração mineral, mediante o uso da energia solar. A
atual cidade de Sdom foi fundada em 1937. Logo depois, construiu-se em
Kalia, no extremo norte do Mar Morto, plantas de potassa para constituir
uma filial da Palestine Potash Co. À época, não havia estradas que
ligassem o local à cidade; a comunicação era feita através de pequenos
barcos, que atravessavam o Mar Morto.
Em 1947, o plano de Partilha da Palestina elaborado pelas Nações
Unidas incluía Sodoma, ou Sdom, dentro das fronteiras do futuro Estado
de Israel. No início da Guerra da Independência, em 1948, Kalia passou
para o controle da Legião Árabe, ficando Sdom totalmente isolada de
Israel. A única maneira de enviar suprimentos à cidade era por via
marítima ou aérea. Durante seis meses, de agosto a dezembro de 1948,
víveres foram enviados em pequenos aviões, até que a área foi libertada
por uma unidade das Forças de Defesa de Israel.
A estrada que finalmente uniu Beersheva a Sodoma foi terminada em
1952 e, dois anos mais tarde, a empresa estatal Dead Sea Works Ltd., de
produtos químicos, pôde iniciar atividades. Na época, a região era uma
das poucas fontes de fertilizantes à base de potassa para a África e
Ásia. Atualmente constitui o quarto produtor mundial e fornecedor de
produtos derivados do mineral.
A região abriga atualmente outras indústrias do setor de potassa,
fosfato e sal. Em 1955 foi inaugurada a companhia Dead Sea Bromine, que
figura entre as maiores produtoras mundiais de brometo. Em 1996, a
empresa alemã Volkswagen AG e a israelense Dead Sea Works Ltd.
anunciaram um investimento conjunto de US$ 600 milhões, em um projeto de
instalação de uma usina para extração de magnésio, no Mar Morto.
Apesar da aridez que castiga a paisagem local, o Keren Kayemet
LeIsrael (KKL), valendo-se de tecnologia de ultimíssima geração, está
implantando, na região em torno de Sodoma, uma atividade econômica
altamente rentável e nova para o local: a piscicultura.