Hot Widget

Type Here to Get Search Results !

O oráculo de Higienópolis

 David Weitman, rabino da Sinagoga Beit Yaacov, conhecida como a Sinagoga dos Safra, faz a cabeça de alguns dos mais poderosos integrantes da comunidade judaica de São Paulo

por Joyce Pascowitch e Maurício Stycer - Revista Poder - Junho/2008


Já não é de hoje que ele faz a cabeça de algumas das figuras mais importantes da comunidade judaica de São Paulo. Antes no Morumbi, onde vivia cercado de judeus ricos e influentes, agora em Higienópolis, onde atende judeus mais poderosos. Ao lado dos sobrenomes que o cercam e o procuram em busca de ajuda e conselhos, é um tipo modesto e, ainda mais importante, muito discreto. "Em mim, não procuram nada. Pessoalmente, não sou nada. Procuram o que eu transmito", diz ele.
Longa barba cinza, chapéu preto, português perfeito pronunciado com sotaque forte, David Weitman é um religioso com cara de religioso - e roupa de religioso. Não é possível confundi-lo com nada além disso - como pode ocorrer, por exemplo, com religiosos de orientação mais liberal, como o rabino Henry Sobel.
Como rabino principal da Sinagoga Beit Yaacov, Weitman atua em várias frentes: dá conselhos sobre problemas de família, na maioria das vezes, de educação, de saúde e de finanças. O local de trabalho do rabino é mais conhecido como "a sinagoga dos Safra", uma vez que o imponente templo, erguido na década de 90 na rua Doutor Veiga Filho, foi uma espécie de presente dos irmãos Joseph e Moise Safra à comunidade de judeus sefarditas de São Paulo.
Além dos dois banqueiros, as prédicas de Weitman, bem como seus conselhos, são ouvidos por outros poderosos dessa comunidade, judeus com sobrenomes Horn, Nigri, Cohen, Levy etc. etc... Antes de atender a esses judeus de famílias oriundas da Europa mediterrânea e do norte da África, Weitman dava os seus conselhos na Sinagoga Beit Chabad Morumbi, a judeus ashquenazi, de famílias que imigraram da Europa Oriental.
Nascido na Suécia, Weitman foi criado na Bélgica e se formou rabino em escolas talmúdicas em Israel, na França e nos Estados Unidos. Casado, 53 anos, nove filhos, está no Brasil há 29 anos. Além do trabalho na sinagoga, o rabino é diretor-executivo do Ten Yad, uma instituição beneficente, instalada num velho prédio de três andares no Bom Retiro, que oferece almoço diariamente para 200 judeus necessitados, além de outras 800 refeições para moradores de rua em um projeto na Baixada do Glicério.
Weitman é um dos principais divulgadores no Brasil da obra do rabino Lubavitch (1902-1994), um sábio conservador cuja influência se espalha pelos Estados Unidos, Israel, Europa e América Latina. O rabino recebeu a revista PODER para uma conversa em sua sala no Ten Yad, onde procurou explicar, entre outros, os motivos que levam tantos poderosos a buscarem o seu auxílio espiritual.
AUMENTO DA FÉ
Acho que há uma grande volta para as religiões, em geral. Em particular, no judaísmo, estamos assistindo a muitos jovens procurando por raízes. Não vamos esquecer que as gerações anteriores tiveram um problema de pobreza e ignorância (poucos fizeram escola), houve o Holocausto. Hoje, muitos filhos querem aprender o que os pais não transmitiram.
MINHA MENSAGEM
Em mim, não procuram nada. Procuram o que eu transmito. Pessoalmente, não sou nada. Tento transmitir a autêntica mensagem judaica, válida para todas as épocas. Nosso povo tem valores que já duram 3.300 anos. Uma coisa que dura 3.300 anos deve ser boa. É isso que as pessoas procuram: não a minha pessoa, mas a mensagem, que é verídica.
LUBAVITCH

Sou aluno do rebe Lubavitch, que nos transmitiu essa mensagem, muito fortemente, e eu tento retransmiti- la. Em essência, é o valor do ser humano, a pureza da alma, que existe, e que jamais é tarde. A pessoa sempre tem uma porta aberta.

CRISE DA IGREJA
A Igreja Católica está passando por uma certa crise, mas não vamos esquecer que é uma religião que atinge bilhões de pessoas. Por outro lado, talvez seja difícil para uma pessoa se associar, ou se identificar, com um líder religioso que não é casado, não tem filhos. No judaísmo, para ser líder religioso, tem de ser casado, tem de ter filhos. Só assim a gente entende problemas conjugais, conflitos de geração, de pais e filhos... Os fiéis se identificam com isso, vêem que a gente fala com conhecimento de causa.

LEITURA

Aprendi com meus pais a ler bastante. Como a Bélgica é o centro da Europa, temos uma certa facilidade com línguas. Essa leitura me ajudou muito a ter uma visão ampla das coisas. Uma cultura abrangente ajuda.

A TORÁ É O ESTADÃO DE AMANHÃ
Na hora de fazer uma prédica, a gente procura nas fontes judaicas soluções para problemas atuais. Nós acreditamos que a mensagem de Deus é atual. Estudando a Torá, que é a Bíblia judaica, se olhar bem entre as linhas e nos comentários, é o Estadão de amanhã. Tenho a convicção absoluta que temos na Torá as respostas a todos os problemas. Se eu não sei, um outro sabe.

POR QUE PROCURAM O RABINO
A mensagem que nós rabinos estamos tentando transmitir é uma mensagem verdadeira. É uma mensagem milenar, que passou por todos os "ismos", comunismo, socialismo, fascismo, e mostrou que é duradoura, permanente. As pessoas procuram a mensagem, não a pessoa. Procuram uma filosofia de vida que possa ajudá-las na sua auto-estima, formar famílias sólidas, ter um bom diálogo com os filhos. É isso que as pessoas procuram. E o judaísmo tem soluções para isso. E a gente está transmitindo essas soluções - o que faz com que muitas pessoas queiram ser nossos amigos e aprender.

A FAMÍLIA
Hoje em dia existe uma instituição que é extremamente açoitada, que é a família. Seja em conflitos marido-mulher, pais e filhos. E as pessoas precisam de amparo, de ajuda, de um conselho bom. E esse conselho tem de vir de pessoas que prezam a família. Eu não posso me aconselhar sobre problemas conjugais com alguém que não preza a família. Não tem sentido. As pessoas, muitas vezes, procuram soluções rápidas, vapt-vupt, o que não existe. Mas existem possibilidades de melhorar tudo em qualquer relacionamento.

DOAÇÃO
Cada pessoa tem de contribuir com o que pode. O pobre, que não pode contribuir com dinheiro, pode dar o seu tempo, sua energia, sua criatividade. Contribuir com dinheiro também é válido. Se Deus abençoa alguém que tem mais possibilidades, essa pessoa deve ajudar mais. Não é uma obrigação, é uma conscientização.

DISCRIÇÃO
Em geral, é bom que a filantropia, a benevolência, seja feita com discrição e humildade. Mas, também, não pode ser discreto demais porque, do contrário, não incentiva ninguém a fazer. É bom saber que tem gente que ajuda. Sem dúvida, uma doação discreta é mais valiosa, mas também tem o seu valor quando se sabe que alguém dá.

A MENSAGEM DO LUBAVITCH
Essa mensagem está enraizada num grande pilar do judaísmo que é o amor incondicional por todos. Quem procura uma sinagoga tem de ser bem recebido, independentemente de quem ele é, do que ele fez, se ele observa a religião, ou não... Segundo lugar, transmitir uma mensagem autêntica, e hoje as pessoas procuram por autenticidade. Não querem mais um paliativo, uma religião água com açúcar. Querem saber o que o judaísmo diz - sobre a pena de morte, sobre célula-tronco, sobre sexo, sobre tudo. Estamos tentando transmitir a mensagem autêntica, sem maquiagem, mas de uma forma acessível para todos, popular e com muito amor. Acho que isso é uma receita boa para hoje em dia.

CÉLULAS-TRONCO
É muito importante pesquisá-las. A pergunta é: de onde extraí-las? Células-tronco extraídas do cordão umbilical ou da espinha dorsal não tem problema. A questão ética forte é se podem criar embriões com o fim exclusivo de pesquisa. O judaísmo acredita que a pesquisa é boa, que tudo que se possa fazer para salvar o ser humano é válido, desde que não abreviemos a vida de um outro.

MANDAMENTOS DA VIDA BOA
O judeu precisa se conscientizar, se ele quer a bênção divina, ele também tem de deixar o seu telefone, ele tem de fazer alguma coisa. Para o rapaz judeu, é fundamental colocar os filactérios (tefilin). Isso é um celular para se comunicar com o altíssimo. Eu diria até que é uma ligação a cobrar. É Deus quem paga. Assim como, para a mulher judia, acender as velas na sexta-feira à noite (Shabat) é importante, é essencial. Não só ilumina a casa dela, mas dá uma iluminação espiritual. Isso é básico. A alimentação kasher também é importante. Acreditamos piamente nas palavras da psicologia moderna, que dizem: o homem é o que ele come. Se eu como um animal cruel, ou feroz, isso faz diferença. Nenhuma ave de rapina é kasher. Nenhum fruto do mar é kasher, porque eles se alimentam do lixo dos portos. Todos os animais permitidos são dóceis e domésticos.

CONSELHOS AO NÃO JUDEU
A nossa receita de felicidade para o não judeu é aderir às sete leis universais de Noé. Acreditar num Deus único e respeitá-lo, respeito à vida humana, respeito à família, respeito à propriedade alheia, respeito aos animais e seguir a justiça. Aderir a essas leis é um portão para o mundo vindouro.

LEITURAS
Recomendo dois livros: "O Caminho de Deus", de Moshe Chaim Luzzatto, e "Rumo a uma Vida Significativa", que traz ensinamento do rebe Lubavitch.

INFORMAÇÃO
Não tenho televisão em casa, não vou ao cinema nem ao teatro, mas leio bastante. Uso a internet apenas como meio de trabalho. Acredito que, sabendo o que acontece no mundo, seguindo os desenvolvimentos tecnológicos e com a mensagem milenar da Torá, a gente pode passar tranqüilamente por todas as tempestades.

PESSIMISMO
Devo falar a verdade: às vezes é difícil ser otimista. Tragédias como essa da criança na janela, e a mídia ainda aumentou bastante, ou outros casos terríveis como esse, deixam você triste. São casos que degradam um pouco o ser humano. O ser humano deve ser reto: a cabeça e o rabo não podem ficar na mesma altura. Esse é o animal. O ser humano tem a cabeça acima do coração, o coração acima do resto dos órgãos. Mas não podemos nos deixar impressionar por esses episódios. Temos de acreditar que o homem tem uma alma divina, foi criado à imagem de Deus e tem um potencial fantástico. E vamos extrair o melhor de cada um.

Uma Lâmpada Acesa

Em temos de modernidade, internet e outras loucuras mais, um rabino com cara dos rabinos de antigamente faz todo o sentido - principalmente com o jeito de David Weitman. Um tipo família, que dá a sensação verdadeira de que entende o mundo e os homens - pelo menos muito mais do que a gente. Com uma mulher e um monte de filhos, deve passar por problemas semelhantes aos nossos, mas por algum motivo (talento, dedicação, sabedoria e outros mais) desenvolveu uma capacidade de entendê-los muito maior do que a nossa. Ele se especializou, pela prática, talvez, em resolver questões que afligem ricos e poderosos. Mas cuida com a mesma atenção dos pobres que se alimentam diariamente na sede da associação que ele preside. Seus filhos adolescentes e genro já seguem seus passos. Sorte dos herdeiros deste país.
(Joyce Pascowitch)



Postar um comentário

0 Comentários
* Please Don't Spam Here. All the Comments are Reviewed by Admin.

Top Post Ad

Below Post Ad

Ads Section