Contrário à crença popular, Israel não teme um ataque nuclear do Irã ou do Hezbollah; na verdade, Israel teme perder seu monopólio nuclear na região e a imagem de invencibilidade que o acompanha.
O relacionamento especial entre Israel e os EUA está talvez a ponto de entrar em seu período mais turbulento. Israel está ficando cada vez mais irritado com a ênfase de Obama na diplomacia como forma de conter o programa iraniano de enriquecimento de urânio. Os israelenses sabem melhor do que ninguém que a melhor maneira de uma pequena potência conseguir armas nucleares é prolongar o processo diplomático e as inspeções até que exista quantidade suficiente de material físsil. Israel deve saber: em 1960, ele deliberadamente enganou os inspetores dos EUA e repetidamente retardou visitas às suas instalações, criando o espaço de tempo suficiente para construir seu reator em Dimona (cidade na região de Negev) e reprocessar plutônio suficiente para construir a bomba. A Coréia do Norte também seguiu um caminho similar, com resultados parecidos. E agora, Israel suspeita, o Irã está fazendo o mesmo, só que com urânio altamente enriquecido e não com plutônio.
A maioria dos observadores acredita que a preocupação israelense com o programa nuclear iraniano vem do medo do Irã usar uma arma nuclear contra Israel ou dá-la a outros, como o Hezbollah. Dada a hostilidade explícita de Teerã em relação a Jerusalém, esse mau presságio faz sentido, mas é altamente improvável.
Porém, Teerã e sua antipatia para com o Estado judeu provavelmente não levarão a um ataque contra Israel com armas nucleares porque o arsenal israelense é muito maior do que qualquer capacidade que o Irã possa conseguir no futuro. Além disso, acredita-se que Israel possua capacidade de contra-ataque nuclear submarina, o que poderia devastar o Irã.
Nem poderia o Irã rapidamente suprir o Hezbollah com armas nucleares. Nenhum Estado nuclear jamais entregou seu mais prezado arsenal militar para atores subsidiários ou abdicou do uso exclusivo de uma arma que precisou de trabalho tão duro para ser obtida. Mais importante, se o Hezbollah fosse adquirir e usar uma arma nuclear contra Israel, não existiriam dúvidas sobre o fato de ter sido entregue pelo Irã, que seria devastado imediatamente, como retaliação. Um ataque a Israel, em outras palavras, significa o fim do Irã.
Apesar de muitos analistas questionarem a racionalidade do regime iraniano, ele é até bem conservador em sua política externa. O Irã tem dois objetivos de longo prazo, alcançar a hegemonia regional e expandir o islã fundamentalista, nenhum dos dois será atingido por meio de um "intercâmbio" nuclear com Israel. A influência crescente do Irã sobre o Iraque e o medo que isso inspira nos Estados do Golfo Pérsico já está levando à frente o primeiro objetivo. Os iranianos precisam apenas possuir as armas nucleares, não utilizá-las, a fim de aumentarem seu prestígio internacional e forçar os adversários a levá-los a sério. Da mesma forma, o poder de dissuasão de uma capacidade nuclear não utilizada poderia permitir ao regime espalhar sua ideologia sem o medo constante de uma mudança de regime imposta por outros países.
Já que é duvidoso que o Irã use armas nucleares contra Israel ou entregue seu controle ao Hezbollah –um ponto recentemente colocado pelo General Shlomo Gazit em Ma´arachot, o jornal publicado pelo exército de Israel- pode-se assumir com segurança que a obsessão de Israel com o Irã está em outro lugar.
Israel teme que as ambições nucleares do Irã possam minar sua superioridade qualitativa em armas e sua consistente habilidade de infligir mortes desproporcionais em seus adversários –a pedra angular de estratégia de defesa de Israel. Apesar de alguns idealistas sonharem com a reconciliação no Oriente Médio, baseada em um reconhecimento genuíno e mútuo dos direitos legítimos de todas as partes, a maioria dos israelenses acredita que a chave para a paz duradoura no Oriente Médio é convencer os adversários de Israel que expeli-lo pela força é algo impossível, que não vale à pena tentar.
A habilidade daquele Estado de continuamente trucidar seus inimigos no campo de batalha e sofrer pouquíssimas baixas é essencial para induzir essa sensação de desesperança. O programa nuclear do Irã ameaça essa habilidade israelense de duas formas. Em primeiro lugar, tal capacidade nuclear pode forçar Israel a conter-se, com medo de que as armas nucleares deles possam dar garantias de seguranças para outras forças anti-Sionistas –o tipo de garantia que pode evitar que eles causem as mortes massivas que causaram no passado, enquanto dão às forças anti-Israel a confiança para manter o combate.
A moderação israelense durante a guerra pode tomar muitas formas, mas é difícil que a derrota da guerra dos seis dias em 1967 ou a amaça direta às capitais árabes no final de 1973, na Guerra do Yom Kippur, tivessem acontecido se uma garantia nuclear tivesse sido sustentada por um verdadeiro adversário regional como o Irã, mais que aquela de uma superpotência distante como a União Soviética, para quem o principal interesse estava na humilhação do rival, não na destruição de Israel.
Uma ameaça ainda maior do que o programa nuclear do Irã é seu potencial de desencadear uma incontrolada proliferação nuclear no Oriente Médio, começando pelo Egito e Arábia Saudita. Para ambos os Estados, a idéia de que os judeus e persas possam ter o monopólio de armas nucleares em uma região demográfica e culturalmente dominada por árabes é vergonhosa. Para a Arábia Saudita, a motivação nuclear também está em jogo, dada sua proximidade física com o Irã e o imperativo estratégico de deter qualquer ameaça iraniana às instalações petrolíferas sauditas.
O desenvolvimento de armas nucleares pelo Egito e Arábia Saudita podem ser um grande perigo para o Estado judeu, a despeito do fato do Egito ter assinado um tratado de paz com Israel. Isso deve-se ao fato dos líderes que aceitaram a existência de Israel — incluindo aqueles do Egito, Jordânia e certos segmentos do movimento nacional palestino – o fizeram por acreditarem que esse Estado era forte, mas que não duraria no longo prazo. (o presidente egípcio Anwar Sadat, por exemplo, justificou sua busca pela processo de paz com Israel com a comparação entre os israelenses e os cruzados: "strong today, gone tomorrow.") De maneira mais ampla, como o trabalho do cientista político palestino-americano Hilal Khashan sobre as atitudes árabes em direção à paz mostrou, o desejo dos árabes de fazer a paz com Israel está em relação direta com a percepção da invencibilidade desse Estado. Assim como a capacidade nuclear iraniana significará uma garantia nuclear para os anti-sionistas em geral, a mesma capacidade nas mãos egípcias ou sauditas poderia reduzir os incentivos para que outros Estados árabes fizessem a paz com Israel por que, protegidos sob um guarda-chuva nuclear, eles poderiam não mais temer uma catastrófica derrota ou maiores perdas de território.
Tais desenvolvimentos podem destruir a percepção de um Israel invencível, sob o qual sucessivos governos israelenses têm baseado suas esperanças de paz na região. Como resultado, a segurança deles pode ficar dependente de um estado permanente de atenção militar e alertas de disparo imediato (hair-trigger alert) que podem conter ameaças, mas de uma maneira inconclusiva, como mostrado recentemente no Líbano e em Gaza. O comedimento demonstrada por Israel nos dois conflitos, em deferência aos EUA e às preocupações européias, pode apenas aumentar com o novo medo de cruzar uma linha vermelha árabe. Operações futuras, como as da invasão do Líbano em 2006 ou de janeiro de 2009 em gaza, deverão ser mais restritas do que antes, pelas medidas israelenses, menos efetivas em levar os árabes em direção à paz. De fato, tais operações poderão fazer mais mal que bem para Israel, por que, conforme eles usem menos força e causem menos dano, o efeito de contenção que esperam obter por meio de tais operações poderá erodir ainda mais.
A possibilidade de que eles não sejam mais capazes de forçar a paz sobre aqueles que negam o seu direito de existência está começando a surgir no horizonte de muitos israelenses. O tempo chegou para que a comunidade de defesa israelense desenvolva uma doutrina estratégica de coexistência no longo prazo que não se baseie em uma postura de invencibilidade, mas, dado que uma ampla aceitação do direito de existência de Israel pelos árabes parece não estar no horizonte, muito israelenses, incluindo o atual primeiro ministro, insistem que eles devem ter como objetivo estratégico urgente a contenção do desenvolvimento de armas nucleares pelo Irã. Ao fazer isso, eles poderão temporariamente remover a ameaça de uma inundação nuclear na região e manter a superioridade israelense nas armas. Mais importante, isso pode prevenir a suspeição de que Israel nunca alcançará a paz. Essa expansão cada vez maior do medo tem um efeito tóxico na moral nacional, é uma ameaça existencial ao Estado judeu, e está na raiz da obsessão israelense com a bomba iraniana.