Ô Quinto Filho
Este Shabat é chamado de Shabat Hagadol, ou o Grande Shabat; neles, iniciamos nossa preparação para a Festa que se aproxima. Durante o Seder de Pessach lemos na Hagadá que "a Torá fala a respeito de quatro filhos: um sábio, um malvado, um simples e um que, de tão pequeno, nem sequer sabe perguntar". O filho sábio pergunta sobre as mitzvot especiais de Pessach; deste modo, devemos responder de forma detalhada sobre as leis e os costumes da Festa. O malvado pergunta: "o que é todo este serviço para vocês?". Ao dizer para vocês exclui a si mesmo da comunidade judaica. Precisamos repreendê-lo de forma contundente. O filho simples pergunta: "o que é tudo isto?". Como resposta, devemos contar-lhe sobre o Êxodo do Egito. Com relação ao filho que não sabe perguntar, devemos iniciar um diálogo com ele numa linguagem que possa compreender o significado da ocasião.
Apesar de os quatro filhos serem tão diferentes uns dos outros, eles têm algo em comum: estão no Seder. Mesmo o filho malvado está lá, ainda que rebelde, participando ativamente. Interessa-lhe o que acontece com a vida judaica que o rodeia. Isto pelo menos justifica a esperança de que, algum dia, também o malvado se torne um judeu consciente e responsável por sua comunidade e fé.
Infelizmente, em nossa época, há uma nova classe de filho judeu, um quinto filho: aquele que está ausente do Seder. Ele não tem nenhum interesse no judaísmo e, nem ao menos, em sua comunidade. Não sabe sobre suas origens, costumes e muito menos sobre o tema de Pessach: a saída do Egito.
Na frenética realidade em que vivemos, muitos de nossos filhos já não têm mais tempo para se preocupar com as tradições de seus pais, seja por falta de conhecimento ou interesse. Não faz diferença. O essencial é que muitos não se encontram presentes à mesa do Seder. Enquanto que com o malvado mencionado na Hagadá podemos ainda ter esperanças, com relação a este quinto filho, se nada fizermos, o único que nos restará será lamentar por mais um judeu assimilado e completamente excluído de suas raízes.
E hoje, nestes dias que antecedem Pessach, cabe aqui ressaltar nossa tarefa como pais. Não mais podemos ficar à margem do que acontece em nosso meio. Certa vez um rabino disse que: ?ser judeu não é mais apenas nascer judeu, de pais judeus ou, pelo menos, de mãe judia; ser judeu é aquele que consegue fazer com que seus filhos continuem a ser judeus.? E é justamente esta a situação: hoje estamos aqui; mas, se nada fizermos, o que nossos filhos poderão passar para os seus filhos, para os filhos de seus filhos, e assim sucessivamente?
A Torá sabiamente comparou o homem a uma árvore. Esta, sem raízes, está destinada a tombar. Não deixemos que o mesmo aconteça com o futuro de nosso
povo.
O Êxodo do Egito, de forma específica, e a festa de Pessach, de forma geral, recordam-nos sobre a batalha de um povo pela sua sobrevivência, liberdade e salvação. Estas vieram através de sua lealdade à suas crenças a tradições. Nossos antepassados no Egito eram uma pequena minoria que vivia nas condições mais difíceis; mas mesmo assim preservaram a sua identidade e, com orgulho e dignidade, mantiveram-se fiéis à sua própria forma de vida, às suas tradições e à sua singularidade. Como o próprio Midrash conta, os judeus só tiveram o mérito de serem salvos porque, durante os 210 anos de sua escravidão, não renegaram a sua fé, não mudaram a forma de se vestir e não trocaram a sua língua. Enfim, mantiveram-se judeus.
E é esta a batalha que enfrentamos e o compromisso que assumimos nestes próximos Sedarim: assegurar a existência e, sobretudo, a continuidade de nossas tradições. Para que, um dia, se D'us quiser, possamos nos orgulhar de dizer que ainda somos judeus.
Autor: Prof. Sami Goldstein
Fonte: Sinagoga Francisco Frischmann