Coluna Um: Uma Oração Para 5767
O Papa Bento XVI se tornou a mais nova desculpa do Islã político para fazer seus tumultos. Turbas de Rawalpindi a Ramallah estão queimando-o em efígie. Líderes muçulmanos de Gaza à Indonésia ao Qatar, da Turquia a Washington e Londres, estão atacando o papa e exigindo que ele se desculpe com o Islã em relação ao que eles consideram ser um ataque abominável contra sua religião.
Para recapitular o que foi exaustivamente informado recentemente, o "crime" do pontífice contra o Islã ocorreu no curso de uma conferência proferida na Universidade de Regensburg, em sua terra natal, a Alemanha, no início do mês. Bento citou um diálogo entre o imperador bizantino Manuel II Paleologus e um persa estudioso do Islã, aproximadamente em 1391, quando o imperador criticou severamente a prática islâmica de converter os não muçulmanos de forma violentamente ao Islã.
Nas palavras do papa, o imperador bizantino, "dirigiu-se aos seus interlocutores com uma rispidez surpreendente na questão central sobre a relação entre religião e violência em geral, dizendo: 'Mostre-me apenas o que Maomé trouxe que era novo, e lá você achará coisas somente más e desumanas, como o seu comando de espalhar pela espada a fé que ele pregava."'
"O imperador, depois de ter se expressado tão fortemente, continuou explicando em detalhes os motivos pelos quais espalhar a fé através da violência é algo irracional. Violência é incompatível com a natureza de D'us e a natureza da alma. 'D'us', ele disse, 'não fica contente com sangue - e não agir razoavelmente é ao contrário à natureza de D'us.'"
Como explicou Bento, o julgamento severo que o imperador bizantino fez do Islã originou-se diretamente de seu entendimento cristão de D'us como uma divindade razoável. De acordo com Bento, a razão pela qual um líder cristão podia julgar o Islã, e assim conduzir uma discussão intercultural significativa sobre os méritos do Islã e do Cristianismo, era porque ele tinha uma clara compreensão de como sua religião interpretou o mundo criado por D'us e concebeu a relação do homem com D'us.
Estendendo-se mais neste tema, o papa falou à sua audiência que a civilização européia é uma fusão entre a fé cristã e a filosofia grega da razão. A tendência cultural atual de Europa, ele argumentou, luta contra a separação cultural entre fé e razão, que começou com o Reformismo e continuou pelo Iluminismo. Relegando a fé a uma sub-cultura, que não tem nenhum lugar em discussões de empreendimentos humanos práticos, disse ele, os europeus se fizeram incapazes de compreender quem eles são ou de se defenderem e aos seus valores de uma forma que o imperador bizantino, na era pré-científica, pôde fazer decididamente.
Poderia ser dito que a reação histérica e violenta do mundo islâmico, sobre o uso que Bento fez do diálogo de 600 anos, só serve para reforçar a impressão do imperador bizantino de que o Islã não percebe D'us como sendo uma divindade razoável . Mas, limitar a análise da conferência de Bento à reação histérica do mundo muçulmano seria ignorar o ponto central do papa. A mensagem abrangente de Bento naquela conferência era que, para sobreviver, uma cultura deve estar disposta a abraçar sua identidade, por que se não o fizer, não será nem mesmo capaz de compreender por que deveria sobreviver.
Ainda que a mensagem específica de Bento fosse para seus camaradas cristãos, o povo judeu deveria dar atenção à sua mensagem de modo geral. Hoje, o povo judeu, em Israel e em todo o mundo, está sob ameaça de ataques de todos os lados. A ascensão global do anti-semitismo, particularmente no mundo islâmico, nos encontra em um período de sérias dúvidas sobre nós mesmos. Da mesma forma que os europeus, nossa capacidade para nos defendermos contra as crescentes fileiras de pessoas que nos odeiam depende de nossa aptidão, como povo e como indivíduos, de abraçar nossa identidade enquanto judeus.
Fazendo um comentário sobre a natureza desta onda de ódio aos judeus, o grande ( não judeu) sábio canadense Mark Steyn escreveu no mês passado na revista National Review, "O mais antigo ódio não adquiriu aquela forma sem a habilidade para se adaptar. Os judeus são odiados pelo que eles são - assim, em qualquer momento da história, o que quer que eles sejam é o motivo pelo qual eles são odiados. Durante séculos na Europa, eles foram odiados por ser tipos cosmopolitas sem raízes. Agora não há nenhum judeu europeu sem raízes para odiar, então eles são odiados por ser uma nação-estado ilegítima do Oriente Médio. Se a entidade sionista fosse destruída e os sobreviventes forçados a se tornar perpétuos comissários de bordo em cruzeiros para o Caribe, eles seriam odiados por isso, também."
É crucial que todos nós interiorizemos a mensagem que estas linhas transmitem. Porque, nos últimos anos, em lugar de reconhecer o preconceito de nossos detratores, nós nos dedicamos a tentar entender e assim justificar o ódio que eles acumulam sobre nós .
Nós nos dizemos que somos odiados porque nós somos muito fortes - ou porque nós somos muito fracos. Nós somos odiados porque nós somos muito religiosos - ou porque nós não somos bastante religiosos. Nós somos odiados porque nós teimamos em defender Israel - ou nós somos odiados porque nós estamos dispostos a fazer concessões em relação a Israel.
No entanto, como Steyn sabiamente observa, nós não somos odiados pelo que nós fazemos, nós somos odiados porque nós somos judeus. Levando isto em conta, o melhor modo para nos defendermos, o melhor modo para salvaguardar nossa liberdade e nossa herança, é abraçar e celebrar nossa identidade como judeus. Como Elie Wiesel certa vez me explicou, a chave para nos defendermos é nunca permitir que aqueles que nos odeiam nos digam quem nós somos. "O ódio só define aquele que odeia", disse ele.
E realmente, quando nós vemos o modo com que os judeus em Israel e em todo o mundo estão sendo atacados hoje, nós vemos que os ataques não são baseados nas ações judaicas, mas no fato de nós sermos judeus.
Portanto, no meio de mais outra onda de ataques violentos por muçulmanos contra judeus na Noruega, no mês passado, a comunidade judaica da Noruega aconselhou seus membros para não usar kippot ou Estrelas de David em público.
É assim que o estatuto do Hamas, o movimento que agora controla a Autoridade Nacional Palestina, não conclama a entrar em acordo com Israel, mas a que todos os judeus sejam expulsos da Terra de Israel ou violentamente convertidos ao Islã como parte da jihad (guerra santa) global .
É assim que os ataques contra judeus defensores de Israel no Ocidente se direcionam, não à substância de seus argumentos, mas a seu direito como judeus de lutar em favor de Israel em seus países de cidadania .
"Nós judeus", Wiesel explicou, sempre "nos definimos como os filhos de Abrahão, Isaac e Jacob." Realmente, no Monte Sinai, em nossa aceitação dos Dez Mandamentos, o povo judeu se tornou a primeira nação na história a se definir de forma consciente. E cada geração subseqüente de judeus refez aquela escolha. Os judeus não existem, como Jean-Paul Sartre argumentou ignorantemente, porque os anti-semitas existem. O líder do movimento existencialista deveria ter entendido: os anti-semitas existem porque os anti-semitas escolhem existir.
Conforme observa Steyn, hoje o ódio contra judeus é ancorado em Israel. Provocados por esta nova forma de ódio aos judeus, alguns judeus, tanto em Israel como na Diáspora, vêem Israel como um fardo. Esta é uma tragédia auto-infligida. Porque se nós olharmos para Israel, nós vemos que, longe de ser um fardo, nosso estado judeu é um dos sucessos mais estrondosos da história judaica .
Hoje, Israel é o lar da maior comunidade judaica do mundo. Mais judeus moram em Israel hoje do que em qualquer época de nossa história. E o estado no qual nós moramos é um dos países mais vibrantes, otimistas, "acontecendo" no mundo. Nós temos a taxa de natalidade mais alta do Ocidente. As taxas de empreendimento estão entre as mais altas do mundo.
Nós somos um das sociedades mais altamente instruídas no mundo. Durante os últimos 15 anos, mais de uma dúzia de faculdades foram estabelecidas em Israel e, no ano passado, o governo decidiu permitir que duas faculdades se juntassem às nove universidades de pesquisa de Israel, como universidades de pesquisa desenvolvidas e independentes.
Os israelenses estão entre os cidadãos mais patrióticos no mundo. Nosso patriotismo é expresso pelo alto nível de voluntariado em todas as faixas etárias. Na guerra recente, dezenas de milhares de reservistas deixaram de boa vontade suas famílias e empregos para pegar nas armas e defender o país, e centenas de milhares de israelenses se ofereceram para ajudar nosso um milhão de irmãos e irmãs cujas casas foram alvejadas por foguetes, projéteis e morteiros .
A vida judaica floresce em Israel como em nenhuma outra parte de nossa história. As taxas de alfabetização no aprendizado judaico em Israel são mais altas do que já estiveram em qualquer parte de nossa história. Israel é a casa de algumas meia dúzias de gerações de judeus cuja língua materna é o idioma da Bíblia e do Talmude.
O sucesso de Israel se origina em servir como o veículo que nos permite expressar nossa herança em todas as facetas da sociedade. E nossa herança judaica é um das heranças mais preciosas conhecidas pelo homem. O povo judeu deu humanidade aos conceitos de D'us, liberdade e lei. Nossa compreensão da falibilidade de gênero humano evitou que fôssemos tentados por falsos profetas, que nos prometem o céu na Terra, e nos permitiu dar passos práticos para melhorar nosso destino e nosso mundo.
Todos os ideais que Israel representa, tanto espirituais quanto físicos, formaram as fundações para o progresso humano e a liberdade em todo o mundo durante milênios. Nossa vontade de permanecer leais à nossa identidade e à nossa herança foi a chave para nossa sobrevivência, ao longo dos tempos, em face aos incontáveis inimigos que buscaram nos destruir espiritual e fisicamente.
Rosh Hashana marca o começo dos Dez Dias de Arrependimento que precedem o Yom Kippur. Para expiar corretamente nossos pecados e corrigir nossos enganos, temos que entender quem nós somos, o que nós representamos e o que nós podemos e devemos aspirar enquanto judeus. Para fazer isto, nós temos que rejeitar a noção de que aqueles que nos odeiam podem nos dizer quem somos. Para fazer isto, nós temos que abraçar nossa identidade judaica e temos que confirmar nosso compromisso com nosso destino coletivo .
O fato de o ódio aos judeus ter durado tanto tempo não diz nada sobre a natureza do povo judeu. O que fala muito sobre esta natureza é o fato de que, através dos tempos, nossos sucessos foram diretamente relacionados à nossa habilidade em rejeitar os retratos distorcidos que nossos inimigos fizeram do povo judeu e à nossa vontade de suportar e progredir como judeus no meio daquele ódio.
O Papa Bento pode discutir o Islã porque, estando seguro em sua identidade cristã, ele tem uma clara base para julgar a bondade ou irracionalidade de valores e comportamento muçulmanos. Quer concordemos ou não com seus julgamentos, através de sua vontade de julgar, Bento competentemente defende e faz avançar sua fé.
Quando nós abraçamos nossa identidade moral e intelectual como judeus, nós somos então capazes de enfrentar os desafios de nossos tempos. É minha oração que em 5767, o povo judeu possa se reunir novamente em torno de nossa herança, história e cultura e assim pavimente o caminho para um futuro seguro, pacífico e digno para nosso povo e nosso mundo.
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