Quem gosta de filmes com conteúdo e intensidade dramática tem nesta obra de Lorraine Levy o seu expoente máximo entre os trabalhos exibidos até agora na Festa do Cinema Francês. História de duas pessoas, duas famílias, duas culturas, duas religiões, duas nações – partindo de um simples ponto de partida: dois bebês são trocados na maternidade, o que só é descoberto quando eles já têm 18 anos.
Problema em si já complicado, é singularmente agravado pelo fato deles terem sido trocados por grupos/comunidades que por norma se odeiam profundamente: os judeus e os palestinos.
Uma vez apresentado o conflito, o filme jogo com todas as possibilidades de tal drama e atinge uma complexidade narrativa e uma intensidade emocional de tal ordem que parece ser impossível o edifício não desandar de vez a qualquer momento. O que não acontece. Extremamente bem construído, a sua magnífica teia de questões, dilemas e situações vai espalhando-se à procura de um intangível ponto de descompressão.
Este não pode chegar antes do fim (ou mesmo com ele), mas a tensão é gerida de forma tão sóbria quanto intensa, sem nunca cair na leviandade, mas sem nunca sufocar. Habilmente, Levy sabe o material que tem nas mãos e obriga-se a pontuar o desenvolvimento da história com diversos espaços silenciosos onde utiliza um registo intimista para que seus personagens (e o espetador) possam respirar.
Da relação cultura/biologia num primeiro plano, onde as cartas baralhadas da vida dos jovens os deixam subitamente sem povo, sem identidade, sem pátria, passa para um segundo plano onde entram as questões bem reais do verdadeiro estado de sítio que é a Palestina, um território cercado onde seus habitantes nem podem ver o mar se não obtiverem autorização do governo de Israel.
É sobre a gigantesca sombra do jogo político e os ódios profundos daí decorrentes que estas duas famílias vão ter que, de alguma forma, aprenderem a aceitar-se. Ou não. Grande filme.
