Hot Widget

Type Here to Get Search Results !

Os verdadeiros terroristas

A Operação Barba Ruiva foi anunciada com quase vinte anos de antecedência. No Mein Kampf, Hitler destacou a importância do que chamou de Espaço Vital, que garantiria o abastecimento de alimentos e energia para os “arianos”. O olho gordo mirava o leste europeu, habitado por “eslavos racialmente inferiores”, e a invasão da União Soviética, em 1941, apenas confirmou os planos do ditador alemão. Junto com a política de terra arrasada, veio a aniquilação sistemática dos quadros políticos comunistas, dos funcionários soviéticos e dos judeus, levada a cabo especialmente pelos Einsatzgruppen. Não foi diferente na Bielorrússia. Na capital Minsk, os nazistas criaram um gueto e trataram de continuar seu trabalho sujo. Lá, no entanto, surgiu algo novo.
           Partisans de
                            MinskCom tremendas dificuldades e importante ajuda dos bielorrussos, um grupo de judeus organizou rotas de fuga, lançando a palavra de ordem “Todos para as florestas ! Pela luta armada contra os assassinos hitleristas!”. Era nas florestas que se estruturavam grupos de partisans (guerrilheiros), fundamentais na luta contra o invasor alemão. Um dos principais líderes do gueto era Hersh Smolar, que lutou nas florestas que rodeavam Minsk e sobreviveu à guerra. Adivinhem como é que os nazistas chamavam os partisans


Terroristas. 


Alguma novidade ? Quem desafia os poderosos, sejam exércitos de ocupação ou ditaduras, é desqualificado pela ideologia oficial. Com essa manobra, tratam de ganhar a batalha da comunicação e burlar a História. No Brasil dos generais não foi diferente. Agora, depois de uma demora injustificável, tenta-se recuperar ao menos uma parte da memória nacional através da Comissão da Verdade. 


Funcionará como se no Tribunal de Nuremberg apenas se registrassem para os livros escolares e os compêndios jurídicos os crimes hediondos praticados pelos nazistas. Nada de julgamento, justiça nem pensar. Os criminosos voltariam para suas casas e suas rotinas. Não, claro, sem um sorriso malicioso.
  Ditadura
                            militar 7      Há um falso debate em curso. Não se trata de saber se a Lei da Anistia está valendo e qual é a sua interpretação. Estamos lidando com o transbordamento de um esgoto malcheiroso, onde flutuam torturadores, assassinos, déspotas, oportunistas, carreiristas, traidores. Os militares, protegidos pelas brumas da Doutrina de Segurança Nacional, declararam guerra ao país e, apoiados pelo Grande Irmão do Norte, exportaram tecnologias e instrumentos de tortura. Fomos, melancolicamente, o laboratório do terror que, nos anos 70, se abateu sobre a Argentina, o Uruguai e o Chile. 


Militares brasileiros participaram ativamente de uma organização internacional que promovia sequestros de dissidentes, assassinatos, intimidações e repatriamento de bebês. Com um prontuário desses, sangue nas mãos, agora esses fantasmas querem falar de esquecimento e, pior, dizem que os que reagiram eram “terroristas”. 


 Amordaçaram, censuraram, exilaram, prenderam, dissolveram partidos políticos e cassaram políticos, professores e sindicalistas. Violentaram o país e esperavam, pobres inocentes !, que ninguém reagisse. A luta armada foi apenas uma das respostas ao regime. Seus integrantes foram perseguidos e trucidados, não raro com requintes de sadismo. Mesmo os grupos de oposição que divergiram da luta armada, como foi o caso do PCB, tiveram importantes quadros assassinados e muitos estão até hoje na lista dos desaparecidos.
Francisco
                          Tenório Jr.        Somos mesmo o país do jeitinho. Assassinos e torturadores pedem respeito à lei, quando foram eles os que violaram os princípios mais elementares de dignidade humana. Tribunais internacionais e a Constituição brasileira (Art. 5º, XLIII) consideram que a tortura não é passível de perdão e anistia. Será que tudo vai ficar apenas numa narrativa do que aconteceu nas masmorras da ditadura ? É suficiente para cicatrizar a imensa ferida que a caserna infligiu ao país torturado ?


No dia 18 de março de 1976, um pianista brasileiro que excursionava em Buenos Aires acompanhando Vinícius de Moraes e Toquinho saiu do hotel para comprar cigarros e remédios. Nunca mais voltou. Francisco Tenório Jr. foi confundido com um militante de esquerda procurado pelos militares argentinos e, depois de nove dias de tortura (com a participação de agentes brasileiros ligados à Operação Condor), foi assassinado. 


 Entrou para a estatística dos “desaparecidos”. Los hermanos, que não brincam em serviço e dão uma coça no nosso irritante deixa-p’ra-lá, inauguraram uma placa em homenagem ao Tenório, na porta do hotel onde ele estava hospedado. Diz: “Aqui se hospedou este brilhante músico brasileiro, vítima da ditadura militar argentina”. Lá, eles levam a cidadania a sério.
Abraço
Jacques  Gruman

Top Post Ad

Below Post Ad

Ads Section