A Crítica
Prezada Clara Ant:
Gostei muito de ler seu artigo na Rua Judaica - nem tanto pelos rasgados elogios a Lula, mas por sentir que você se sente parte de nosso povo, dirigindo-se à Comunidade via um de seus respeitados veículos.
Seu artigo não mente em nada, o que considero positivo - mas omite algo muito doloroso para mim e para milhares de Judeus e Sionistas no mundo. Trata-se da inaceitável recusa de Lula visitar o túmulo e honrar Theodor Herzl, fundador do Sionismo Político e sem dúvida, a maiuor figura de libertação nacional nos séculos XIX e XX.
Querida Clara: talvez Lula não tenha sido informado que Theodor Herzl foi um jornalista que "acordou" para seu Judaísmo quando do Processo Dreifuss, uma grande mancha na história da França e uma dolorida chama na história do Antissem itismo Francês. Herzl usou de sua pena e de seu tempo, visitando incontáveis líderes mundiais de sua época, usando de sua palavra e argumentos para realçar as idéias Sionistas. Também visitou e discutiu com líderes Judeus de diversas correntes, algumas das quais muito antagonistas à idéia de uma nação independente com caráter Judaico.
Herzl NUNCA pegou em armas, NUNCA denegriu qualquer outro povo, NUNCA negou direitos a qualquer raça/religião, NUNCA exaltou assassinatos. Sua luta sempre se deu no âmbito dos livros, das colunas em jornal, da diplomacia e da argumentação. Não me parece ter existido nem antes, nem depois dele, qualquer líder que tenha lutado por um país para seu povo sem recorrer à violência. Este fato por sí só já merecia a visita de Lula a seu túmulo, onde inclusive poderia te r feito um pronunciamento maravilhoso contra a violência e o terrorismo.
Herzl NUNCA pegou em armas, NUNCA denegriu qualquer outro povo, NUNCA negou direitos a qualquer raça/religião, NUNCA exaltou assassinatos. Sua luta sempre se deu no âmbito dos livros, das colunas em jornal, da diplomacia e da argumentação. Não me parece ter existido nem antes, nem depois dele, qualquer líder que tenha lutado por um país para seu povo sem recorrer à violência. Este fato por sí só já merecia a visita de Lula a seu túmulo, onde inclusive poderia te r feito um pronunciamento maravilhoso contra a violência e o terrorismo.
Claro que eu não esperava que Lula soubesse de nada que está no parágrafo acima. Afinal, de um homem que se gaba de "nunca ter lido um livro em sua vida" não se espera conhecimento ou erudição. Mas seus assessores (e você era Assessora Especial dele até 01/04/2010) poderiam ter preparado "o cara" para isto, apesar das pressões do Sr. Celso Amorim.
No entanto, prezada Clara, na mesma viagem Lula depositou flores no túmulo do inventor do terrorismo moderno, Y. Arafat Imach Shmó. Apenas para lembrar, foi ele o idealizador dos primeiros sequestros de aviões para serem explodidos. Foi ele quem ordenou a invasão à escola de Maalot (1974) onde assassinaram uma criança de 4 anos, uma de 16 meses, sua mãe grávida e seu pai antes de entrarem numa escola onde tomaram 85 crianças reféns, amarrando explosivos em seus corpos. Para mostrar seu "heroismo" suas forças mataram 22 menininhas, diversas delas jogadas vivas do terceiro andar da escola. Eu estava lá, Clara, e me lembro da dor em todo o país e também do júbilo entre os membros da Fatah, Arafat incluso.
Os Cristãos Libaneses também se lembram do terrorista e assassino Arafat. Foi sob suas ordens que começou a guerra civil libanesa que matou dezenas de milhares de Cristãos Libaneses ( a maioria entre os 40.000 mortos da Guerra Civil patrocinada por Arafat). Israel se lembra dos seus ataques terroristas indiscriminados contra supermercados, shopping centers, ônibus municipais, bancos e até discotecas, causadores de mortes estúpidas. Neste caso, até o iletrado Lula deve estar a par, dada a ampla cobertura dos "atos heróicos" deste infâme homem.
E no entanto, Clara "o cara" foi lá e depositou flores em seu túmulo. Honrou um matador, assassino indiscriminado (lembra da Olimpíada de Munique?), inacapaz de se solidarizar com a dor seja de adultos que perdem seus filhos, seja de crianças que perdem seus pais. Capaz de ordenar a suicidas que com seus atos tresloucados ceifem vidas humanas e deixem cicratizes irremovíveis nos sobreviventes, nos familiares e nos amigos das vítimas.
Clara, entendo as emoções da política e aceito integralmente que alguém se identifique com expoentes políticos. Mas não acredito (e você também não acredita) na infalibilidade dos líderes. Por maior que seja nossa afeição por nossos líderes, ao deixar de criticá-los passamos a ser coniventes. Espero que você, como Judia e como humanista, não se cale neste caso. Ace ito os elogios de seu artigo, mas cobro as críticas faltantes.
No mais, te desejo um Pessach de liberdade, de luz, de independência - raízes desta festa que estamos celebrando. Que D-us dê a você e à sua família motivos de alegria e a tranquilidade espiritual que todos nós buscamos.
Com todo meu respeito
Marcos L. Susskind
A RESPOSTA
Prezado Marcos,
Vamos lá.
Antes de responder aos pontos da tua carta, acho importante você saber que eu estive lá em Israel e acompanhei todas as atividades públicas e reservadas.
Acho importante também te dizer que conheço o Lula há 33 anos e junto com ele me orgulho de ter construido o PT e a CUT, de ter ajudado a reconstruir a democaracia no Brasil,
Por fim, acho importante que você saiba que nestes anos todos de minha militância sempre me identifiquei como judia e como tal sempre fui respeitada.
Bem, sobre os fatos sempre podem haver visões, opiniões e apreciações distintas ou divergentes, pertinentes na democracia.
Provocada por você, reli meu artigo, na íntegra (que ontem a Rua Judaica reenviou com os dois parágrafos suprimidos).
Procurei os elogios a Lula. Não achei.
Colecionador de amizades foi um elogio de Peres. Aliás Marcos, aqui não caberiam os elogios que todas as autoridades fizeram a Lula, em público e em reserva. Registrar que ele é o primeiro presidente do Brasil a ir a Israel é elogio ou é fato? Enfim, de forma relamente simpática, registrei os fatos e te garanto de novo, que não registrei nem 10% dos elogios feitos pelas autoridades, pelo presidente do KKL, o reitor da UHJ, entre outros.
Foi bom reler porque percebi que deixei de mencionar por exemplo o fato dos parlamentares do Knesset terem aplaudido Lula em pé. Exceto Liberman e sua bancada que preferiu se ausentar e bombardear a visita pelas costas. Liberman, diga-se de passagem foi recebido com muita deferência aqui no Brasil, apesar de nenhum presidente ser obrigado a receber um Chanceler. Isso também é uma constatação... que merece um elogio.
Lula não se recusou a ir ao túmulo de Herzl. Talvez você não saiba que essa visita não constava do protocolo regular e que foi colocada só agora. Será que as próprias instituições do estado de Israel desdenharam sua importância todo este tempo?
Discutir a questão do túmulo do Herzl da ótica que você o faz me traz uma dúvida: para você, visitar o Estado de Israel, estreitar laços diplomáticos, construir mecanismos permanentes de trabalho entre ministros em áreas como a de comércio, ciência, educação e outras, não significa reconhecer o Estado de Israel? Para você, a coroa em honra às vítimas do Holocausto e a outra em honra a TODOS os soldados israelenses mortos não significa nada? para você, Israel ser defendida perante todos os chefes de governo árabes como Lula já fez div ersas vezes, não é nada? Você acha que se o Lula não concordasse, Israel teria feito o tratado de comércio com o Mercosul, tão importante que foi motivo de menção de todas as autoridades?
Sinceramente, às vezes parece que a predisposição em condenar Lula é tamanha, que impede que a comunidade enxergue a importância dessa aproximação entre os dois países. Quem sabe você tente olhar com menos preconceito e faça um cálculo de quanto Israel foi beneficiado pela visita.
Você não tem idéia - ou talvez não queira ter - da profundidade das conversas que ocorreram entre nossa delegação e as autoridades israelenses. E em nenhum momento, nenhuma autoridade cobrou de Lula a ida ao túmulo. Nenhuma! O assunto foi tratado em âmbito dos potocolos (cerimoniais) e adquiriu a dimensão que adquiriu pela equação que foi montada Herzel x Arafat que nada tem a ver com as razões que pautaram toda a visita ao Oriente Médio. Na verdade, do ponto de vista de Lula depositar flores para os seis milhões de judeus e outra para todos os soldados israelenses, era a forma mais ampla de homenagear os judeus em geral e os israelenses em particular. São escolhas positivas, do bem.
Marcos, não espero que você concorde comigo. Só espero que você tente entender que coisas importantes aconteceram entre Brasil e Israel, estimuladas pelo nosso governo há mais de sete anos, e que nunca antes aconteceram. Coisas importantes para Israel e para os judeus. É só comparar. Insisto: Brasil, Israel e Oriente Médio ganharam.
Por fim, vou te dizer uma coisa. Nunca Lula disse que não leu livros. Esse é mais um carimbo que colaram nele. E ele não é nem um pouco il etrado. Já deu banho em muito PHD. Só não fez a escola formal. E está fazendo muito pela educação brasileira. Ele sempre diz querer que todos tenham a oportunidade que ele não teve,
Quem não quer ser governado por nós, pelo PT, pela Dilma, por Lula, tem todo o direito de divergir, de votar diferente, de contestar. O que me incomoda muito são as mentiras, as calúnias, as difamações. E lamento que às vezes elas ganhem a acolhida de uma parte da comunidade.
Seria muito bom que a comunidade no Brasil conhecesse e pudesse debater a pluralidade de posições que existem lá em Israel. Por coincidência, saiu hoje um artigo de um professor da UHJerusalem, que já dirigiu o Mossad, e que defende com os argumentos dele a necessidade de envolver o Hamas num acordo. Muitas vezes a maneira como são tratadas algumas diferenças no interio r da comunidade me lembram o absurdo do pensamento único imposto pelo stalinismo, que eu sempre combati. Da mesma forma que o anticomunismo (ou o antisocialismo) me faz lembrar que o primeiro golpe dado por Hitler foi conseguir maioria a partir da retirada dos comunistas do parlamento alemão, acusando-os de responsáveis pelo incêndio. E assim, aos poucos foi criando as condições de extermínio da democracia, dos judeus, ciganos, homossexuais, testemunhas de jeová, etc...
Enfim, pensar, trocar idéias, iamginar outros caminhos para a paz, tudo isso faz bem e honra o privilégio que temos de viver numa democracia.
Mais uma vez obrigada pelas suas observações.
Clara Ant