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Moisés


Fonte: “Ha-Lapid” de Barros Basto

Quando Moisés deixa a escola para entrar na vida, a primeira coisa que vê foi uma ofensa feita à justiça. Não dá tempo a reflexão, mas pune a afronta imediatamente: a eterna luta entre o profeta e a vida está declarada. Um egípcio maltrata um hebreu, o forte esmaga o fraco. Tal é o primeiro espetáculo que lhe mostra a vida. Moisés fica indignado e coloca-se do lado do fraco. Mas um outro espetáculo mais aflitivo o comove: “Dois hebreus estavam brigando”. 

Ambos seus irmãos, ambos fracos, ambos escravos do Faraó, e batem-se entre si! Esta vez ainda, um sentimento de justiça se apodera do coração do profeta e intervém. Mas é forçado a reconhecer que não há coisa própria senão tomar sempre o partido do direito e que interpondo-se entre homens mais fortes põe a sua própria vida em perigo. Mas esta comprovação não o torna mais sábio. 

Expulso do seu país, da sua pátria, vai estabelecer-se em outra parte. Chegado a um país desconhecido assenta-se a beira de um poço. E lá, mais uma vez ouve a voz da justiça oprimida e voa em seu socorro. Esta vez não são hebreus que disputam, são homens de um outro povo, de um povo que não conhece. Mas que importa! O profeta não faz distinção entre homens. Durante toda a sua vida de nômade, não cessa de combater pela causa do direito. 

E tornar-se-á o libertador do seu povo e ensinará a justiça não somente aos homens do seu tempo, mas a todas as gerações futuras. A revelação desta missão tem por quadro o grande e silencioso deserto. O profeta já cansado de dominar a eterna luta, aspira a uma vida calma. É por isso, que ele deixa os homens e se faz pastor. Com o seu rebanho, chega ao deserto. Mas o repouso foge-lhe lá também. Sente que não substituiu a sua missão. Uma voz interior pareceu dizer-lhe “Que fazes tu aí? Vai retomar a luta para que foste criado!” Procura subtrair-se a esta voz, mas não o consegue. A voz do Divino, a seu pesar, fala a sua consciência.

1 Artigo publicado no Ha-Lapid número 65 de março de 1934.

Um fogo queima os seus ossos. Na sua mocidade, havia feito tudo que estava em seu poder para impor o reino da justiça no mundo, mas o fogo não se havia moderado. A luta tinha consumido os melhores anos da sua vida, a sua força e o seu vigor sem que tivesse triunfado. Agora estava as portas da velhice. Ainda um pouco e as suas forças o abandonarão tornando-se uma árvore seca que não dá frutos.

Poderá, agora, encontrar novos caminhos para chegar ao seu fim?

Poderá ser bem sucedido lá, onde tinha encalhado na sua juventude? Que pode fazer que não tenha já feito? Porque o fogo continua a arder no seu coração e a perturbar a sua tranqüilidade?
De repente, o profeta ouve a voz divina: “Eu sou o Deus de teu pai, o Deus dos teus antepassados”. Como Moisés pode esquecer isso? Deus, tinha-o servido com todo o ardor da sua fé, tinha-se batido pela idéia da justiça. Em Median, em toda a parte onde o haviam conduzido os seus passos, se tinha esforçado por salvar o oprimido das mãos do opressor.
Tinha pregado a verdade, a paz e o direito. Mas o Deus dos seus pais tinha-o esquecido! Do seu povo não se lembrava mais...

A esperança renasce no seu coração, fortalece-se de instante a instante; o profeta sente crescer as suas forças e renovar-se os dias da sua mocidade. Sabe de hoje em diante a vida que deve seguir. Assim pois, não tinha perdido todo o seu vigor demorando-se no meio dos outros povos que o consideravam como um estrangeiro e que não queriam os seus ensinamentos...

Irá agora para o seu povo, para os seus irmãos – e lhes falará em nome de Deus de seus pais.
Eles o escutarão, porão uma orelha atenta a tudo o que lhes disser, obedecerão a sua voz, e fundará o reino da justiça com o auxílio do povo que fará sair do Egito, da casa onde é escravo.
A idéia é tão grande, tão bela que esquece por um momento os obstáculos erguidos sobre o seu caminho. Não se apresentará só diante do Faraó. Sabe que um homem como ele, que ignora a língua da corte, não saberia falar ao coração do rei. Sim, mas primeiramente irá para o seu povo, reunirá os anciãos de Israel...

O primeiro passo estava dado. Faraó e os seus exércitos, são afogados no mar, e Moisés põe-se a testa do seu povo para o conduzir ao país dos seus antepassados.

Então Moisés entoa um cântico ao Eterno. O seu coração transborda de alegria...

Mas o profeta ignora que não está ainda senão no começo da sua carreira, que a sua missão mal acaba de começar, venceu o Faraó mas a sua obra subsiste. O senhor acaba de ser senhor, mas o escravo continua a ser escravo. Quando um povo viveu sob o jugo durante várias gerações, não se pode com um golpe arrancar do seu coração os sentimentos íntimos que o dominam e tirá-lo do seu aviltamento para o tornar inteiramente livre.

Mas o profeta crê no seu ideal. E o profeta reúne o povo ao pé da montanha: “Não é verdade, como acreditastes até hoje, vós e os outros povos, que cada Estado, cada província, tem os seus deuses que exercem o seu poder sobre toda a vastidão do seu território, que se fazem guerra, tudo como os povos que lhe estão sujeitos. 

Não é assim! Não há no universo um deus para Israel e um outro para Mitzraim (Egito), não há senão um Deus. Ele é, Ele foi e Ele será! É o Senhor da terra e reina sobre todas as nações. Este Deus, que é eterno, é o Deus de vossos pais. O mundo é a sua obra; o gênero humano foi criado por Ele à usa imagem.

Ora, ele escolheu-nos, a nós, filhos de Abraham, seu preferido, para que sejais o seu povo “um reino de pastores e uma nação santa”, para que santifiqueis o seu nome sobre a terra. A vossa vida individual a mudarás completamente em um espírito de verdade e de justiça.
Que povo ouviu jamais a voz Divina anunciar no meio dos relâmpagos palavras tão sublimes? Assim falou o profeta, e o povo, no seu entusiasmo gritou a uma voz: “Tudo o que o Eterno diz, nós o observaremos!”

E é com o coração tranqüilo que o profeta deixa o campo para subir a montanha e concluir a Lei. Mas na alma do povo, o escravo egípcio revela-se bruscamente e tomba o “castelo de cartas” que o profeta tinha construído na sua fé, na elevação do seu ideal.

A dor do profeta não tem limites. Toda a sua obra, a alta missão que tinha sonhado para o seu povo, a esperança que o tinha tantas vezes alimentado no curso da sua longa carreira, tudo isso se derrubaria. O desespero apodera-se da alma do profeta, os seus membros se flexionam, as suas mãos largam as Tábuas da Lei, que se partem.

Ah! Como é difícil dar uma forma a um povo de argila tão vil!
Mas o profeta não cede facilmente diante das dificuldades da vida. Volta depressa ao seu ideal e decide triunfar. Compreende, perfeitamente, a tarefa que lhe reserva o futuro. Arma-se de paciência.

Assim os primeiros tempos. O profeta prega, sofre, paciente consola-se com o pensamento de que não está longe o dia em que o seu ensinamento produzirá os seus frutos. Vê já o seu povo chegando ao termo das suas peregrinações e realizando o seu ideal na terra prometida.

Então brilha o trabalho dos emissários...

Um povo ia à conquista de um país para aí se constituírem em nação que devia fazer a admiração do mundo, e bastou uma desagradável notícia para o desencorajar e fazer-lhe voltar as costas ao seu brilhante futuro!

Moisés compreende que a sua última esperança não repousa sobre nada sólido, que os seus ensinamentos não aproveitam a este povo que não foi capaz de tornar digno a morte da sua geração; está decidido a sustentá-la durante quarenta anos no deserto, até que uma nova geração cresça, uma geração em fim livre, engrandecida, por assim dizer, sob a tutela da sublime Lei...

O profeta permanece no deserto, enterrando a velha geração e fazendo a educação da nova. Uns após outros, os anos passam, e o profeta não se fatiga de ensinar à mocidade as leis do justo e do injusto. Sem cessar lembra o passado glorioso que os viu nascer.
Passado e futuro ocupam constantemente o seu pensamento.

Vê o deserto que se estende imenso, em volta dele. Os seus contemporâneos? Estão longe de realizar o seu sonho. É por isso que os seus olhos contemplam o futuro...

É quando os quarenta anos estão completos e a nova geração se prepara para sair da sua inércia, para retomar a obra nacional interrompida, o profeta morre, legando a um outro o cuidado de conduzir o povo para o seu país...

O profeta morreu na sua fé como tinha vivido.

Está morto, o rosto sorridente com palavras de conforto nos lábios. Morreu depois de ter recebido a bênção Divina, depois de ter cumprido a sua obra, depois de ter suportado o peso da vida, e sido bom até ao extremo, como um rochedo firme no meio do mar, que não se inclina nem para a direita nem para a esquerda, que não curva a cabeça diante das vagas desencadeadas...

Tradução de David A. Moreno
Natalie Portman
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