Por Rabino Chefe da Inglaterra, Professor Dr. Jonathan Sacks
Um breve passeio pela Internet revela que hĆ” Sociedades para a ProteĆ§Ć£o dos Animais, pĆ”ssaros, plantas, crianƧas, edifĆcios antigos, lagos alpinos, florestas em New Hampshire e direitos autorais mecĆ¢nicos.
Existe atĆ© – e a saĆŗdo como uma causa nobre – uma Sociedade de ProteĆ§Ć£o do ApĆ³strofo, dedicada a preservar o uso correto desta marca de pontuacĆ£o tĆ£o abusada. Insisto portanto na criaĆ§Ć£o de uma Sociedade para a ProteĆ§Ć£o da EducaĆ§Ć£o. Ć uma virtude seriamente ameaƧada.
JĆ” perdi a conta do nĆŗmero de pessoas visĆveis ao pĆŗblico que sĆ£o pagas, na verdade, para ser rudes. HĆ” o entrevistador que, ao receber uma resposta, diz: “Retira isso”, e a anfitriĆ£ de um programa de perguntas e respostas que se revela no tĆtulo: “Rainha da Maldade”.
HĆ” o apresentador no programa de debate moral que se especializa em mandar farpas ridicularizando qualquer um que ouse discordar dele; as estrelas que ganham fama por meio de obscenidade e blasfĆŖmia calculadas; os herĆ³is do futebol que chutam ou praguejam numa fĆŗria coreografada; o jornalista famoso por sua habilidade em depreciar as modelos desse ano; e a supermodel conhecida por atirar excentricidades. A lista Ć© interminĆ”vel e desalentadora.
NĆ£o hĆ” muito a dizer sobre ser rude. Houve um tempo em que era preciso coragem para desafiar as convenƧƵes, mas agora nĆ£o sobraram convenƧƵes para desafiar. Beethoven era famoso por ser descortĆŖs de tempos em tempos, mas ele tinha outras alegaƧƵes Ć fama. Costumava haver uma arte do insulto elegante.
Lady Astor ganhou reputaĆ§Ć£o por ter dito a Winston Churchill: “Se vocĆŖ fosse meu marido, eu envenenaria seu cafĆ©.” E Churchill respondeu: “Se vocĆŖ fosse minha mulher, eu o beberia com prazer.” Os insultos atuais, porĆ©m, estĆ£o mais perto da grosseria que da inteligĆŖncia. As crianƧas adoram chocar e ser chocadas, mas nĆ£o somos uma sociedade de crianƧas.
Em resumo, ser rude Ć© ser grosseiro. NĆ£o hĆ” nada a dizer em sua defesa. Ć uma forma de ataque verbal, de depreciar, uma humilhaĆ§Ć£o deliberada do outro. Por que tem aumentado. A melhor resposta foi dada pelo filĆ³sofo Alasdair MacIntyre. Houve uma Ć©poca, diz ele, em que partilhĆ”vamos uma linguagem moral.
AcreditĆ”vamos em certo e errado objetivos. Quando se chegava a um desacordo, as pessoas sabiam que tinham de argumentar em causa prĆ³pria. Hoje acreditamos (erradamente) que a moralidade Ć© subjetiva, qualquer que seja a que escolhemos. Ocorre entĆ£o que nĆ£o hĆ” argumento alĆ©m da mera afirmaĆ§Ć£o da prĆ³pria opiniĆ£o. A voz mais alta, mais aguda e mais rude sai ganhando.
Ć por isso que a civilizaĆ§Ć£o ainda importa. Aquelas virtudes hĆ” muito esquecidas – gentileza, cortesia, tato, contenĆ§Ć£o, e disposiĆ§Ć£o para ouvir outro ponto de vista – significam que aqueles que as praticam levam as outras pessoas a sĆ©rio. NĆ£o infligem sofrimento propositadamente.
Acreditam que a verdade Ć© mais importante que vencer um debate; que a sensibilidade aos sentimentos dos outros nĆ£o Ć© fraqueza, mas forƧa. Por mais estranho que pareƧa, sĆ£o os entrevistadores mais gentis, nĆ£o os agressivos, que conseguem as respostas mais reveladoras. O talento vence as partidas, nĆ£o a forƧa bruta. Dar ao interlocutor uma atenĆ§Ć£o e ouvi-lo com justiƧa Ć© a Ćŗnica maneira de vencer uma discussĆ£o e manter um amigo.
“Um tolo”, diz o Livro de ProvĆ©rbios, “adora exibir as prĆ³prias opiniƵes.” Em contraste, “A lĆngua que traz cura Ć© uma Ć”rvore da vida.” Ou para citar o filĆ³sofo francĆŖs AndrĆ© Comte-Sponville, “Boas maneiras precedem e preparam o caminho para as boas aƧƵes. A moralidade Ć© como a educaĆ§Ć£o da alma, uma etiqueta da vida interior.” Somente aqueles que sĆ£o pequenos fazem outros se sentir pequenos. A educaĆ§Ć£o Ć© o reconhecimento de que somos tĆ£o grandes quanto permitimos que outras pessoas o sejam.
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