Por Genie Milgrom.
Hoje é o dia em que já estávamos preparados por tanto tempo. O dia que tinha me deixado acordada tantas e tantas noite. O dia em que finalmente podíamos recuperar a Historia Judaica de uma pequena aldeia escondido nas montanhas que servem como um observatório ao Rio Duero, que separa a Espanha de Portugal. A bela Villa de Fermoselle. Berço dos meus ancestrais por 550 anos antes de migrar para outras partes do mundo. Os judeus viviam lá como praticantes, então, como cripto-judeus, e, finalmente, por centenas de anos como católicos romanos.
Por razões que nunca vou saber, eu era descendente eleita para retornar às tradições de nossos pais e voltar ao mesmo tempo, aos meus ancestrais para recuperar seu passado judaico. Eu tinha vivido nesta bela aldeia, neste canto no noroeste da Espanha em busca dessas raízes diversas e eu andava pelas ruas tão familiares para mim, muitas vezes. Em cada um desses casos, as paredes me contavam coisas, uma voz muito baixa, cada vez me fornecendo um novo segredo. As paredes procederam cuidadosamente para ter certeza de que eu era digna de receber seus segredos.
Devagar e com os anos, eu tinha descoberto que minha linha materna teve uma rica história e raízes firmes plantadas em Fermoselle. Eu tinha encontrado os escritórios de meus ancestrais, seus casamentos, suas vontades, as vendas de casas e terrenos, mas mais importante do que isso, eu tinha encontrado os processos da Inquisição, onde Reis Católicos julgaram meus próprios membros da família que se atreveram a praticar o judaísmo. Primeiro abertamente e depois escondido. Por esse pecado, eles foram torturados, enforcados e queimados. É impossível te-los de volta comigo, mas eu oro para que estejam me observando de longe, hoje, quando voltei para a aldeia onde viviam neste dia que estamos dando homenagem a uma via pública. Hoje é o dia em que as paredes finalmente podem contar suas histórias.
O prefeito de Fermoselle, Don Alejandro Fermoselle Berdión, tinha trabalhado em estreita colaboração com a gente na preparação para este dia especial. Tiremos o chapéu para Don Alejandro, pois é admirável que tem contribuído a trazer de volta essa dor profunda e o passado, como os do antigo bairro judeu de seu povo, quando muitos não querem nem mesmo tocar no tema. Tendo organizado um grande grupo de historiadores para estar juntos neste dia, vieram os Professores Anun Barriuso e José Manuel Laureiro de Madrid, também o professor Jesus Jambrina da Universidade de Veterbo e eu, da Tarbut Sefarad Fermoselle. Planejamos este importante evento na Casa Parque de Fermoselle, que está localizada em um antigo mosteiro.
Neste lugar tão perfeito, com suas paredes de pedra, altas janelas, e pedras esculpidas indricamente, chegamos num grupo cheio de informações históricas e esperando uma ajuda significativa para a nossa conferência. Esta seria uma apresentação que fascinaria muitos, surpreenderia outros e esperávamos que não seria negada por alguns. Nós não tínhamos ideia do que aconteceria naquele dia, mas ele foi o nosso maior desejo, como tanto tínhamos trabalhado, estava-se apresentando evidências de que seria apenas um começo de uma série de investigações que poderiam eventualmente colocar Fermoselle no mapa como parte da Rede de bairros judeus na Espanha, uma organização governamental dedicada a restaurar a memória de judeus e comunidades judaicas da Espanha.
Chegamos cedo e ansiosos, sem saber o que esperar. Como sempre, tivemos as palavras de encorajamento que meu marido, Michael, nos deu. Parados ali, esperando no frio e no nevoeiro eramos um grupo de historiadores que vieram ao local para dar luz à eventos que tinham permanecido obscuros por mais de 500 anos. Enquanto estávamos nos preparando, não podíamos acreditar na quantidade de pessoas que estavam chegando na Casa do Parque. Centenas entraram através das portas e correram para conseguir um lugar. Tinham vindo de Madrid, Córdoba, Buenos Aires, muitos tinham se locomovido de Portugal, Lisboa, Porto e Mogadouro. Chegaram primos que nunca tinha conhecido e que estavam em minha árvore e atualmente vivem em Portugal. Vieram primos de Oviedo também, assim como professores, personagens culturais de agências na Espanha e, mais importante, os moradores de Fermoselle, prontos para ouvir sobre seu passado judaico. Foi muito emocionante ver o grupo que veio aprender com o passado judeu de Fermoselle.
Começamos com algumas palavras do prefeito e eu continuei lendo um poema que minha avó tinha escrito cerca de 50 anos atrás chamado "A Fermoselle", onde ela, ironicamente, faz várias referências aos segredos escondidos nas paredes da cidade e seus muitos arcos históricos . Ela desejava conhecer os segredos e, hoje, eu, sua neta, orgulhosamente os revelo. O Professor Jesus Jambrina nos fascinou com uma pequena parte de seu documentário sobre Zamora Sefardi, intercalando no meio belas e antigas músicas sefarditas, o professor deu-nos alguns pontos históricos e verificou a importância das ''Juderías'' da Zona Zamorana da Espanha, onde Fermoselle está localizada. Esta informação está saindo mais e mais a cada dia, em grande parte graças aos esforços do nosso grupo têm sido lentamente difundidos. Seguiram os professores Laureiro e Barriuso, explicando as origens dos judeus na Espanha e apresentado a todos os que estavam presentes, que o que temos encontrado em Fermoselle são 2 possíveis sinagogas, micvê e também várias pedras esculpidas com sinais que remitam bastante aos símbolos dos Crypto-judeus.
Eu sigo com a prova da minha árvore genealógica com suas raízes firmemente plantadas em Fermoselle que mostra os processos da Inquisição mostrando que minha família vivia em Fermoselle, praticava sua religião lá e acabou morrendo lá. Ver minha árvore-genealógica materna que mede mais de 15 metros de comprimento, foi um grande choque para todos que estavam presentes.
Mesmo depois de toda esta maravilha, faltava o melhor do dia. O prefeito levantou-se e ficamos todos de pé com ele, e proclamou que ele estava fazendo uma cerimônia oficial e me entregou a chave simbólica dos judeus de Fermoselle. Também deu um pergaminho para servir como uma memória histórica dos descendente dos judeus de Fermoselle. A alegria e a felicidade de todos os presentes era palpável. Os aplausos e comentários foram efusivos e exuberante. Este ato histórico realizado em Fermoselle por Don Alejandro é um grande passo para a recuperação da nossa memória perdida na Espanha.
Na história da Espanha, esta é apenas a segunda vez que dão uma chave para um descendente histórico dos judeus espanhóis.
Estou tão orgulhosa de ser essa judia espanhola que recuperou um dia que foi perdido em nossa história.
Terminamos um lindo dia, ouvindo a música Sefaradita tocada por Jambrina e Madrid de Zamora que doaram seu tempo e energia, enquanto todos os que estavam presentes provavam os vinhos, azeitonas e queijos feitos na própria Fermoselle.
Com um muito especial agradecimento ao prefeito Don Alejandro Fermoselle, Olga Gonzalez e Julia Sendin da Casa do Parque, aos professores Anun, José Manuel e Jesus e meu marido Michael por ser capaz de realizar este evento!
Genie Milgrom é autora do livro Minhas 15 Avós, pesquisadora de antigas inscrições judias, e presidente da Tarbut Sefarad-Fermoselle e da Associação Judaica de Genealogia de Miami. Ela viaja o mundo dando palestras e inspira outros a encontrar suas raízes judaicas.
Seu site é www.geniemilgrom.com e pode contatá-la em spanishancestry@aol.com